Sérgio Silva levou um tiro de bala de borracha, em 2013, durante a cobertura de um protesto. Reveja vídeo com a conversa entre Sérgio e Alex Silveira, que sofreu a mesma violência há 16 anos atrás.
É uma decisão desastrosa que atinge o fotógrafo Sérgio Silva diretamente, mas também é uma agressão ao jornalismo”, disse Marcos Alves, presidente da Arfoc-SP (Associação de Repórteres Fotográficos e Cinematográficos no Estado de São Paulo) sobre a decisão do decisão do juiz Olavo Zampol Júnior, da 10ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo.
Júnior negou o pedido de indenização, feito pelo fotógrafo contra o Estado, no valor de R$ 1,2 milhão, mais uma pensão e o reembolso de despesas médicas por ter sido atingido por uma bala de borracha disparada pela Polícia Militar, em junho de 2013, durante um protesto contra o reajuste das tarifas do transporte coletivo. Silva estava trabalhando, fotografando a manifestação, foi atingido e perdeu a visão no olho esquerdo.
Para o juiz a culpa foi do fotojornalista e não da PM : “as possíveis consequências do que pudesse acontecer, exsurgindo desse comportamento causa excludente de responsabilidade, onde, por culpa exclusiva do autor, ao se colocar na linha de confronto entre a polícia e os manifestantes, voluntária e conscientemente assumiu o risco de ser alvejado por alguns dos grupos em confronto”.
O presidente da Arfoc contesta os critérios de avaliação do juiz. “As imagens feitas na época mostram que os policiais estavam atirando deliberadamente nas pessoas. Não foram cumpridos os protocolos de segurança para o uso das armas com bala de borracha. A decisão do juiz é absurda. O Sérgio foi um alvo, como tantos outros manifestantes naquele dia. Ele estava no exercício da profissão”, arrematou o presidente da Arfoc-SP.
Nas redes sociais, a divulgação da decisão causou revolta e protestos. “Culpado é meu mano, Sérgio Silva, que estava trabalhando e cobrindo o massacre do dia 13/06/13 e não os sádicos despreparados que vestem farda e que burlam todas as convenções internacionais que não permitem atirar balas de borracha acima da linha da cintura”, escreveu a fotógrafa Renata Armelin, do coletivo Mamana Foto. Desde ontem, milhares de perfis no Facebook estão repercutindo a notícia com a hashtag #somosculpados, #somostodosculpados e #somoscumplices.
Amanhã, 19, o fotógrafo Sérgio Silva vai conceder uma entrevista coletiva na sede do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo para falar sobre o caso. A coletiva está marcada para começar às 10h. “Vamos dar o total apoio ao Sérgio”, disse o presidente da Arfoc.
Sérgio Silva também realizou duas edições da exposição fotográfica “Piratas Urbanos”, em 2014, para apoiar a proibição do uso de balas de borrachas em manifestações.
Outro caso
Há 16 anos, o fotojornalista Alex Silveira também foi atingido por uma bala de borracha no rosto e acabou com apenas 10% da visão em ambos os olhos. Silveira também entrou com uma ação contra o Estado. Em 2014, a decisão da segunda instância da Justiça de São Paulo, também responsabilizou o profissional pelo ferimento, inocentando a Polícia Militar.
Ao saber da decisão do caso do colega, Silveira desabafou em um rede social. “Hoje acordo com a nítida e incomoda impressão que minha história realmente se tornou referência, e o que é pior (jurisprudência), para um dos mais absurdos desrespeitos, não só à democracia e à integridade humana, como também às próprias leis da física. Peço [ajuda] aos mais esclarecidos nesse assunto: como pode a ciência explicar a interpretação de um dito juiz ou pior desembargador ver, ou melhor não ver, o tamanho disparate que é achar que um ser humano pode se colocar na rota de uma bala?”.
*Texto originalmente publicado no R7