Adolescente de 15 anos foi morto com tiro na cabeça; sargento Adriano Fernandes de Campos é dono de empresa que fazia segurança privada irregularmente
O Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa da Polícia Civil de São Paulo pediu à Justiça a prisão do policial militar Adriano Fernandes de Campos. Ele é investigado pelo sequestro e morte de Guilherme Guedes, 15 anos, na Vila Clara, zona sul da cidade de São Paulo, no domingo (14/6).
A prisão foi um pedido do delegado Fábio Pinheiro, responsável pela investigação. A promotora Luciana Jordão Dias remeteu o pedido de prisão temporária (de 30 dias) ao 1º Tribunal do Júri da Capital e aguarda a decisão da Justiça.
No pedido do Ministério Público, há confirmação da informação de que a família tem se sentido ameaçada. “A prisão é imprescindível às investigações do gravíssimo crime praticado, para a realização de interrogatório e apuração de outras testemunhas, que não se apresentam em razão do medo apresentado de represálias. Referido medo é reforçado pela presença de policiais militares próximos da residência da vítima logo após o homicídio”, escreveu a promotora.
“Uma questão de horas”, afirmou o delegado à Ponte. “Até então, para nós, o autor do crime é o Adriano e mais um segundo”, define Pinheiro. O policial civil explica que há mais um suspeito pelo crime, ainda não identificado.
O carro do filho de Adriano foi visto pelo sistema Detecta trafegando pelo local bem próximo da hora do desparecimento de Guilherme.
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No local do sequestro havia um pedaço de tecido com a inscrição “SD PM Paulo” foi encontrado. Segundo o delegado, o homem foi ouvido, liberado e qualquer possível participação descartada, porque apresentou um “forte álibi”. A promotoria destaca no pedido de prisão que policiais estiveram na casa da família de Guilherme “exigindo a entrega de tarjeta de identificação de PM localizada por familiares da vítima”.
Para o pedido de prisão, o departamento se baseia em imagens de câmera de segurança em que dois homens aparecem no beco ao lado da casa de Guilherme no dia de seu sequestro e morte. Um deles seria Adriano, conforme explica o delegado.
Adriano e o pai dele, PM aposentado, Sebastião Campos, têm juntos uma empresa chamada Campos Forte Portaria Ldta. Conforme revelou reportagem exclusiva da Ponte, a empresa tem como registro as atividade de zeladoria e limpeza, além de outros serviços administrativos, mas não tem permissão para realizar segurança privada. Além disso, o regulamento interno da PM paulista proíbe que policiais da ativa tenham empresa com esse fim.
“Desconfiávamos que fosse esse soldado Paulo, mas o soldado Paulo não foi. Ele tem um álibi para o dia, muito forte”, explica. “Acreditamos que seja ou o Fábio, funcionário do Adriano, ou uma outra pessoa que o Adriano levou com ele. Pode ser até um outro policial militar”, prossegue.
Adriano está na Corregedoria da Polícia Militar de São Paulo onde espera a decisão da Justiça para o pedido de prisão. Caso acatado, ele será transferido para o Presídio Militar Romão Gomes, na zona norte da capital paulista.
Enquanto o DHPP confirma que um policial está envolvido no sequestro e morte de Guilherme Guedes, até o momento, a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo, liderada pelo coronel João Camilo Pires de Campos neste governo de João Doria (PSDB), omite a informação.
Secretário-executivo da PM, o coronel Álvaro Camilo negou na terça-feira (16/6) que existisse qualquer suspeita de participação de policiais militares no desaparecimento e morte.
“Não teve operação policial, não tem nenhum indicativo de que aquilo tenha sido cometido por policiais militares”, disse, em entrevista à TV Globo naquela manhã.
Sobre a identificação de um PM encontrada no beco em que o adolescente desapareceu, disse que “não tinha naquele momento nenhuma operação policial sendo realizada naquela região”.
Quando ainda era deputado estadual pelo PSD, Camilo homenageou Adriano Campos em 2018, segundo informou o Uol. Então integrante da cavalaria da PM, Adriano foi um dos 26 homenageados numa sessão solene de duas horas, que reuniu cerca de 200 pessoas na Assembleia Legislativa de São Paulo, na manhã de 16 de abril de 2018. Na ocasião, os presentes na cerimônia entoaram a “canção da Cavalaria” e Camilo (PSD) discursou que “sempre haverá uma Cavalaria”, diz a reportagem.
Por pelo menos quatro vezes a assessoria de imprensa terceirizada da pasta, a InPress, mesmo questionada, deixou de informar que poderia haver policiais militares ligados ao caso, conforme solicitado pela Ponte.
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A primeira omissão ocorreu em e-mail enviado às 19h28 de terça-feira (16/6), quando a reportagem perguntou sobre essa possibilidade e foi ignorada. Na mesma hora, veículos como o G1 e a TV Bandeirantes indicavam a suspeita de que dois PMs estariam ligados ao sequestro e morte.
O mesmo correu em três contatos feitos ao longo desta quarta-feira (17/6): às 13h26, 14h04 e 16h42. Em todas as mensagens, a Ponte questionou se policiais militares eram investigados e chegou a solicitar um posicionamento da PM sobre a suposta participação de Adriano Campos.
Durante a tarde desta quarta, a Corregedoria da PM esteve na casa da família de Guilherme ouvindo testemunhas, entre elas a avó que morava com o garoto, suas tias e demais parentes.
Ao longo desta terça-feira, a mãe do jovem, Joyce da Silva dos Santos, depôs na sede da Corregedoria. Ela permaneceu entre 15h e 22h no local, segundo apurado pela reportagem.
Ainda na noite de terça-feira, a família de Guilherme notou que um viatura do Rocam ficou parada por algum tempo na frente do local onde ele foi sequestrado. Informaram também que policiais à paisana rondaram a região.
De acordo com a avó do garoto, Antônia Arcanjo, a ação da Corregedoria é positiva. “Mostra que estão fazendo algo. Espero que tudo isso acabe logo. Que eu esqueça disso, mas que nunca me esqueça do Guilherme”, disse, vestindo uma camiseta com o rosto do rapaz.
Na quarta-feira, a Corregedoria da PM foi novamente ao bairro e ouviu mais uma vez as possíveis testemunhas e os familiares. Procurado pela reportagem, o Tribunal de Justiça afirmou que “o caso está sob segredo de Justiça e, neste momento, não podemos fornecer informações.”