Investigação identificou 48 líderes atuando dentro e fora dos presídios; estimativa é de 6 mil filiados e simpatizantes da facção criminosa nascida em SP
O Mato Grosso do Sul é o segundo estado da Federação na qual o PCC (Primeiro Comando da Capital) – maior facção criminosa do País – está mais estruturado, só perdendo para São Paulo.
Investigações do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado) do Ministério Público do Mato Grosso do Sul mostram com detalhes o sofisticado e preocupante nível de organização do PCC no estado.
O Gaeco identificou 48 líderes da facção criminosa atuando em diversas células nas ruas e nas prisões sul-mato-grossenses, todos usando o telefone celular para coordenar atividades ilícitas. As estimativas, no entanto, apontam pelo menos 6 mil filiados e simpatizantes do PCC local.
A operação foi batizada de Yin Yang, princípio da filosofia chinesa e símbolo da facção criminosa. Os dois documentos do MP que embasam as denúncias podem ser lidos na íntegra aqui: documento 1 e documento 2.
A estrutura do PCC/MS é semelhante a de São Paulo. Enquanto no território paulista a cúpula da organização é denominada de Sintonia Final Geral, no Mato Grosso do Sul ela é chamada de “Resumo”.
Os integrantes do “Resumo” integram o alto escalão do grupo e são responsáveis por supervisionar todos os rumos de atuação da facção criminosa.
Esse núcleo é subdividido em outras células, como o “Resumo Disciplinar”, que controla a disciplina de seus associados.
O “Resumo Financeiro” cuida das finanças e contabilidade. O “Resumo do Progresso” coordena as atividades criminosas, especialmente o tráfico de drogas.
O “Resumo da Rifa” auxilia as atividades financeiras, como a arrecadação de dinheiro proveniente das vendas de rifas nas ruas e prisões, com sorteios de carros e apartamentos para os ganhadores.
O “Resumo do Cadastro” controla os dados dos integrantes da facção, como informações sobre data de batismo para entrar no grupo; quem foram os padrinhos; prisões onde cumpriram pena: se estão presos ou soltos, etc…
Abaixo do “Resumo” vem a “Geral do Estado”, célula responsável pela coordenação das atividades da organização em âmbito estadual e centralização dos assuntos envolvendo o PCC/MS.
Esse núcleo também tem algumas subdivisões, como “Geral do Progresso”, que cuida do “Setor do Óleo” (pasta base de cocaína e crack); “Setor do Bob” (maconha) e “Setor da Pura” (cocaína).
O quadro “Geral da Rua” cuida do planejamento dos grandes roubos, sequestros e também da execução de rivais da organização, principalmente os integrantes do CV (Comando Vermelho), maior inimigo do PCC.
O núcleo “Geral das Ferramentas” tem como atribuição a aquisição e guarda do armamento do PCC no Mato Grosso do Sul. Já a “Geral do Sistema” exerce a liderança nas penitenciárias e cadeias públicas do estado.
São subordinadas à “Geral do Estado” as células “Geral Regional”, “Geral da Capital”, “Geral do Interior” e “Geral das Comarcas”.
Cada uma delas tem o setor da “Disciplina da Rua”, que controla os integrantes do grupo em liberdade, para que cumpram com fidelidade os “deveres” perante a facção.
As investigações do Gaeco do Mato Grosso do Sul foram realizadas no período de 15 de dezembro de 2017 e 30 de março de 2018 e contaram com interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça.
Nos diálogos monitorados, os líderes do PCC no Mato Grosso do Sul conversam, nas ruas e nas prisões, sobre execuções de rivais; planejam roubos; negociam drogas e discutem problemas enfrentados pelos presos da facção no sistema prisional do estado.
Para evitar prejuízos e demora na fase de instrução processual, o Gaeco decidiu denunciar os 48 líderes do PCC identificados em grupos de no máximo 10 acusados.
Um dos denunciados é Edson Chaves de Brito, apontado como uma das principais lideranças do Primeiro Comando da Capital no Mato Grosso do Sul.
Brito é considerado preso de altíssima periculosidade e, por isso, o Ministério Público Estadual do MS providenciou a transferência dele para um presídio federal, com autorização da Justiça.
O trabalho de investigação do Gaeco também apurou a participação de mulheres no comando da organização criminosa. Uma delas foi identificada como Jacqueline Michele Spessato, também conhecida como Loira.
Jacqueline teve conversas telefônicas monitoradas e as gravações demonstraram o envolvimento dela no roubo de uma caminhonete e até na realização da contabilidade e divisão de dinheiro do PCC.
Edson Chaves de Brito, Jacqueline Michelle Spessato e outros oito líderes do PCC fazem parte de um dos cinco grupos denunciados à Justiça pelo Ministério Público por crime de associação à organização criminosa.
Em outra denúncia oferecida pelo Gaeco, Hamilton Roberto Dias Júnior, o Moringa, foi apontado como Sintonia Geral do estado e responsável pelo núcleo do Cadastro.
Já Edson dos Santos Vieira, o Strike, coordenava de dentro da Penitenciária de Dourados a função de Sintonia Geral do estado. A Ponte não conseguiu contato com os advogados dos acusados.
No início do ano passado, a Agepen (Agência Estadual de Administração Penitenciária) contabilizava ao menos 6 mil detentos filiados ou simpatizantes do PCC nos presídios do estado, aproximadamente 40% da população carcerária do Mato Grosso do Sul.
O estado faz fronteira com o Paraguai de onde vem as drogas e armas comercializadas pelo grupo e, por isso, o território é de grande importância para os negócios da facção.
A Ponte procurou a Agepen por e-mail pedindo uma posição oficial sobre as denúncias trazidas na reportagem, mas até a publicação, não havia retorno.
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[…] *Este texto foi publicado originalmente neste link: https://ponte.org/mato-grosso-do-sul-e-o-segundo-estado-mais-importante-para-o-pcc/ […]