Deputadas lançam Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos das Pessoas LGBT+, iniciativa que busca e discutir os direitos e demandas de gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros; ação coincide com primeiro mandato de parlamentar negra e trans
Pela primeira vez, depois de 41 anos, o Plenário Juscelino Kubitschek, desde que passou a receber o nome do ex-presidente em 1978, o espaço usado exclusivamente para sessões solenes na Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo) recebeu uma diversidade e pluralidade de corpos.
Na noite da última segunda-feira (10/6), o auditório, que comumente é ocupado pelos deputados estaduais, que são, em sua maioria, homens brancos e cisheternormativos, recebeu cerca de 200 pessoas, representando os movimentos negros, de mulheres e LGBT+.
Homens e mulheres negros e negras, gays não-masculinizados, lésbicas não-feminilizadas, bissexuais, travestis, mulheres transexuais e pessoas transmasculinas participaram da sessão solene que lançou a “Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+”, coordenada pela Mantada Quilombo, da deputada estadual Erica Malunguinho (Psol-SP) e vice-coordenação da deputada estadual Leci Brandão (PCdoB-SP) e dos co-deputados da Bancada Ativista (Psol-SP).
A deputada Erica Malunguinho, primeira parlamentar transexual negra do Brasil e do mundo, explicou à Ponte como funcionará a Frente Parlamentar LGBT+. “A Frente funcionará exatamente dessa forma, com escuta ativa e aberta para que os movimentos tragam as demandas. A gente sabe, a gente tem algumas demandas e caminhos de luta, mas é fundamental que os movimentos que estão de fato movimentando as bases tragam as suas demandas para que a gente possa pautar aqui dentro da Alesp. Escuta sempre ativa, sempre aberta para trazer isso sistematizando para o lugar da institucionalidade”.
Erika Hilton, co-deputada da Bancada Ativista, que atuará na vice-coordenação da Frente, lembra que a iniciativa é inédita e explica com mais detalhes como será a atuação da Frente Parlamentar LGBT+. “Nunca antes se houve uma Frente ou qualquer grupo de trabalho que olhasse especificamente para as comunidades LGBTs. Temos agora o trabalho de juntar parlamentares, sociedade civil, especialistas para discutir quais são as suas necessidades, obstáculos, mazelas e desafios”, sustenta a parlamentar. “Vamos trazer os parlamentares para ouvir essa população e para tirarem da gaveta os projetos de lei que já estejam prontos, para começar a construir projetos de lei e vai trazer especialistas para tratar de uma série de temas, como segurança pública, saúde mental, saúde física, violência obstétrica, sistema endócrino, uma série de fatores que essa Frente tem o poder de juntar dentro desta Casa”, explica.
O evento contou com a fala de diversos movimentos e ativistas LGBT+ e negros, além de intervenções artísticas voltadas para a música, poesia, performance teatral e de dança. O encerramento ficou por conta do coletivo Travas da Sul, com direito a uma performance digna da comunidade LGBT+: com dança, alegria e bate cabelo. Entre os coletivos presentes estavam: Amem, Mães pela Diversidade, Transarau, Núcleo de Transmasculinidade – Família Stronger, Revolta da Lâmpada, Comissão de Diversidade da OAB, UNEAFRO, Vote LGBT, entre outros.
Durante a sessão, a deputada estadual Leci Brandão (PC do B) lembrou da importância da criação de uma frente voltada para os direitos LGBT+. “Dois mil e dezenove, mês de junho, dia dez, Frente Parlamentar em defesa dos direitos LGBT+. É um dia de muita emoção, de muita alegria e de muita gratidão. Gratidão à Deus, gratidão aos nossos orixás, porque como a gente poderia imaginar, depois de tantos anos, estar aqui dentro desse plenário, que só é aberto para sessão solene, ter uma sessão solene presidida pela primeira transexual do Brasil que entra numa Assembleia Legislativa”, discursou.
Leci também entonou que espera que a Alesp se torne um espaço acolhedor para LGBT+ e lembrou do episódio do discurso transfóbico proferido contra Erica Malunguinho em abril pelo também deputado estadual Douglas Garcia (PSL-SP). “Três coisas são negadas para população LGBT: a integridade física, a vida e o amor. O que a gente deseja é que a partir de agora essa Casa possa se despir de qualquer tipo de preconceito, que ninguém mais ouse falar qualquer coisa que seja minimamente ofensivo para Erica Malunguinho. Ela chegou, tomou posse e se colocou”, disse.
Para Erika Hilton, a presença desses corpos e da cultura LGBT+ dentro da Alesp é um marco histórico. “Eu zerei a vida, jamais poderia imaginar que teríamos uma sessão solene encerrada com bate cabelo. Isto é um marco histórico que não tem precedentes. Simboliza a luta, a alegria, a festa e a união desses povos. E fecha sim com o bate cabelo que está atrelado a história da comunidade LGBT+. As bichas mais velhas sonhavam em ser as estrelas do bate cabelo. E não só o cabelo, todos os relatos que foram feitos na tribuna, todas as pessoas que passaram por essa Casa, os rostos que foram vistos. Isso aqui é algo a ser celebrado por anos. Enche o nosso coração de esperança, de alegria e de crença em um amanhã melhor e em uma ocupação maior desses corpos dentro dessa casa”, comemora a co-deputada.
Ter um evento como esse, continua Hilton, é um respiro dentro de tanta coisa ruim. “Olhar ali de cima e ver esse lugar que é repleto sempre de homens brancos e engravatados coberto de corpos LGBT+, de bichas afeminadas, de corpos transvestigêneres, de uma pluralidade da comunidade LGBT+ é algo a se respirar e dizer: começamos. O projeto que se começou a anos está dando frutos agora e esses frutos estão sendo palpáveis”, finaliza.
Erica Malunguinho também engrossa a importância da presença de pessoas e da cultura LGBT+ dentro do espaço parlamentar. “Vimos a visualidade da cultura LGBT+, que faz parte o bate cabelo, o slam, a poesia, os tambores, a música. A cultura LGBT presente no plenário. Fizemos uma mistura de audiência pública com sessão solene para ouvir os movimentos. Essa é apenas uma parte do tanto de movimento que nós temos”, explicou.
Entre os nomes do ativismo LGBT+ presentes na sessão solene estava Neon Cunha. Aplaudida de pé depois da fala na plenária, Neon foi homenageada durante outras falas. Em entrevista à Ponte, ela comemorou esse momento histórico.
“Eu pago imposto, trabalho há 37 anos e tenho a certeza de que agora sim, ele será bem aplicado. Não que antes ele não era, quando eu penso no SUS, em universidades federais que ainda não são erguidas nas favelas, mas até que enfim o meu imposto justifica minha existência. Pensando na minha trajetória até aqui eu só diria pra você: eu sobrevivi pra ver as minhas semelhantes estarem lá onde deveriam estar”, enfatiza a ativista.
[…] era importante ampliar essa zona de atuação e continuar em contato com a Bancada Ativista e a Mandata Quilombo, da Erica Malunguinho, potencializando esse boom que tivemos em 2018, ocupando outros […]
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