Militante sumiu depois de entrar em confronto com Guarda Nacional Argentina em protesto e apareceu morto; familiares e amigos se reuniram esta semana para pedir justiça no caso
Um ano depois do desaparecimento de Santiago Maldonado e de insatisfação de grande parte da opinião pública com os laudos periciais que deram como causa morte do jovem militante de 28 anos “afogamento”, a pergunta, que é uma incômoda pedra no sapato da gestão do presidente argentino Maurício Macri, ressoa em fortes gritos pela Plaza Mayo, marco histórico de Buenos Aires. Santiago desapareceu depois de entrar em confronto com a Guarda Nacional durante um protesto e apareceu morto dois meses depois.
Puxada pela família Maldonado, organizações ligadas aos Direitos Humanos, movimentos sociais e partidos políticos de esquerda, uma manifestação pedindo justiça no Caso Maldonado lotou a praça diante da Casa Rosada, sede do Poder Executivo argentino, na noite da última quarta-feira (1/8).
“Queremos justiça. O que aconteceu? Os peritos não puderam determinar de que maneira morreu Santiago. Queremos um grupo de investigadores independentes”, afirma Carlos Pisoni, representante da H.I.J.O.S Capital, organização de direitos humanos que pede julgamento e punição do que chamam de “genocídio de Estado”.
“Santiago presente! Santiago é solidariedade!” também foram alguns dos gritos que ecoaram pelo local. Entre os presentes, Hector Heberling, dirigente do Nuevo MAS (Movimento Ao Socialismo) caminhava ao lado de um carro de som que guiava um grupo de manifestantes empunhando bandeiras vermelhas e fazendo bastante barulho. “Este é um caso impune. Os culpados não estão na cadeia. Estamos na rua por verdade e por justiça”, afirmou, com contundência, o líder político.
O secretário gremial da ATE (Associação de Trabalhadores do Estado), Luciano Fernandez, também imputa ao Estado, e em especial à repressão policial do governo Macri, a responsabilidade política e material pela morte de Santiago Maldonado. Ele conta que a associação sindical mobilizou cerca de 2 mil trabalhadores para o ato, que também levavam grandes bandeiras verdes e instrumentos musicais. “Muitas pessoas desapareceram na ditadura e isso não pode voltar a acontecer”, enfatiza Fernandez.
De um palco na Plaza de Mayo, montado para receber intervenções artísticas e os discursos dos organizadores da mobilização, o irmão mais velho de Santiago, Sergio Maldonado, fez um discurso emocionado, cercado pelas Mães e Avós de Mayo, célebres por lutarem pelo direito de encontrar seus filhos e netos desaparecidos durante a Ditadura Militar Argentina.
“Em 17 de outubro do ano passado, seu corpo [de Santiago Maldonado] apareceu no Rio Chabut, 80 metros rio acima [do local onde Santiago foi visto pela última vez], em um trecho que já havia sido percorrido pelo Estado em 7 oportunidades. Em 5 de agosto e em 18 de setembro mais de 400 tropas entre a Guarda Nacional, prefeitura, Polícia Federal, cães farejadores, drones, helicópteros e mergulhadores pertencentes às Forças de Segurança que respondem ao ministério de Patrícia Bullrich disseram que não havia nada no mesmo lugar em que apareceu o corpo”, disse.
Nesse momento, em uníssono, os manifestantes o interromperam: “Fuera! Fuera! Fuera, Bullrich [Patricia Bullrich, secretária da segurança], Fuera!”. Sérgio continuou: “Quando o governo e alguns meios de comunicação impuseram a versão de que os peritos disseram que Santiago se afogou sozinho e que não há nada que reclamar, dizemos a eles que essas são mais algumas das mentiras a que estamos acostumados. No resultado da autópsia, não dizem onde morreu Santiago, em que dia e em quais circunstâncias e quantos dias esteve neste rio. Pelo contrário: os peritos da Corte Suprema, no dia 24 de novembro, não puderam responder a essas perguntas”, denunciou.
“Durante todo esse tempo, os funcionários do Estado encobriram a Guarda Nacional e perseguiram nossa família em vez de protegê-la e responder: ‘onde está Santiago Maldonado?'”, conclui.
Entenda o caso
Santiago Maldonado desapareceu em 1º de agosto de 2017 depois entrar em confronto com a Guarda Nacional Argentina em um protesto contra a expropriação de terras ancestralmente designadas aos indígenas Mapuche, na província de Chabut, Patagônia argentina.
Seu corpo foi encontrado boiando nas águas do Rio Chabut 78 dias depois de seu desaparecimento, no dia 17 de outubro de 2017. Segundo a perícia, a causa da morte foi “afogamento e hipotermia”.
À imprensa argentina, a advogada da família Maldonado, Verónica Heredia, contesta as versão do Estado e acredita que houve uma “desaparição forçada seguida de morte”. Por isso, a família pede uma investigação “imparcial e independente”.
Em 29 de agosto de 2017, o presidente Maurício Macri, o chefe de Gabinete dos Ministros, Marcos Peña, a Ministra da Segurança Pública, Patricia Bullrich, e outros 8 integrantes do governo e da Guarda Nacional Argentina foram denunciados pela Liga Argentina pelos Direitos do Homem por “encobrimento de desaparição forçada de pessoa” pelo caso. O governo nega as acusações e sustenta a versão oficial de afogamento.