Réu primário, ele só foi solto após Defensoria Pública levar seu caso até STJ; ministro considerou prisão ‘irrazoável e injustificável’
Dizem que P.D.C. entrou em um supermercado na cidade de Cruzeiro, na região do Vale do Paraíba, interior de São Paulo, onde teria levar sete barras de chocolate, sem pagar por elas. Dizem. Teria.
É que P. ainda não foi julgado pelo crime e, segundo o princípio da presunção de inocência, previsto tanto na Constituição Federal como na Declaração Universal dos Direitos Humanos, ele deveria ser considerado inocente por qualquer juiz que analisasse seu caso, pelo menos até a hora de bater o martelo da sentença. Mesmo assim, sem qualquer condenação, P. passou 1 ano e 4 meses preso.
O valor dos chocolates supostamente furtados, que P. nem chegou a levar, foi avaliado em R$ 165,50.
P. foi preso em flagrante em 4 de abril do ano passado. Um mês depois, em 25 de maio, o juiz Claudionor Antonio Contri Junior converteu o flagrante em prisão preventiva, afirmando que o réu “já possui contra si vários inquéritos policiais e ações penais em curso”, embora P. nunca tivesse sido condenado em qualquer uma delas.
Responsável pela defesa de P., o defensor público Thiago de Luna Cury, coordenador do Núcleo Especializado de Situação Carcerária da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, recorreu até o STJ (Superior Tribunal de Justiça) com um pedido de habeas corpus. Em 2 de agosto, o ministro do STJ Rogério Schietti Cruz aceitou o pedido da defesa e mandou soltar Peterson. Em sua decisão, o ministro afirma que manter o réu preso é “irrazoável e injustificável” e que, por nunca ter recebido condenação, P. é “tecnicamente primário”.
“É irrazoável e injustificável manter a prisão cautelar do paciente, tecnicamente primário, desde 4/4/2017, quando o crime de furto simples atribuído a ele é apenado de 1 a 4 anos de reclusão, e está relacionado à subtração de barras de chocolate em supermercado, avaliadas em menos de 20% do salário-mínimo”, afirma a decisão monocrática de Rogério.
O ministro também afirmou que a situação do réu não se enquadrava em nenhuma das hipóteses de prisão preventiva previstas no artigo 313 do Código de Processo Penal: crime com pena máxima maior do que 4 anos (a pena máxima para furto é de 4 anos), existência de condenações anteriores, violência doméstica ou dúvida sobre a identidade do acusado. E chamou a decisão do juiz Claudionor de “inadmissível” e “teratológica”, palavra que, em juridiquês, equivale a dizer que um colega errou rude.