Caio Muratori disparou contra carro furtado em perseguição e acertou Waldik Gabriel Chagas na cabeça em junho de 2016; jurados acolheram tese de legítima defesa
O ex-guarda civil metropolitano Caio Muratori, 50, foi absolvido, nesta terça-feira (6/9), pela morte de Waldik Gabriel Silva Chagas, então com 11 anos, em 26 de junho de 2016, após uma perseguição no bairro de Cidade Tiradentes, na zona leste da cidade de São Paulo.
De acordo com a sentença, os jurados reconheceram que Muratori matou a criança, mas seguiram o entendimento de “existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena, ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência”, previsto no artigo 386 do Código de Processo Penal.
Muratori foi acusado por homicídio qualificado por meio empregado que possa resultar perigo comum porque, segundo a denúncia, assumiu o risco de matar ao disparar contra o veículo Chevette em movimento em que o menino estava e por estar em uma via movimentada de pessoas.
Na época, Waldik e outros dois adolescentes furtaram um veículo, modelo Chevette, de cor prata. Na Rua Saturnino, em Cidade Tiradentes, na zona leste da cidade de São Paulo, o garupa de uma moto viu a viatura e avisou a GCM que um carro havia sido roubado. Na Avenida Doutor Guilherme de Abreu Sodré, altura do número 90, os agentes encontraram o Chevette, afirmam ter dado sinal de parada, mas os jovens fugiram atirando, segundo a versão oficial. Caio estava com outros dois guardas na viatura, mas somente ele ordenou a perseguição e atirou.
Durante a ação, Muratori disparou quatro vezes na direção do Chevette, acertando um disparo no vidro traseiro e, em seguida, na cabeça de Waldik. A perseguição teve fim na rua Regresso Feliz, 131, próximo a uma quermesse. Os dois adolescentes fugiram correndo. Frequentadores da festa cobraram os guardas para que resgatassem a criança que agonizava dentro do carro. Socorrido, Waldik morreu antes de chegar ao pronto socorro da região. A perícia feita no veículo indicou que apenas um disparo foi feito, de fora para dentro do Chevette, que estava com suas janelas fechadas durante a perseguição.
Um dos adolescentes que estava com Waldik e foi apreendido dois dias depois do crime disse nas audiências que eles furtaram o veículo, mas que não estavam armados e resolveram “passear pela cidade” quando passaram a ser perseguidos pela viatura da guarda, que efetuou os disparos.
No dia seguinte, o então prefeito Fernando Haddad (PT) declarou que a “abordagem foi equivocada”. “A abordagem não deveria ser essa. Não estou pré-julgando o guarda, mas, pelas primeiras investigações, você nota que a abordagem não segue o protocolo de uma Guarda Civil. É muito mais afeita à Polícia Militar do que propriamente à Guarda Civil”, disse Haddad.
Muratori foi demitido da corporação em novembro de 2016, conforme publicação do Diário Oficial da cidade. Uma das normas apontadas para a demissão é de não disparar contra veículo em fuga ou que fure bloqueio. Ele argumentou que viu um dos ocupantes do carro furtado efetuar três disparos em sua direção e que tentou revidar atirando nos pneus do veículo. Já durante as audiências, disse que “viu um clarão no interior do Chevette e julgou ser disparo com arma de fogo” e que ele deu quatro tiros em legítima defesa.
À Ponte, o advogado Mauro Ribas, que representa o ex-GCM, disse que os jurados acolheram a tese de legítima defesa. “Nós fundamentamos a defesa dele de forma que comprovamos que vieram disparos do veículo Chevette, que era o veículo em que o Waldik e os dois menores de idade estavam. Existe um laudo que deu vestígios de chumbo no teto do Chevette, comprovando que teve disparos no interior do Chevette. Além disso, tinha três embates de projéteis na porta do passageiro traseiro direito da viatura, que era o lado que o Caio Muratori estava. Então, através desses laudos, nós comprovamos que houve disparos vindo do Chevette e que o Caio Muratori, no revide, tentando atingir o pneu para imobilizar o carro para efetuar a prisão, veio a atingir o Waldik e por isso se configurou a legítima defesa”, declarou.
O defensor disse que Muratori ainda não avaliou se vai pedir para ser reintegrado à corporação pois a decisão ainda não transitou em julgado, ou seja, ainda há possibilidade de recurso. A assessoria do Ministério Público disse que a promotoria vai recorrer da sentença. Não conseguimos localizar familiares de Waldik para comentar sobre a decisão.