Durante protesto, polícia prende manifestantes do MTST

    PMs acusam militantes do MTST de portar gasolina, rojões e pregos, mas testemunhas negam. Em ação, policiais invadiram casa de padre


    “Os policiais falaram para a gente trabalhar, me chamaram de vagabundo. Disseram que eu tinha ganhado cinquenta reais e um sanduíche de mortadela para estar ali na greve. E disseram que, se me matassem, meu caixão seria leve.”

    É o que o metalúrgico Guilhermino do Nascimento Lima, 42 anos, conta ter ouvido da boca dos policiais militares do Baep (Batalhão de Ações Especiais de Polícia) que o detiveram, junto com outros cinco manifestantes, durante um protesto que fechou a avenida Radial Leste, em São Paulo, por volta das 7h desta sexta-feira (28/4).

    O protesto, que reuniu cerca de 100 pessoas na região de Itaquera (zona leste de SP), fazia parte da greve geral convocada contra as reformas previdenciária e trabalhista propostas pelo governo Michel Temer (PMDB). Pai de três filhos, com quem mora “numa casa de invasão”, Guilhermino milita há dois anos no MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) pelo sonho de “uma casinha documentadinha, tudo certinho”, de onde não possa ser tirado de uma hora para a outra.

    Ele e outros cinco detidos foram levados ao 65º DP (Artur Alvim), onde o delegado plantonista Marcos Luiz Gomes decidiu prender três deles, todos militantes do MTST: Juraci Alves dos Santos, 57 anos, Luciano Firmino, 41, e Ricardo Rodrigues dos Santos, 35. Os três foram autuados pelos crimes de incêndio e explosão, que preveem penas de três a seis anos de reclusão, e por associação criminosa, punida com até três anos de prisão. Os demais, inclusive Guilhermino, foram enquadrados como testemunhas e liberados. Correção –  No final do dia, o delegado recuou e enquadrou os três por  incitação ao crime, em vez de associação criminosa. Saiba mais.

    Em nota, a assessoria de imprensa da Polícia Militar afirmou que os manifestantes foram detidos pelo Baep porque “portavam material para obstruírem e vandalizarem as vias públicas”. Diz a nota: “com eles foram encontrados tocha, recipiente com gasolina, ‘miguelitos’ (pregos retorcidos) usados para estourarem pneus e rojões”.

    “Acenderam um rojão direcionado para a tropa. Esse rojão explodiu bem ao lado de um policial e graças a Deus não chegou a lesioná-lo, mas foi muito próximo dele”, disso o major Dimas Mecca Sampaio. “Todas as nossas ações foram para evitar que acontecesse uma tragédia.” Criado em 2014, o Baep tem, entre suas atribuições,  “ações de controle de distúrbios civis e de antiterrorismo”.

    “Padre, tem polícia na sua casa”

    Os participantes do protesto negaram qualquer ligação com o material inflamável e os pregos apreendidos pelos policiais militares.  “Não usamos nenhum artifício de que fomos acusados, nem prego, nem gasolina, nem pneus. Usamos nosso corpo para fechar a Radial Leste. O corpo”, conta o padre Paulo Sérgio Bezerra, 63 anos, que há 35 atua com pároco da igreja Nossa Senhora do Carmo, em Itaquera, e é membro da Frente Povo Sem Medo.

    “Nossa manifestação foi pacífica. Tínhamos cartazes, faixas e berro. Só. Todas as bombas que estouraram vieram da polícia”, continua padre Paulo. “Não sei de onde os policiais tiraram o material que apresentaram na delegacia.” Ele relata que, depois que a polícia desocupou a Radial Leste e expulsou os manifestantes, foi  tomar café num barzinho próximo e um amigo entrou ali para avisar: “padre, tem um policial no quintal da sua casa”.

    Paulo foi até a casa paroquial e ficou indignado ao ver que os policiais haviam invadido seu quintal para revistar o caso de um dos manifestantes presos, Juraci, que estava guardado ali. “Houve bate-boca e depois permiti que ele revistasse o carro. Não acharam nada”, diz.

    “O MTST vai reagir”

    A lei das organizações criminosas, sancionada em 2013 pela presidenta Dilma Rousseff (PT), com a justificativa de combater o crime organizada, vem sendo usada para atacar diversos outros grupos. No ano passado, a mesma lei foi usada para enquadrar militantes do MST (Movimento dos Sem-Terra) em Goiás, pichadores em Minas Gerais e um grupo de manifestantes espionados pelo Exército em São Paulo.

    Guilherme Boulos, membro da coordenação nacional do MTST, chamou de “bizarra” a atitude tomada pelo delegado contra o movimento. “As pessoas estão sendo criminalizadas porque se manifestaram. São os presos políticos da greve. O governador Alckmin [PSDB] vai ter que responder por isso”, atacou, na porta da delegacia.

    Manifestantes do movimento passaram o dia ali, cantando palavras de ordem e gritando os nomes dos companheiros presos. O plantão policial recebeu visitas de dois deputados da “bancada da bala” da Assembleia Legislativa de São Paulo, Delegado Olim (PP) e Major Olímpio (PDT), da vereadora Juliana Cardoso (PT) e do ouvidor das polícias Julio César Neves. No começo da noite, os três presos foram transferidos para o 63º DP (Vila Jacuí).

    Boulos prometeu que o movimento vai reagir. “Não vamos admitir que pessoas que estavam se manifestando, que não agrediram ninguém, que, ao contrário, foram agredidas pela Polícia Militar, sejam criminalizadas por isso. O MTST vai reagir. Vai ter resposta em nível nacional. Não vamos engolir isso a seco”, prometeu.

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