Quase um ano após assassinato, Mangueira incluiu vereadora em seu enredo sobre heróis da resistência com companheira Mônica Benício no desfile; Vila Isabel levou família da parlamentar para Sapucaí
Exatos 355 dias desde o assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, no centro do Rio de Janeiro, escolas de samba exaltaram o legado da mulher negra, lésbica e periférica na Marquês de Sapucaí – local dos desfiles na cidade. Mangueira e Vila Isabel repetiram a Vai-Vai em São Paulo e também homenagearam a parlamentar entre figuras de resistência na história do Brasil e levaram seus familiares para a avenida.
A Mangueira, chamada de verde e rosa pelas suas cores, incluiu Marielle entre os nomes no enredo de 2019, chamado de “História pra ninar gente grande”, contando a trajetória desde a criação do Brasil através da resistência de heróis – e heroínas – negros e índios. Desde a invasão dos portugueses, passando pelas tribos dizimadas até figuras quilombolas. A ideia era contar “a história que a história não conta”, como conta um verso do samba.
Mônica Benício, companheira da vereadora, esteve em uma ala no desfile da escola e saiu emocionada com a homenagem verde e rosa. “Isso só concretiza a ressignificação daquela noite de 14 de março, em que vai completar um ano do assassinato de Marielle sem que o estado brasileiro responda quem mandou matar. Acho que isso é uma resposta de que vai haver luta até a gente ter uma resposta para isso”, afirmou Mônica, ao sair da Sapucaí.
No entanto, nem todos se sentiram representados pelo samba, caso do deputado estadual pelo RJ Rodrigo Amorim (PSL), que se definiu como seguidor da escola há anos. Responsável por protagonizar a quebra de uma placa com o nome de Marielle Franco durante a campanha eleitoral no ano passado, o parlamentar ligado ao governador fluminense, Wilson Witsel (PSC), e ao presidente, Jair Bolsonaro (PSL), criticou a “dominação cultura por parte da esquerda” em um samba “lacrador”.
Respostas vieram de todos os lados, a começar pelo carnavalesco Leandro Vieira, responsável pelo desfile da Mangueira, dizendo que o deputado “faltou a aula” e, por isso, “exibe orgulhoso sua ignorância”. “Sugiro que logo mais ele de fato não perca o desfile da Mangueira. Faça uso de sua ‘carteirinha’ mangueirense pra assistir na primeira fila a aula que a escola do coração dele vai dar. Se for bom aluno, vai aplaudir a sabedoria popular que a verde e rosa propaga no desfile de logo mais”, rebateu o Vieira.
Mônica Benício também falou sobre a declaração de Rodrigo Amorim. “Eu não me dou nem ao trabalho de sentir alguma coisa porque hoje ele pôde ver, depois do episódio das placas, mais uma vez, o tamanho que a Marielle tem, coisa que ele jamais terá”. Até a cantora Alcione, que participou do enredo da Mangueira, se posicionou. “Ele é um safado sem noção. Tomara que acompanhe mesmo de perto o nosso desfile”, disse.
Além da Mangueira, a Vila Isabel encontrou espaço para homenagear a história de Marielle Franco em seu samba-enredo sobre a cidade de Petrópolis, no RJ. Os familiares da vereadora executada em 14 de março de 2018 ocuparam o carro alegórico “Liberdade enfim raiou”, que representava a liberdade recebida pelos escravos com a Lei Áurea, assinada pela Princesa Isabel em 1888.
A mãe, Marinete Silva, o pai, Antônio Francisco da Silva, e a irmã, Anielle Franco, estavam logo acima de uma grande faixa escrito “Marielle Presente”. “Estamos contentes pela Vila Isabel ter nos convidados, ficamos muito emocionados. Marielle era povão, comunidade. Ela está sempre presente nos principais momentos da nossa vida”, contou Antônio à TV Globo, logo após o desfile.