Augusto Peña foi responsável por sequestro apontado como estopim para os ataques de maio de 2006; resgate de enteado de Marcola custou R$ 300 mil
O ex-policial civil Augusto Peña, acostumado a morar em apartamentos luxuosos nos bairros de Moema e Aclimação, áreas ricas da zona sul paulistana, está sentindo na própria pele o drama enfrentado por milhares de presos no cotidiano carcerário.
A apertada cela 310 do pavilhão 3 do superlotado CDP 3 (Centro de Detenção Provisória) de Pinheiros, zona oeste, é onde vive Peña, condenado a 22 anos pelo sequestro do enteado de Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, líder do PCC (Primeiro Comando da Capital).
Peña não está nada satisfeito com o novo endereço. Ele reclama que é obrigado a dormir diariamente no chão frio da cela superlotada e infestada de muquiranas e percevejos.
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Também se queixa que a cela é suja, ocupada por presos enfermos, doentes mentais e detentos comuns condenados pelos mais variados crimes, todos misturados a ex-policiais civis e militares, guardas de muralha, agentes de segurança e demais servidores públicos.
Mas o maior medo de Peña é o de morrer na prisão por ter sequestrado Rodrigo Olivatto de Morais, enteado de Marcola, em março de 2005. O ex-policial trabalhava em Suzano, na Grande São Paulo. Ele usou a delegacia como cativeiro e recebeu do PCC o resgate de R$ 300 mil.
Um relatório elaborado pela International Humans Rights Clinic, da Universidade de Harvard, em parceria com a Justiça Global concluiu que o sequestro de Rodrigo foi um dos estopins para os ataques de maio de 2006, protagonizado pelo PCC. O período ficou conhecido como “Maio Sangrento”. O PCC paralisou São Paulo, matando agentes das forças de segurança nas ruas e se rebelando em ao menos 74 presídios paulistas. Simultaneamente, policiais militares mataram centenas de pessoas no estado, no chamado “Crimes de Maio”.
Preocupado com a integridade física de seu cliente, o advogado Norberto de Almeida Ribeiro entrou com vários pedidos na Justiça solicitando a transferência de Peña para a Penitenciária 2 de Tremembé, no Vale do Paraíba. Todos foram negados.
A P2 de Tremembé, chamada de presídio “vip”, é conhecida por abrigar presos autores de crimes de grande repercussão, além de advogados, policiais e ex-policiais.
A SAP-SP (Secretaria Estadual da Administração Penitenciária de São Paulo), subordinada ao governo João Doria (PSDB), informou à Justiça que Peña “está em ala própria para ex-policiais, com a integridade física garantida, não sendo possível a sua transferência para penitenciária de sua escolha”.
O CDP 3 de Pinheiros é o mais lotado dos 48 Centros de Detenção Provisória do Estado de São Paulo, conforme mostrou reportagem da Ponte no dia 25 de março deste ano. A unidade prisional tem vagas para 572 detentos, mas abriga hoje, segundo dados da SAP, 1.589 presos, o que representa 277% acima da capacidade de ocupação.
Peña divide o xadrez com ao menos outros 50 presos. Geralmente, em cada cela cabem apenas 12. Em relatório recente enviado à SAP, o diretor do CDP 3 de Pinheiros, Roberto Wagner dos Santos Júnior, informou que não há presos com casos confirmados de Covid-19 na unidade.
No documento consta, porém, que no dia 23 de abril o detento Antonio Alves de Paiva, de idade avançada, sentiu febre e foi medicado no Hospital da Lapa. Houve coleta de material biológico, enviado ao Instituto Adolfo Lutz para teste de Coronavírus. O exame não ficou pronto ainda.
Augusto Peña foi medicado no CDP 3 de Pinheiros em 30 de junho de 2019, 27 dias depois de chegar na unidade. No relatório médico é mencionado que ele tem boa aceitação alimentar, pressão arterial de 16 x 9 e frequência cardíaca de 97 batimentos por minuto.
Ele informou ao médico que faz uso de medicação psicotrópica, como Diazepan. Na consulta, foi solicitado para o detento uma avaliação psiquiátrica e prescritos remédios para transtornos de ansiedade e depressão.
Augusto Peña foi preso em 30 de abril de 2008 pelo sequestro de Rodrigo. Em 5 de janeiro de 2010, ele foi solto por determinação da 15ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça.
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Em 7 de abril de 2015, a Vara Criminal de Suzano o condenou a 22 anos de prisão. Ele ficou foragido, mas acabou capturado em 10 de abril do ano passado na cidade de Ibaté, a 270 km da capital paulista.
Em 3 de junho de 2019, Peña foi removido para o CDP 3 de Pinheiros. O ex-policial define a unidade prisional superlotada como “uma espécie de bomba relógio prestes a explodir”.