‘Tenho direito a ter o mesmo que você’: entregador negro enfrenta racista em condomínio rico

    “Você tem inveja disso”, diz Mateus Almeida Prado Couto ao passar a mão no braço em referência à cor de sua pele e família culpa esquizofrenia pela atitude

    Um entregador de aplicativos sofreu ato de racismo e de humilhação no último dia 31 de julho, em Valinhos, no interior de São Paulo. Ao fazer uma entrega, o cliente, um homem branco, o chamou de lixo e apontou para a sua pele clara.

    Uma testemunha registrou a cena, que viralizou nas redes sociais na manhã desta sexta-feira (7/8). Nas imagens, o homem, identificado como Mateus Abreu Almeida Prado Couto, humilha o jovem.

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    “Seu lixo. Você tem inveja disso aqui”, diz, ao apontar para a cor de seu braço, indicando sua pele branca para o entregador negro. “Quanto deve ganhar por mês, hein? Dois mil reais? Não deve ter nem onde morar”, dispara o homem, morador do condomínio Madre Maria Villac.

    “Você trabalha de motoboy”, segue o homem. O entregador, que no próprio vídeo diz se chamar Matheus, não aceita a humilhação e responde. “E daí? E daí quanto eu tiro por mês? Eu também posso ter a mesma coisa que o senhor. O senhor conseguiu por quê? O seu pai te deu?”, pergunta.

    Segundo o documento da Polícia Civil, tudo teve início quando o rapaz disse que “não seria bem visto com os outros motoboys”, pois a entrega era para um cliente conhecido por obrigar os entregadores a irem até a porta da sua casa. Normalmente, conta o rapaz, os clientes vão até a entrada do condomínio para retirar as encomendas. Com a fala, Mateus se exaltou.

    “O cliente exaltou-se muito e passou a ofendê-lo xingando-o de “preto, favelado, pobre, ‘olha seu tênis furado'”; que, com dedo em riste, passou a lhe fazer ameaça, esbravejando que conhecia policiais e sua família seria do meio militar e que ele iria se dar mal”, consta no histórico do caso. Dois moradores agiram, pois sentiram que Mateus agrediriam o entregador, ainda conforme o B.O. descreve.

    Em sua versão, Mateus Abreu Almeida Prado Couto alegou que se exaltou porque o entregador o chamou de “mal falado entre os motoboys”. Por isso, teria o chamado de “favelado, pobre, marginal”. Mateus nega ter sido racista ou ter feito ofensa direcionada à cor de pele, conforme flagrado nas imagens, e ainda alegou que a vítima “chegou a avançar contra ele e contra outros moradores”.

    Sequência da discussão e do agressor apontando para sua cor de pele | Foto: Reprodução

    Pai de Mateus, Fernando Magalhães Almeida Prado Couto, alega no documento que seu filho possui esquizofrenia e que faz tratamento para a doença. Em 2019, ele registrou o furto do carro de Fernando, mas alegou em processo que foi um engano causado pela doença.

    A mãe do rapaz vítima de racismo usou as redes sociais para denunciar o caso. “Vamos deixar esse escroto de camiseta azul famoso, pois ele foi racista com um entregador que estava apenas fazendo o seu trabalho, e esse ser xingou e humilhou um trabalhador, se achando melhor que ele por morar em um condomínio de luxo”, escreve.

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    Na postagem, ela se mostrou indignada com a violência passada pelo seu filho. “Ninguém é melhor que ninguém por ser rico ou ser branco. E como é de família rica, isso vai acabar no esquecimento como sempre acontece. Então, por isso, resolvi postar o vídeo. Isso é racismo e é crime”, desabafa.

    Bom dia vamos deixar esse escroto de camiseta azul famoso pois ele foi racista com um entregador que estava apenas fzd o seu trabalho e esse ser chingou humilhou um trabalhador se achando melhor que ele por mora em um condomínio de luxo pois saiba ninguém é melhor que ninguém por ser rico ou ser branco e como é de família rica isso vai acabar no esquecimento como sempre acontece então por isso resolvi postar o vídeo isso é racismo e é crime e esse entregador é meu filho um trabalhador onesto e ñ precisa sentir ou ter inveja de um escroto como esse pois ele ñ é mesmo tendo dinheiro pra compra td Oq quiser jamais comprará a educação o respeito pois isso vem de berço e dinheiro ñ compra jamais

    Publicado por Maria Pires em Quinta-feira, 6 de agosto de 2020

    Segundo entrevista do jovem ao G1, sob condição de não ter seu nome inteiro divulgado, esta não foi a primeira vez que o homem foi grosso com ele por não encontrar o endereço da casa para realizar a entrega. Desta vez, Mateus também cometeu racismo contra o entregador.

    “Eu falei pra ele que não podia fazer mais isso porque ninguém gostava desse tipo de atitude. O que ele faz é pra se mostrar superior”, relata o rapaz, dizendo ter sido atingido por um cuspe do homem branco. “Teve um momento que ele cuspiu em mim, jogou a nota no chão e disse que eu era lixo. Na frente da polícia, ele continuou com as agressões, me chamou de favelado”, diz.

    O jornalista Reinaldo Gottino, apresentador da TV Record, informou que Matheus receberá uma moto de um famoso, sem explicar quem seria o autor da ação, que se sensibilizou com o caso vivenciado pelo entregador.

    Em live no Instagram, o apresentador Luciano Huck conversou com Matheus e prometeu uma moto para o rapaz. “A moto que fundiu o motor… Conta comigo”, declarou Huck, após o trabalhador dizer que perdeu um veículo por problemas mecânicos.

    Em uma publicação no portal Certas Palavras, um usuário denominado como Mateus Abreu Almeida Prado Couto exalta a sua descendência portuguesa. “Eu tenho muito orgulho de ter descendência portuguesa, como Olavo de Carvalho escreve “O idioma que herdamos de Camões é uma língua de guerreiros e navegantes, não de cortesãos (sic) efeminados”, escreveu.

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    A Ponte questionou a SSP (Secretaria da Segurança Pública) de SP, comandada pelo general João Camilo Pires de Campos neste governo de João Doria (PSDB), sobre o caso e aguarda um posicionamento.

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