Paulo Perondi estava com noivo em ônibus municipal de São Paulo, quando três cobradores e o motorista começaram as ofensas; ele divulgou a história nas redes sociais e registrou boletim de ocorrência
O analista de relacionamento sênior Paulo Perondi foi buscar o noivo, Jonathan Araujo, no trabalho, nesta terça-feira (9/10), e os dois seguiam de ônibus para a casa, quando uma passageira estava distraída com o celular próximo da janela do coletivo e foi furtada. Segundo Paulo, três cobradores – uma mulher que estava no horário de trabalho e outros dois homens que estavam apenas pegando carona até a garagem – e o motorista disseram que “se Bolsonaro ganhar, não vai mais ter essa coisa de roubar”. A alegação do trio é que com uma maior tolerância com a política de armar a população, uma das bandeiras do candidato do PSL, eles poderiam “matar todo mundo”. O caso aconteceu no Largo do Paissandu, no centro de São Paulo, na linha 8600-10.
“Eles começaram a falar que se Bolsonaro ganhar esse tipo de coisa não vai mais acontecer, eles vão matar todo mundo, aquele discurso que a gente tem ouvido com frequência. Na sequência, talvez até por perceberem nossa presença no ônibus, emendaram dizendo em alto e bom som que poderiam matar os viados, as sapatas”, conta Paulo em entrevista à Ponte. “Deixa de ser uma ameaça apenas homofóbica e vira ameaça de morte”, destaca o analista.
Paulo relata que quando ele e o noivo já tinham descido do ônibus, ainda ouviram os funcionários da viação Santa Brígida, responsável pela linha, ofenderem uma drag queen que passava perto do coletivo. “Eles disseram que essa raça toda tinha que morrer”.
“A gente fica sentido com a situação. Começamos a pensar que isso pode acontecer mesmo. A gente tem tido medo, sim. Meu noivo estava passando mal na hora e decidimos descer do ônibus. Eu falei para os quatro [os três cobradores e o motorista] que eles estavam nos ofendendo e que isso não ia ficar assim”, relata Paulo, que decidiu então tirar uma foto do ônibus para facilitar a identificação dos agressores. Ainda na terça-feira, o companheiro dele, Jonathan, registrou um boletim de ocorrência por injúria.
Paulo acredita que existe um processo de normalização do discurso de ódio, que na verdade sempre existiu, mas era mais envergonhado. “Não é que o Bolsonaro vai pegar um arma e matar todo mundo. Mas ele está dando a liberdade para aquele povo que estava escondido com a homofobia, o machismo, a xenofobia, enfim, tenham liberdade agora para gritar algo o preconceito deles”, analisa.
Quando Paulo conheceu Jonathan, no trabalho, ele tinha compromisso com uma mulher. “Eu era supervisor dele, começamos a conversar com frequência e quando vi estávamos envolvidos”, conta. Paulo então assumiu, sob forte medo de alguma crítica da família, o relacionamento com o novo amor. “Eu estava brigando comigo mesmo por algo que nem eu mesmo aceitava. Tive depressão, mas com ele [Jonathan] do meu lado, me apoiando, ficou mais fácil passar por isso”, lembra.
O casal está junto há 3 anos e Paulo tem muito orgulho dessa relação. “A gente não vai se calar, a gente tem uma vida. Não é nossa condição sexual que vai diminuir a gente na frente dos outros”, desabafa. “A agressão pode não ter sido direcionada exatamente para mim, mas ofendeu o grupo ao qual eu faço parte, que é o LGBT. E eu vou defender isso até o fim”, conclui.
Outro lado
A Ponte procurou, por e-mail, a SPTrans que, em nota, informa que “a prática descrita não faz parte da conduta esperada dos operadores do sistema municipal de transporte coletivo público. A Viação Santa Brígida, empresa responsável pela operação da linha 8600/10, foi acionada para identificar os funcionários envolvidos e tomar as medidas disciplinares cabíveis”. Além disso, a SPTrans afirma que se coloca à disposição para colaborar com as investigações.
A SSP (Secretaria de Segurança Pública de São Paulo) informa que o caso está sendo investigado pelo 3º DP, nos Campos Elíseos, no centro da capita paulista. A pasta também afirma que crimes de intolerância podem ser registrados pessoalmente ou pela internet e destaca que também podem ser comunicados à PM mais próxima.