Acampamento Terra Livre ocupa Brasília para debater direitos indígenas

A Ponte acompanha a 21ª edição do maior encontro de mobilização indígena do país — que discute até sexta-feira (11/4) o Marco Temporal, em disputa no STF, e o aumento da violência contra os povos tradicionais

Mais de 6 mil indígenas participam do Acampamento Terra Livre, celebrando os 20 anos da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) | Foto: Catarina Duarte/Ponte Jornalismo

Aldear a política é o que pretendem os participantes do Acampamento Terra Livre. A 21ª edição da maior assembleia de povos e organizações indígenas do Brasil acontece em Brasília, no Distrito Federal, até a próxima sexta-feira (11/4). Mais de 6 mil indígenas de 150 povos de diferentes regiões do país participam do evento.

O tema deste ano é “Apib somos todos nós — Em defesa da Constituição e da vida”, uma homenagem aos 20 anos da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). Entre as discussões centrais está a do Marco Temporal e o aumento da violência contra povos tradicionais.

Leia mais: Artigo | Em defesa dos direitos indígenas: o desafio do marco temporal e a unidade progressista

Em 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou a tese do Marco Temporal para demarcação de terras indígenas. Os ministros decidiram que a data da promulgação da Constituição Federal (1988) não pode definir a ocupação dos territórios por essas comunidades. 

A tese surgiu em 2009, em um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) que tratou da demarcação da terra indígena Raposa-Terra do Sol, em Roraima. A discussão chegou ao Supremo após uma ação que questionava a demarcação da Terra Indígena Ibirama-Laklãnõ, em Santa Catarina, que teve como base essa proposição. O julgamento começou em 2021.

O revés veio por via legislativa. A lei 14.701/23 foi aprovada no mesmo ano e reabilitou a tese. Quatro ações foram protocoladas no Supremo questionando a validade da legislação. O rescaldo foi a criação de uma comissão especial montada pelo próprio STF para tentar “conciliar” os interesses dos indígenas e dos ruralistas. A primeira reunião aconteceu em agosto de 2024, mediada pelo ministro Gilmar Mendes, relator de cinco ações sobre a tese.

A composição do colegiado, considerada desfavorável aos povos indígenas, fez a Apib retirar-se do processo. O objetivo do STF é construir um anteprojeto que altere a lei do Marco Temporal aprovada pelo Congresso. “A gente tem total discordância dessa câmara de conciliação aberta pelo ministro Gilmar Mendes para tentar reabrir um debate sobre negociação dos nossos direitos — direitos esses que foram duramente conquistados na Constituição de 1988”, diz Kleber Karipuna, Coordenador Executivo da Apib.

Entre os debates previstos estão o lançamento de uma Comissão Internacional Indígena para a COP 30, que ocorre em Belém (PA), e a discussão sobre uma Comissão da Verdade Indígena | Foto: Catarina Duarte/Ponte Jornalismo

Aumento da violência

Enquanto não há uma definição, a violência contra povos indígenas gera medo e preocupação. Em Ilhéus, no sul da Bahia, indígenas Pataxó protestaram contra o Marco e a violência. Em março, os Pataxós perderam Vitor Braz, assassinado a tiros. O Conselho de Caciques Pataxó da TI Barra Velha de Monte Pascoal (Conpaca) atribuiu a morte a pistoleiros contratados por fazendeiros da região.

A morte ocorreu um dia antes de uma audiência pública em Brasília que discutiu a demarcação de terras dos Pataxós e Tupinambás, ambas comunidades do sul da Bahia. 

Leia mais: 1500 deveria ser data de marco temporal para os brancos no Brasil, diz Neidinha Suruí

Os pataxós também denunciaram uma ação violenta da Polícia Militar do governador Jerônimo Rodrigues (PT-BA). O Conselho de Caciques denunciou que crianças e idosos tiveram armas apontadas contra suas cabeças. A PM foi até a comunidade cumprir mandado de prisão por crimes como esbulho — invasão de propriedade. 

A violência, reflexo da disputa por territórios, não é um caso restrito à Bahia. Segundo o Conselho Indigenista Missionário, em 2023, foram registrados 276 casos de invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio em pelo menos 202 territórios indígenas em 22 estados do Brasil.

Programação do evento

É para fazer frente a investidas que atacam o direito à terra que os povos se reúnem nesta que é a maior assembleia indígena do país. Para quarta-feira (9/7) está prevista uma plenária que vai discutir o Marco Temporal e a audiência de conciliação.  

O debate também avança por outros temas. O lançamento de uma Comissão Internacional Indígena para a COP 30 e a discussão sobre uma Comissão da Verdade Indígena, para apurar os crimes da ditadura contra os povos originários, são outras temáticas que integram a programação.

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Um ato contra a violência dirigida aos povos indígenas ocorre nesta terça-feira (8/4). Na quinta (10/4), acontece a manifestação “Memória, Justiça e Resistência Indígena LGBTQIA+”. O acampamento está montando no Eixo Cultural Ibero-Americano. 

A repórter Catarina Duarte viajou a Brasília a convite do Instituto de Desenvolvimento Institucional e Ação Social (IDEAS).

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