Ryan da Silva Andrade Santos foi baleado em novembro, enquanto brincava em frente de casa. Laudo confirmou que tiro partiu da PM, mas inquérito ainda não foi concluído. ‘O sangue do meu filho está nas mãos de vocês’, diz a mãe

Parentes, amigos militantes de direitos humanos e a mãe do menino Ryan, morto pela PM paulista aos 4 anos, fizeram um ato pedindo justiça em frente à 1ª Delegacia Policial, no centro de Santos, no litoral paulista, no final da tarde desta sexta-feira (7/2). Apesar do número reduzido de manifestantes, nas quadras ao redor da delegacia, o fotógrafo e colaborador da Ponte Ailton Martins viu diversas viaturas e agentes portando metralhadoras e fuzis.
A cozinheira escolar Beatriz da Silva Rosa, de 29 anos, tem ensaiado o que dirá aos algozes do filho Ryan da Silva Andrade Santos, de 4 anos, caso consiga levá-los a júri popular. “O sangue do meu filho está nas mãos de vocês e eu vim buscar justiça”, é o que planeja falar. O problema é que, até agora, três meses após a morte do meninto, sequer foi concluído o inquérito policial. A investigação conduzida pelo Departamento Estadual de Investigações Criminais (DEIC) de Santos é o primeiro passo para buscar a responsabilização de quem matou Ryan.
Leia também: Em dez meses, Beatriz perdeu o marido e o filho de 4 anos para a polícia de Tarcísio
Beatriz convocou o protesto para pedir agilidade na apuração. “Por que esse descaso com uma criança? Nós estamos falando de uma criança de 4 anos”, diz, indignada.
No dia 5 de novembro do ano passado, Ryan foi morto enquanto brincava com outras 15 crianças perto da casa onde morava, no Morro São Bento, em Santos. A criança levou um tiro na barriga durante uma ação policial que também matou Gregory Ribeiro Vasconcelos, 17.
Leia também: PMs mataram jovem cego para vingar morte de colega, diz MP
O inquérito policial tramita em sigilo. Em dezembro, O GLOBO revelou que o tiro que matou Ryan partiu da arma de um policial. O laudo balístico mostrou que o disparo saiu de uma espingarda Benelli M3, calibre 12. O armamento era usado naquele dia pelo cabo da PM Clovis Damasceno de Carvalho Junior.
A informação de que o tiro teria partido de um policial já havia sido ventilada pelo coronel Emerson Massera, porta-voz da PM de São Paulo, durante entrevista coletiva um dia após a morte. “Pela dinâmica da ocorrência, nós temos que, provavelmente, o disparo que atingiu o menino partiu de uma arma de um policial militar. O projétil ficou alojado, nós teremos agora condições de fazer o confronto balístico e, com o resultado da perícia, nós podemos ter essa conclusão 100%. Mas, tudo indica, pela dinâmica da ocorrência e pela forma como o cenário se dispôs, esse disparo provavelmente partiu da arma de um policial”, admitiu Massera, já no dia 6 de novembro.
O adeus mais duro
O ano de 2024 foi de tragédia para Beatriz. Em fevereiro, ela perdeu o companheiro Leonel Andrade Santos, 36, uma das 56 vítimas da Operação Verão. Leonel foi morto ao lado do amigo de infância Jefferson Ramos Miranda, 37, no mesmo Morro São Bento. A investigação sobre a morte da dupla foi arquivada sob alegação de que os PMs agiram em legítima defesa.
Assine a Newsletter da Ponte! É de graça
Não deu tempo de Beatriz se recuperar do luto. “Perder o Ryan foi o adeus mais duro que tive que dar”, conta ela, emocionada. A criança foi velada e sepultada no Cemitério da Areia Branca em meio à presença policial na porta do local. Beatriz passou o enterro em uma cadeira de rodas, amparada a todo momento por amigos e familiares.
O que diz a SSP-SP
A Ponte procurou a Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP) questionando sobre a demora na conclusão do inquérito policial e também sobre o andamento do Inquérito Policial Militar.
Em nota, a SSP-SP limitou-se a dizer que os PMs envolvidos seguem afastados das atividades operacionais. “O caso é investigado, sob segredo de Justiça, pela DEIC de Santos. Por parte da Polícia Militar, as duas mortes foram apuradas por meio de Inquérito Policial Militar, já relatado à Justiça Militar. Os agentes envolvidos na ocorrência permanecem afastados das atividades operacionais”, diz o texto.
A reportagem também procurou o Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) sobre apurações próprias a respeito da morte de Ryan. Não houve retorno. Caso haja, esse texto será atualizado.