PM assumiu risco de matar atriz, diz ouvidor das polícias

     

    Em entrevista à Ponte, Julio Cesar Fernandes Neves, diz que é surpreendente o fato de a Polícia Civil não ter aberto inquérito para apurar morte no interior de SP

    A Ouvidoria das Polícias do Estado de São Paulo enviou um ofício à Polícia Civil para que seja aberto um inquérito para apurar a morte da atriz Luana Barbosa, no dia 27 de junho, após um disparo feito pelo policial militar Marcelo Coelho. Em entrevista à Ponte, o ouvidor Julio Cesar Fernandes Neves afirma que a investigação feita pela própria Polícia Militar não é suficiente para apontar as responsabilidades no caso. “É inesperada a não-abertura do inquérito pela Polícia Civil. É surpreendente, já que houve um homicídio e, no mínimo, dolo eventual. Ele assumiu o risco de matar”, diz. O porta-voz da delegacia seccional de Presidente Prudente, o delegado da assistência policial Antenor Pavarina alega que, por ser culposo, a investigação sobre o homicídio ficou a cargo da Justiça Militar.

    Foto: Arquivo pessoal/Facebook
    Foto: Arquivo pessoal/Facebook

    Luana, que interpretava a palhacinha Meia Lua Quebrada em peças na região, foi morta com um tiro no tórax desferido por Coelho. A atriz estava na garupa da moto do namorado, Felipe Barros, 29 anos, que não teria obedecido a uma ordem de parada em um bloqueio policial. O PM alega que foi tudo um acidente, porque, ao fazer a abordagem, o capacete de Barros teria batido em sua arma e então ocorreu o disparo. A versão é contestada pela família, que exige uma investigação também na Polícia Civil, onde o caso foi registrado como homicídio culposo (sem intenção).

    Por que a Ouvidoria pediu a abertura do inquérito na Polícia Civil?

    Julio Cesar Fernandes Neves: Porque o condutor da moto nega que tivesse fugido e atingido o policial. O policial fala que o capacete teria batido na arma, em sua defesa. Tendo ocorrido o disparo, a gente entende que houve, sim, dolo eventual. Ele pode não ter tido a deliberação (de matar), mas assumiu o risco do resultado quando deu o tiro que matou. É por isso que a Justiça Comum deve entrar no caso. Hoje, a competência do homicídio doloso é da Justiça Comum.

    Houve uma falha na postura do delegado responsável pelo caso

    Sem dúvida. Ele tinha que abrir um inquérito policial para investigar o crime paralelamente. Ninguém está falando que a PM não devesse investigar, mas a Polícia Civil deveria abrir o inquérito e investigar o caso também.

    O senhor enviou um ofício ao departamento da Polícia Civil na região, não?

    Enviei um pedido a respeito do inquérito policial, que deveria ter sido instaurado. É inesperada a não-abertura do inquérito pela Polícia Civil. É surpreendente, já que houve um homicídio e, no mínimo, dolo eventual. Ele assumiu o risco de matar. É o mínimo, porque para acertar a garupa da moto ele mirou, sim. Mas ele diz que foi uma fatalidade.

    Qual deveria ser a postura do PM durante a abordagem?

    É uma coisa sobre a qual tenho falado. A arma do policial não é usada para parar infrator de trânsito, para ficar com o dedo leve e atirar. A arma deve ser usada para a legítima defesa e para prender cidadãos que cometem crimes graves, não para atirar em infrator de trânsito. Ele (o policial) demonstrou ter o dedo leve. A possibilidade de se alvejar uma pessoa inocente é muito grande. Eles tinham que tentar pegar a chapa da moto e depois identificar o proprietário.

    Qual a avaliação da Ouvidoria sobre o fato de o policial estar trabalhando, apesar da morte da atriz?

    Houve um habeas corpus. Segundo nota do 18º BPM, ele ficaria em serviço administrativo. Todo mundo tem o direito de tentar a liberdade. A postura da delegacia em Presidente Prudente, do Deinter, é que não está sendo a esperada pelos operadores do direito, pela Ouvidoria e pelo próprio Ministério Público.

    O senhor pediu ajuda ao Ministério Público?

    Pedi ao procurador que fosse designado um promotor público em Presidente Prudente para acompanhar o caso.

    O inquérito policial militar é suficiente para investigar esse tipo de caso?

    Não. Não acredito nisso, até pela possibilidade do corporativismo. Eles deveriam mandar para a Corregedoria da PM, mas mesmo assim a Polícia Civil tem que entrar no caso e abrir inquérito, para que haja transparência nas investigações.

    O senhor já teve algum retorno da Secretaria da Segurança Pública sobre a morte de Luana?

    Não tive retorno ainda, mas em último caso vou pessoalmente conversar com o secretário (Fernando Grella Vieira) sobre essa situação.

     

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