É preciso entender o papel da instituição policial em uma estratégia de perseguição e opressão de minorias raciais em detrimento de outra, considerada majoritária não pelo quantitativo numérico, mas pela hegemonia política, econômica e simbólica
Algumas vezes, quando escrevemos ou falamos sobre um problema já existente, somos apontados como sendo aqueles que o criaram. Quando é desenvolvido um pensamento e são estabelecidos os conceitos, começam a surgir as acusações. Fica parecendo que não havia qualquer questão até falarmos.
É o caso do racismo no Brasil e sua relação com a segurança pública. Basta citar essa relação (como ouvi recentemente alguém criticando a suposta aleatoriedade das revistas em aeroportos) para alguns dizerem que antes dessa “turma de esquerda” aparecer não havia nada dessa luta de raças que foi criada ou esse “mimimi”. O passo seguinte é citar a lei como fonte de imparcialidade ou mesmo a neutralidade das estatísticas para dizer que os negros são mais abordados ou presos porque cometem mais crimes, desconsiderando não só os processos objetivos de criminalização seletiva, como também aqueles subjetivos, ou seja, a visão estereotipada e muitas vezes despercebida do que é um “criminoso”, geralmente identificado como negro e pobre.
Ninguém precisa ser negro para entender que o Brasil é um país racista. Inúmeras pesquisas de negros e não negros, além dos relatos e testemunhos de quem sofre diariamente, estão aí para mostrar. Pesquisas feitas aqui e no exterior sobre criminalização seletiva, racismo institucional e racismo de Estado dão conta das opressões que atingem as minorias étnicas em vários campos sociais, inclusive na segurança pública.
Essa relação entre racismo e segurança pública fica bem explicitada no excelente documentário “A 13ª Emenda”, que demonstra como o sistema penitenciário dos Estados Unidos, país conhecido como a “terra da liberdade”, é uma continuação do sistema de escravização do negro afro-estadunidense, o que faz da população carcerária daquele país a maior do mundo. Obviamente, a polícia acaba sendo utilizada como ferramenta nessa estratégia.
Por falar em cinema e racismo, lembram do Oscar do ano passado, com poucas indicações de negros? Pois é, depois dos protestos, houve várias indicações para este ano, inclusive com o vencedor de melhor filme, “Moonlight”, sobre um jovem negro gay. Se isso não é de fato uma mudança estrutural de pensamento, é pelo menos o resultado das lutas assimilado pelo mercado capitalista cinematográfico. Que seja, ainda assim é um avanço.
No Brasil, que carrega o peso histórico de ter sido um dos últimos países a abolir a escravidão, não é tão diferente. Apesar da alegação de sermos uma “democracia racial”, sabemos que não é isso que ocorre. Os negros e pobres são os que mais morrem, os que lotam as nossas prisões e que sofrem cotidianamente com o racismo na sociedade, sentido inclusive no tratamento dispensado pelas instituições estatais, entre as quais as de segurança pública.
Afirmar isso, sendo ou não policial, não é chamar os policiais de racistas (até porque a a maioria dos policiais brasileiros faz parte dessas minorias raciais), mas entender o papel da instituição policial em uma estratégia de perseguição e opressão de minorias raciais em detrimento de outra, considerada majoritária não pelo quantitativo numérico, mas pela hegemonia política, econômica e simbólica. Tentar deslegitimar quem afirma isso e luta contra o racismo, como lutam vários negros e não negros, inclusive policiais, é um desserviço à sociedade brasileira.
* Anderson Duarte é policial militar e doutorando em Educação Brasileira pela Universidade Federal do Ceará (UFC)
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