Governador postou que vítima teria ‘resistido à prisão por tráfico de drogas’, contrariando boletim de ocorrência; após matéria da Ponte, Doria se corrigiu
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), acusou uma mulher grávida agredida por um PM de ter sido presa por tráfico de drogas em São José do Rio Preto, no interior do estado, nesta terça-feira (4/2). Essa acusação nem os policiais militares que a prenderam e nem a Polícia Civil fizeram.
Após prender dois homens por tráfico de drogas, o soldado Wesley Viana dos Santos teria sido xingado e alvo de um soco dado pela mulher, de acordo com a versão dada por ele e seu parceiro, Cleriston Braga dos Santos, na 4ª delegacia da cidade.
Ela estaria a 10 metros das pessoas abordadas, teria saído do local e só então retornado os xingando e agredindo. Imagens registradas por testemunhas mostram o que ocorre em sequência: o PM Viana a agride no chão,enquanto apoia seu joelho na barriga da mulher grávida.
Em mensagem publicada no Twitter, Doria deu explicações sobre a ação ocorrida nesta manhã. Primeiro, disse que recomendou o “imediato afastamento” do PM que a agrediu — o que foi confirmado pela Secretaria da Segurança Pública. Com o afastamento, o policial atua em funções administrativas, recebendo o mesmo salário.
No mesmo post o governador atribuiu à mulher um crime pelo qual ela não responde. “Apesar dela ter resistido a prisão por tráfico de drogas, existe protocolo a ser cumprido e as imagens indicam conduta totalmente inadequada do policial”, escreveu Doria, em seu perfil pessoal no Twitter, contrariando o documento da Polícia Civil no qual a mulher responderá por resistência, enquanto os outros dois homens, por tráfico de drogas.
Após a Ponte publicar reportagem denunciando a acusação falsa feita por Doria, o governador fez uma nova publicação para corrigir a informação anterior. ” Faço uma correção aqui: a mulher que aparece em vídeo hoje não é acusada de tráfico de drogas, ele estava envolvida em uma ocorrência de tráfico de drogas e resistiu à prisão. O inquérito policial segue”, escreveu. Ao contrário do que o governador afirma em sua correção, contudo, não há qualquer indício de envolvimento da mulher na “ocorrência de tráfico de drogas”.
O soldado Viana afirmou que “não havia motivo algum” para a grávida o agredir, que ela se alterou e “passou a xingar e o agrediu com um soco”. O documento ainda detalha que o policial não mostrou nenhum ferimento no peito consequente da agressão que teria sofrido.
No documento, os soldados contaram à Polícia Civil que ela declarou estar grávida apenas quando outra viatura da PM chegou, o que é desmentido pelo vídeo, no qual ela e testemunhas da abordagem os alertam sobre a gravidez. Em nenhum momento os PMs citam que ela tinha qualquer envolvimento com as abordagens por tráfico.
Em uma mensagem complementar, o governador explicou que já há um inquérito para investigar o que aconteceu nesta abordagem. “Ressalto meu respeito à Polícia Militar do Estado de SP, a melhor do Brasil, mas não deixarei de condenar excessos e violência desnecessária”, escreveu o governador.
A reportagem questionou a assessoria do governo do Estado sobre a fala de Doria, em que coloca a mulher como suspeita de tráfico de drogas, e aguarda uma resposta.
A Ponte solicitou à Secretaria da Segurança entrevista com os dois soldados, Wesley e Cleriston, e recebeu a seguinte resposta: “Nosso posicionamento, por ora, é por meio de nota – que já foi enviada aos senhores”, no qual a assessoria de imprensa terceirizada da pasta, a InPress, se refere à nota em que confirmou o afastamento dos PMs e investigação do caso.
Reportagem atualizada às 23h57 para incluir nova publicação feita por João Doria em seu Twitter.