Servidores demoraram quatro minutos para tentar controlar as chamas. Alguns são flagrados por câmera passeando tranquilamente durante incêndio
A Delegacia Estadual de Investigações de Homicídios (DIH) concluiu inquérito policial que apurou a morte dos dez adolescentes queimados vivos no 7º Batalhão da Polícia Militar do Estado, onde funciona o Centro de Internação Provisória (CIP), em 25 de junho deste ano.
O delegado Hellyton Carvalho, que presidiu as investigações, explicou no final da manhã desta segunda-feira (27/8) que a demora de pelo menos quatro minutos na intervenção no fogo sustentou o indiciamento por homicídio culposo – quando alguém mata outro sem que tivesse intenção, mesmo assim sabendo dos riscos que levem a vítima à morte.
Conforme ouviu de servidores nos depoimentos, Daniel Freitas, de 18 anos, teria colocado fogo. “Na ambulância, o adolescente Daniel [Paulo de Souza, de 15 anos], contou quem foi que ateou fogo.” Logo depois, os jovens se arrependeram e começaram a gritar: “Socorro, educador.”
O monitoramento interno a que se baseou o delegado para o indiciamento mostra o momento em que um dos adolescentes internados no CIP se preparava para distribuir o almoço quando ele vê o fogo, pede ajuda, mas os servidores passam de um lado para outro e não fazem nada. É o jovem que tenta salvar os colegas. Enquanto a coordenadora do CIP, Sany Silvano Nogueira, enche o balde, é o adolescente que tenta apagar as chamas.
O Portal Dia Online conversou com os familiares dos dez adolescentes em uma reportagem exclusiva.
Em um determinado momento, um pedagogo da unidade sorri da situação. Ele, contudo, não será responsabilizado pela omissão de socorro porque, em tese, não é obrigado a combater incêndio.
Apenas depois de quatro minutos de o adolescente que ajudava a entregar o almoço ter alertado que servidores começam a jogar água.
No inquérito policial de 2 mil páginas, o delegado conclui que o incêndio foi provocado pelos adolescentes do Alojamento 1 por causa de um remanejamento para outro dentro do próprio CIP.
“Os Bombeiros foram chamados penas 17 minutos depois e, quando chegaram, o fogo já estava controlado. É possível concluir que, caso tivessem intervido antes de quatro minutos, possivelmente a tragédia não teria a dimensão que teve”, explicou o delegado Hellyton Carvalho. “Os Bombeiros militares ouvidos narraram que quando chegaram não havia sequer fumaça no CIP”, sustenta o policial.
Luciana Pereira Lopes, mãe de Lucas Rangel, uma das vítimas, conta que a administração do CIP colocou os familiares dentro de um auditório para anunciar os nomes dos mortos. “Eu perguntei sobre meu filho, a funcionária baixou a cabeça, passou por mim e não disse nada. Ninguém falou para mim que meu filho estava morto. Eles não me devolveram meu filho, eles devolveram um corpo carbonizado”, desabafa. “Eles disseram que resolveram tudo, mas é mentira. O homem da funerária perguntou se não ia me despedir do meu filho, porque o caixão dele teria que ser lacrado. Mas eu não quis ver. Eu quero justiça”.
Os laudos de monóxido de carbono estabeleceram que a quantidade da substância era ínfima, de 10%, quando para matar seria 50%. “Solicitamos ao Instituto Médico Legal (IML) os laudos. Duas delas morreram por inalação de gases irrespiráveis”, acrescenta o delegado.
Além da coordenadora geral Sany Silvano Nogueira, a Polícia Civil indiciou os agentes de segurança Alexandre Trindade Rodrigues, Cláudio Júnio Souza, Edigar Souza de Oliveira, Weslei Anderson Vieira da Silva; e, ainda, os educadores Antônia de Jesus Santo, Benedita Fernandes Moreira, Cristiane de Almeida Porto, Jéssyca Grilo Lopes, Lívia Cardoso Cunha de Melo, Maria Helena Mendonça Moreira, Marise Gomes da Silva, Rosimeire Socorro dos Santos Rocha.
*Reportagem publicada originalmente no Portal Dia Online