Evento divulgado pelo Facebook tem ficha de triagem para participação e, para promotoria, é criminoso por fazer apologia à tortura
O Ministério Público de São Paulo entrou com uma ação civil pública, nesta segunda-feira (29/1), contra os organizadores do Bloco Porão do Dops 2018. De acordo com os promotores Eduardo Valério e Beatriz Fonseca, o evento enaltece o crime de tortura com homenagens a Carlos Alberto Brilhante Ustra e Sérgio Paranhos Fleury, que foram respectivamente comandante do DOI-CODI e delegado do DOPS durante a ditadura militar.
Na ação, os promotores pedem que os organizadores do bloco parem de divulgar o evento carnavalesco e menções de apoio ou elogio à tortura, bem como a retirada de imagens e da frase “Porão do Dops”, sob pena de multa de R$ 50 mil por dia a ser recolhida ao Fundo Especial de Despesa de Reparação de Interesses Difusos Lesados. Ou seja, a ação versa sobre o cometimento de crime de apologia da tortura e não pretende proibir a realização do bloco.
Os acusados no processo são o vice-presidente do grupo “Direita São Paulo”, Douglas Garcia, que possui vinculação com o evento como organizador direto e aparece em vídeos de divulgação postados na página dele no Facebook, e Edson Salomão, presidente do mesmo grupo, que se apresenta como organizador do evento.
Ainda na fase de preparação do inquérito civil, a promotoria oficiou aos organizadores a retirarem as alusões a tortura e as imagens dos dois torturadores – Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra e Sérgio Paranhos Fleury – que estampam os cartazes virtuais do bloco. Os denunciados, no entanto, disseram que se negariam a atender a recomendação.
Na página do evento, os organizadores anunciam que a entrada será R$ 10 em local já definido, mas apenas informado por quem passar por uma espécie de triagem. Ao clicar para realizar o pagamento antecipado – exigência para comparecer ao bloco – uma ficha de inscrição aparece onde são obrigatórios nome, documento de identidade, endereço completo – incluindo CEP – e o endereço nas redes sociais Twitter e Facebook. Ao passar por essa “primeira fase da triagem”, os postulantes a participar do bloco receberão um e-mail que deve ser respondido com uma foto de rosto para controle na porta do local.
Um dos homenageados pelo bloco “Porão do Dops” é Brilhante Ustra, chefe do Doi-Codi e torturador confesso, e condenado apenas em 2008 pela Justiça paulista em ação movida pela Família Teles – da ex-presa política Amelinha Teles, torturada pessoalmente por Ustra. Contudo, o torturador nem chegou a ficar preso e veio a falecer em no dia 15 de novembro de 2015. Na época, o TJ-SP condenou o coronel por unanimidade.
Já Sérgio Paranhos Fleury foi delegado do Dops durante o regime militar e acusado de chefiar os esquadrões da morte que atuavam na periferia de São Paulo, nas décadas de 1960 e 1970. Fleury teria levado o mesmo modus operandi ao combate a grupos guerrilheiros, conforme ele próprio afirmou em entrevista à Revista Veja, em 12 de novembro de 1969, logo após ter participado da captura do líder da Ação Libertadora Nacional (ALN), Carlos Marighella. Fleury morreu em 1979 vítima de um acidente de lancha em Ilhabela, no litoral norte paulista, mas há pessoas que conviviam com ele que afirmam que ele foi assassinado.