Atiradores em Suzano pretendiam humilhar meninas, segundo denúncia

    Justiça determinou apreensão por 45 dias de terceiro suspeito, ligado ao crime por conversas de WhatsApp, incluindo com um dos dois autores do ataque, e uma bota similar à usada pela dupla, segundo a Polícia Civil

    Homenagens levadas para às vítimas do ataque a escola Raul Brasil | Foto: Renan Omura/Ponte Jornalismo

    A Justiça de São Paulo autorizou a internação provisória por 45 dias do terceiro suspeito de planejar o massacre em Suzano, ocorrido na Escola Estadual Raul Brasil no dia 13 de março. Esse é o segundo pedido feito pela Polícia Civil para a internação do adolescente, de 17 anos, acatado dessa vez por apresentar mais provas.

    Segundo documento assinado por três delegados que investigam o caso, conversas de WhatsApp comprovam que o jovem teve “atividade acessória” no crime apoiando e instigando a ação praticada por Guilherme Taucci Monteiro, 17 anos, e Luiz Henrique de Castro, 25. No total, dez pessoas morreram, sendo sete dentro da escola, o tio de Guilherme e os dois autores, que cometeram suicídio.

    Os delegados pontuam que as conversas evidenciam a ligação do terceiro suspeito com os dois assassinos, principalmente com Guilherme, que seria seu amigo de infância. O depoimento de uma pessoa ligada ao segundo adolescente corrobora com a tese da Polícia Civil.

    “Ele é mentor intelectual, comprou objetos, objetos que poderiam fazer ele participar daquele delito, participação dele com um dos autores na compra de outros objetos e na idealização de outros objetos”, garantiu o delegado Alexandre Dias, titular da delegacia central de Suzano, em entrevista coletiva após a apreensão do jovem.

    Além das falas, há no processo uma bota encontrada na casa do suspeito. O modelo do calçado é similar ao utilizado pelos atiradores, que entraram na escola com pistolas, besta, machados e coquetel molotov.

    “É notório que [nome do adolescente] está transtornado emocionalmente e, em uma análise atécnica de perfilamento criminal, [nome do adolescente] demonstra fortes tendências para a prática delitiva, recaindo, pois, responsabilidade do Estado quanto a esta proteção específica e prevenção geral”, sustenta Alexandre Dias junto dos também delegados Lourival Zacarias e Jaime Pimentel, que atuam em Suzano e Mogi das Cruzes, respectivamente.

    A Justiça considerou os elementos suficientes para acatar o pedido e definir a apreensão do jovem pelo período de 45 dias. “Há provas testemunhais. As investigações apontam que ele é mentor intelectual junto com outro assassino menor de idade”, assegura o delegado Dias.

    Em uma das conversas no processo, o suspeito admite em conversa de WhatsApp que Guilherme, seu amigo de infância e autor do crime, “fez o que a gente vivia conversando sobre”. Já em outra parte, o jovem detalha como criou o plano, segundo ele quando “estava no 1º ano” do ensino médio.

    “A gente ia deixar as garotas nuas e executar algumas no meio do pátio e deixar o corpo de uma forma humilhante”, detalha o jovem em uma conversa. A forma de agir é similar às falas de incels (celibatários involuntários, homens que não conseguem fazer sexo e culpam as mulheres e o mundo por isso) que participam do fórum Dogolachan, na deepweb, em que propagam racismo, misoginia, pedofilia e a ações de incels.

    Ainda de acordo com o pedido da Polícia Civil, o terceiro suspeito admite que uma das vítimas do ataque era desafeto de Guilherme Taucci: o jovem José Vítor, atingido com uma machadada e que se socorreu sozinho até o hospital. Em outra conversa, ele rebate a pessoa que se disse chocado com o massacre. “Eu não. É uma coisa que eu faria mesmo”, teria dito. “Mano, no mínimo foi planejado. E ele fez igual os meus planos, cara”, diz, posteriormente.

    Os casos tem inspiração em Columbine, crime ocorrido nos Estados Unidos em 1999, com 15 mortos. Outras ações como em Realengo (RJ), com 12 mortos, e o assassinato de duas lésbicas em Penápolis (SP), foram praticadas por incels. Em Realengo, as principais vítimas eram mulheres.

    A Ponte buscou o advogado Marcelo Feller, que representa o adolescente, mas não conseguiu contatá-lo. Ao G1, ele explicou que o suspeito era amigo de um dos atiradores, mas retomaram contato há alguns meses após um tempo que passaram brigados. “Para mim, ele negou qualquer participação nesse ato. O que me parece bastante crível pela mensagem que ele manda para o próprio atirador informando o que está acontecendo”, assegura Feller.

    À página de Facebook Independente, o adolescente garantiu não ter articulado ou pensado o ataque com os dois atiradores. “Eu vou estar preso porquê se eu não tenho nada a ver com isso? Que provas eles têm? Eu não estava”, declarou.

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