Ato na medicina da USP questiona formatura de aluno acusado de estupros

    Colação de grau ocorrerá ainda em novembro. Além de responder a processo judicial por violência sexual, estudante já matou um homem com oito tiros

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    Coletivos feministas realizam protesto na Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), em São Paulo (SP) nesta quarta-feira (09/11), contra a colação de grau de Daniel Tarciso da Silva Cardoso, acusado de dopar e estuprar pelo menos seis estudantes em festas universitárias da faculdade. O estudante concluiu o curso de medicina em 25 de outubro e, em breve, será oficialmente médico. Cardoso pretende se especializar em ginecologia e obstetrícia, afirmam estudantes e professores da faculdade.

    Após suspensão de um ano e meio determinada por um processo disciplinar instaurado pela faculdade depois da realização da CPI dos Trotes, entre novembro de 2014 e março de 2015, o aluno fez a última prova que faltava para terminar o curso e agora poderá colar grau. A cerimônia da turma de Cardoso será no dia 17 deste mês, mas a faculdade não informou se ele participará ou não da solenidade.

    O fim da suspensão é motivo de repúdio de professores e alunos. “Queremos mostrar que a diplomação dessa pessoa não será feita por debaixo dos panos e nem impunemente. A diretoria tem uma postura de lavar as mãos com os casos de violência denunciados, como se não houvesse nada o que eles pudessem fazer. Eles querem silêncio, mas nós queremos justiça”, afirma Ana Cunha, estudante da FMUSP.

    Docentes também pediram a extensão da pena do aluno, mas a Procuradoria da USP informou que ele está apto a obter título de médico. A professora Maria Ivete Boulos, que estava à frente do Núcleo de Estudos e Ações em Direitos Humanos (Neadh), que acolhe vítimas de violência sexual, tentou impedir que Cardoso realizasse a última prova que precisava para concluir o curso e colar grau, mas, em 17 de outubro, foi avisada, por email, que havia sido afastada do cargo.

    Em novembro de 2014, a Ponte Jornalismo revelou, por meio de uma série de reportagens, casos de violência sexual, castigos físicos e preconceito na faculdade de medicina mais importante do país.

     

    “Deveria ter sido expulso”

    Três das seis vítimas de estupro formalizaram a denúncia na faculdade e as outras três denunciaram à Rede Não Cala USP, formada por professores para acolher vítimas de violência sexual e de gênero na USP. “Os fatos são gravíssimos e há provas. Ele deveria ter sido expulso A faculdade não trata com a devida indignação e seriedade o fato e não leva a sério as demandas das vítimas”, afirma a professora de antropologia Heloisa Buarque de Almeida, integrante da Rede.

    O estudante foi acusado pelo Ministério Público por dois dos casos de violência sexual, que tramitam em segredo de Justiça. Um deles é o de uma aluna de enfermagem, que em 2012 foi dopada durante uma festa dos alunos de medicina e relata ter acordado durante o estupro, na Casa do Estudante, residência estudantil onde Cardoso morava.

    Entre 2004 e 2008, Cardoso foi policial militar. No seu primeiro ano na PM, matou um homem com oito tiros durante uma briga em um bloco de carnaval. Processado pela justiça comum, foi denunciado por homicídio doloso e condenado por homicídio culposo, após alegação de que teria cometido o crime em legítima defesa. Após recurso, em agosto de 2012 o Tribunal de Justiça extinguiu a pena.

    Professores e pesquisadores da Rede Não Cala USP divulgaram nota de repúdio à decisão da faculdade de permitir Daniel colar grau. “O que compromete mais o nome da faculdade: revelar tais casos ou proteger quem cometeu uma agressão?”, diz a nota.

    De acordo com Luiza Ribeiro, do coletivo feminista Geni, que surgiu após denúncias de violência sexual na USP, em 2013, “o caso mostra descaso e omissão institucional. A Faculdade deu pena de suspensão maior para uma menina que foi pega fazendo a prova de outra. Agora torcemos para que o resultado seja favorável no âmbito penal”, afirma.

    Procurada, a Faculdade de Medicina da USP não retornou até a publicação da reportagem.  O advogado do aluno, Daniel Alberto Casagrande, não foi encontrado para comentar o caso.

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