Pelo fim da pena de morte aos adolescentes. O caso São Remo

     O “mito do adolescente violento” transforma o jovem, negro e morador de periferia em uma espécie de bode expiatório da sociedade. Poucos estigmas no mundo são tão mortais
    Ilustração: junião/Ponte Jornalismo
    Ilustração: junião/Ponte Jornalismo

    Os bons policiais da Rota deveriam se enojar de seus supostos admiradores. Afinal, só me resta crer que a maioria da corporação militar repudia as indecências que saem publicadas no blog Admiradores da Rota + 18. Há algo de doentio numa página em que os editores alertam a seu público, como zelosos samaritanos, que as fotos de corpos e tiros sejam vistas apenas por maiores de 18 anos. Detalhe perverso: muitos dos executados e mortos são adolescentes de São Paulo.

    Eu preferia não ter que dar espaço a esse tipo de publicação, que faz apologia ao crime. Mas um caso estarrecedor ocorreu no dia 6 de setembro deste ano, nos arredores da Favela São Remo, ao lado da USP. A Defensoria Pública assumiu a ocorrência para que não caia no esquecimento e na impunidade. É necessário publicá-la. Naquela noite, 4 pessoas morreram. Três delas tinham menos de 18 anos. Os adolescentes Luan e Paulo estavam no banco dianteiro.

    No boletim de ocorrência, os 5 policiais que participaram da perseguição disseram que os 4 garotos dispararam contra eles. Os jovens estavam em um Corsa preto roubado. Seria mais um caso mal investigado de suposta resistência seguida de morte, se não fossem os desdobramentos do episódio.

    Logo depois da chacina, as fotos dos corpos dos adolescentes foram enviadas por WhatsApp para parentes e amigos deles. Irmãos e mães das vítimas mortas souberam do massacre pelas redes sociais, testemunhando as imagens de seus corpos. As fotos também foram publicadas no blog Admiradores da Rota, página com mais de 150 mil visualizações, seguidas de um texto cruel: “Força Tática do 16º BPM em acompanhamento de um veículo produto de roubo troca tiro com três marginais que o ocupavam. O resultado está na foto. Os três vermes agora a pouco deitaram no mármore gelado do IML. Vagabundos perigosos. Parabéns aos policiais envolvidos na ocorrência”.

    Se a corrida presidencial trouxe para a ordem do dia o debate sobre a redução da maioridade penal, pouco se tem falado sobre a exposição dos jovens à violência e sobre as execuções praticadas contra adolescentes em São Paulo e no Brasil. O “mito do adolescente violento” transforma o jovem, negro e morador de periferia em uma espécie de bode expiatório da sociedade. Poucos estigmas no mundo são tão mortais.

    A Defensoria Pública assumiu o caso. Familiares contaram que policiais continuam rondando a vizinhança fazendo ameaças aos moradores. “Quatro já morreram e vão morrer muitos mais”, eles dizem.

    As fotos enviadas no WhatsApp causaram indignação entre os familiares das vítimas, que duvidaram da versão dos policiais. Um dos mortos, por exemplo, recebeu um “colar de tiros” sob o pescoço e teve os dentes quebrados. “Como os garotos ficariam feridos desse jeito em uma troca de tiros?”, questionou aos defensores um dos familiares. Nenhum policial envolvido na suposta perseguição ficou ferido.

    Além disso, as fotos divulgadas nas redes sociais foram tiradas instantes depois da ocorrência. Os jovens ainda estavam dentro do carro, baleados. Naquele momento, afinal, quem mais teria acesso ao local do crime além dos policiais militares, que guardavam a cena para a chegada do socorro? Não estou acusando sem provas. Mas não sou hipócrita nem idiota. Os policiais também tiveram acesso aos celulares das vítimas. Se houvesse interesse das autoridades em resolver o caso, por que policiais estariam se sentindo à vontade para ameaçar a população local? O que esperar de uma instituição que tolera esse tipo de comportamento?

    O comando geral da PM vem prometendo coibir e punir policiais envolvidos com a divulgação de violência nas ocorrências. A quantidade de fotos e vídeos nos blogs policiais mostram que a ameaça não é levada a sério. Nenhum policial responsável por essas indecências que destroem a credibilidade da corporação foi punido.

    A violência contra os jovens é um sério problema no Brasil. Conforme mostra o Mapa da Violência, o país fica em quarto lugar entre os mais violentos contra crianças e adolescentes (de 0 a 19 an0s). Entre 1981 e 2010, morreram assassinados 176 mil crianças e adolescentes. A taxa de jovens de 17 anos assassinados em 2010, foi de 52 por 100 mil habitantes, mais do que o dobro da média nacional.

    As crianças e adolescentes são vítimas da violência brasileira. De forma bizarra, nas políticas públicas, vêm sendo apontados como predadores a serem trancados e abatidos.

    Segundo nota da Secretaria de Segurança Pública, o caso envolvendo os quatro jovens está sendo investigado pela Polícia Civil e também por um inquérito policial militar (IPM). Em relação ao blog, conforme o comunicado, não cabe à Polícia Militar ou ao seu Comandante Geral proibi-lo.

     

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    […] a corrida presidencial trouxe para a ordem do dia o debate sobre a redução da maioridade penal, pouco se […]

    Iremar
    Iremar
    10 anos atrás

    Mais da metade da população do país é de negros e pardos. A probabilidade de um criminoso ser pardo ou negro é matematicamente maior. Obviamente os pobres roubam mais (ao menos armados e nas ruas) que os ricos. Não sei a razão do espanto quando se verifica que os ladrões que morrem em confrontos armados são pretos ou pardos e pobres. Não sei porque o espanto quando se divulga que a maioria dos jovens que morrem em confronto com a polícia não tinham antecedentes, pois como são adolescentes, de fato, não podem ter seus antecedentes registrados por mais crimes que tenham cometido.

    Os pobres garotos morreram dentro de um carro roubado, após desobedecerem ordem de parada.

    Quem está errada é a polícia. Eles tem todo o direito de roubar o meu carro.

    Mais uma vez, vocês estão de brincadeira.

    Irgam
    Irgam
    10 anos atrás

    Caro Iremar, é absolutamente necessário rever a sua lógica empedernida atinente aos números de crimes cometidos por adolescentes, segundo o Ministério da Justiça adolescentes são responsáveis por aproximadamente 1% dos crimes cometidos no país.
    Ademais, acredito que você não conseguiu entender a matéria acima, em nenhum momento se legitima o roubo ou furto de um carro assim como não se pode legitimar a ação desmedida e inconstitucional dos policiais da Rota que realmente quer que acreditemos que de uma troca de tiros supostamente iniciada pelos “criminosos negros” adveio um colar de balas sob o pescoço de um deles, por favor não insulte a inteligência dos leitores! São nítidos os sinais de uma execução fria e desalmada, mas é mais fácil e cômodo responsabilizar uma massa de desfavorecidos sociais que nascem em meio as regiões controladas pelo tráfico (mas quem mandou ser pobre, negro e filho de traficante) ante a ausência do Estado, completamente marginalizados pela mídia enquanto se tira da equação um país que incongruentemente tem a sexta maior economia do mundo ao mesmo tempo que ocupa o octogésimo sétimo lugar no IDH, que segundo o IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação) pela quinta vez consecutiva é o país emergente que mais arrecada impostos e se iguala com alguns países desenvolvidos enquanto concomitantemente pela 5º consecutiva foi o país que menos retornou os impostos arrecardados em infraestrutura, saúde, educação, lazer… (A pesquisa envolve 30 países e pela quinta vez ficamos em 30º lugar).

    Eduardo Branco
    Eduardo Branco
    10 anos atrás

    È engraçado como há grande parte da sociedade que sirva para proteger criminosos, é como se fosse um contraste grande parte da população lutando por justiça e “defensores” dos direitos humanos lutando para o aumento da violência, já vivemos um caos criado por “menores indefesos” e há “estudiosos” criando estatísticas que não condizem com a nossa realidade,para denegrir algumas das poucas corporações que realmente estão realmente interessadas em dar segurança a população, incrível ainda é saber que a ONU irá dar atenção a esse assunto , e não ao “carnaval político” que enfrentamos.

    João Silva
    10 anos atrás

    Continuamos o país do ouvi falar. Ouve-se algo e vira verdade! Mata-se mais aqui do que nos EUA? Depende. Proporcionalmente ao número de policiais mortos, a polícia americana mata mais que a brasileira. Basta olhar os dados oficiais. E lá os policiais são admirados. Morrem mais negros em confronto com a polícia? Segundo o anuário brasileiro de segurança, não. Há mais negros presos que brancos? segundo o mesmo anuário, não. Aliás, esse dado de menos de 1% de crimes cometidos por menores, também não é o que diz o documento. Repetem-se as mentiras até que se tornem verdades.l E a preguiçosa imprensa brasileira não pesquisa, apenas repete! Também, em um país no qual os especialistas em segurança pública são repórteres, antropólogos, sociólogos, psicólogos e outros, menos policiais, o que devemos esperar? Em um país onde a polícia está sempre errada, mesmo quando está certa, o que devemos querer? Onde se cultua o criminoso e se cospe nos policiais. Onde um blog que trata de segurança pública não traz um fato favorável aos que defendem a sociedade. Falta-nos educação e cidadania. As ovelhas não gostam do cão pastor pois ele se parece com o lobo. Mas se ele não estiver presente, o lobo faz a festa. Os brasileiros não gostam da polícia pois ela restringe seus pretensos “direitos” mas quando os criminosos atacam, quem se arrisca por nós?

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