Aldidudima Salles, o Pastor Salles, comandou 6 mil membros da facção na década de 1980 e foi condenado a 300 anos de prisão; hoje ele é candidato a deputado em SP pelo PSC
Pastor Salles, 55 anos, prega em uma igreja evangélica na zona leste de São Paulo. A vida que leva hoje em dia está em outro extremo comparado com a que tinha na década de 1980, quando participou da fundação do CV (Comando Vermelho), facção criminosa que atua no Rio de Janeiro até hoje. Agora, sua intenção é virar deputado estadual. Para isso, apoia a candidatura de Jair Bolsonaro (PSL) à Presidência e aparece em santinhos ao lado do capitão reformado do Exército.
“Apoio meu e do meu partido, de ambos, a Bolsonaro. Se formos olhar, temos Ciro, Geraldo, Haddad, o do Sul… Álvaro Dias… Acredito que nenhum deles que entrar vai fazer muita coisa pela situação do Brasil, mas acredito que se entrasse um cara linha dura, como o Bolsonaro, provavelmente ia ajudar alguma coisa”, defende Aldidudima, seu nome de batismo.
O ex-comandante da maior facção criminosa do RJ considera o também carioca Cabo Daciolo, “que é evangélico”, outra boa opção para a Presidência. Porém, aposta em Bolsonaro. “De todos os que estão, o Jair Messias Bolsonaro vai ser eleito no primeiro turno. Entre ele e Haddad, fico com Jair, não sou de esquerda”, diz.
O que faz uma pessoa com passado influente no mundo do crime considerar o capitão da reserva uma boa opção? “A proposta de ser contra aborto, que também sou, muito boa dele. É cristão, as igrejas evangélicas estão apoiando ele 100%. Gosto do jeito do Jair, me sinto bem ouvindo os comentários dele”, explica o Pastor.
Ligeirinho, como Aldidudima Salles era conhecido na época, liderou seis mil homens no CV. Ele diz ter matado 76 pessoas, levado 16 tiros quando estava na facção e pegado pena de 300 anos, com 10 cumpridos e liberado por bom comportamento.
O discurso é entoado em suas pregações para “mostrar aos jovens que o mundo do crime não compensa”. Agora, põe como missão defender a bandeira de Deus na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) como deputado estadual.
‘Matar? Só Deus’
Apoiar Bolsonaro não significa concordar com tudo que ele pensa, diz o Pastor Salles. Um dos ponto de discordância entre os dois são os discursos na linha de “bandido bom é bandido morto”, dito à exaustão pelo candidato do PSL. Jair pretende dar uma espécie de carta branca para as PMs matarem e não serem investigadas, o chamado “excludente de ilicitude”, hoje previsto no Código Penal para casos em que o agente público age em legítima defesa. No plano de Bolsonaro, a ideia é fazer com que esse dispositivo seja automático para qualquer ação de policiais, não importando se legítima ou não. O pastor é contra.
“Não é um discurso correto, só quem tem direito de tirar a vida é Deus. Bolsonaro tem a maneira dele de pensar, é um militar e linha dura, sei disso porque meu pai era militar também. Mas acredito que a partir desse lado a situação não vai mudar. Nesse sentido, isso vai piorar o que já está ruim”, analisa, buscando passar a mensagem de que o crime é prejudicial às pessoas.
“Essa é a minha missão desde quando vim para igreja: fazer coisa para quem esta envolvido nas drogas. Não sou a favor do tráfico, não sou a favor do crime, não a favor das drogas. Estive no meio da lama e tive que torcer para alguém fora do fundo do poço em que estava me tirar dali”, diz o ex-líder do CV, explicando um dos seus objetivos caso eleito.
“O que estou investindo muito é na recuperação de usuários, dependentes químicos. Sendo eleito, vou investir nessas casas de recuperação para eles saírem do crime, um mundo que não compensa”, diz. “Sobre meu passado, Jesus fez tudo mudar. Nunca tive a intenção de mostrar isso a favor, quem está no crime acha que fazer isso ou aquilo é ter moral. Se mostro o que fiz é porque estou arrependido, para incentivar ele a sair dessa vida”, explica.
Motivações para a candidatura
Aldidudima tentou virar político em outras oportunidades, sem sucesso: primeiro também para uma vaga na Alesp, em 2014, e depois como vereador na cidade de Pirapora do Bom Jesus, a 61 km da capital São Paulo. Desta vez, a candidatura tem a cantora Daniela Mercury como um dos motivos para a nova tentativa.
“Vi uma vez em Garanhuns, em Pernambuco, a Daniela Mercury falando em um show que Jesus era gay, que era bicha… Como pastor, não podia aceitar isso. Pensei em entrar na política não para me vingar, mas para ter poder nas mãos a ponto de defender a causa evangélica”, explica Salles, listando o fato de ser cristão, evangélico e “defensor da bandeira da fé em Deus” como as outras explicações.
“[Busco a política] Não para ficar rico, sei que vão falar isso. Vou ser um deputado diferente dos outros e sei que vou ser eleito, vou andar correto como a bíblia tem me ensinado”, promete o candidato. “Infelizmente a política do Brasil está um lixo, nossos representantes fazem mil promessas e não cumprem o que prometem, estamos sofrendo. Não posso concordar com esse tipo de coisa’, completa.
Aldidudima fez parte de um documentário publicado pela Ponte sobre presos que passaram pelo extinto Carandiru. Nele, relatou sua história no crime, durante a prisão e depois de solto. Há trecho de um de seus discursos como pastor.