Segundo parentes que permanecem em frente ao presídio, tropa esperou saída de advogados, da Defensoria Pública e da imprensa para agir; gritos pedindo socorro foram ouvidos do lado de fora
Parentes de presos da Penitenciária de Lucélia, distante 600 km de São Paulo, afirmam que o GIR (Grupo de Intervenção Rápida) entrou no presídio mesmo após o fim da rebelião ocorrida entre as 14h de quinta-feira (26/4) e o início da tarde desta sexta. É possível ouvir sons de disparos e bombas em áudios enviados pelos familiares à reportagem da Ponte. A “virada” do presídio durou 22 horas, com três defensores públicos feitos refens.
De acordo com eles, a tropa entrou na cadeia por volta de 16h, quando boa parte das pessoas já tinham saído do local, entre advogados, defensores públicos e a imprensa. A Ponte ouviu dois familiares e recebeu inúmeros áudios relatando os gritos de “socorro” e “não mata a gente” vindos de dentro do presídio. Por volta de 12h, o último dos três defensores foi liberado pelos presos e a SAP (Secretaria da Administração Penitenciária) decretou o fim da rebelião.
“Eles entraram quando todo mundo saiu. Não quero a liberdade do meu marido, quero o que a lei oferece, só. Em Lucélia, nunca ofereceram isso”, explica a promotora de vendas Bianca Sales, de 27 anos, mulher de um detento, confirmando ter visto a entrada do GIR no local. “Não tem necessidade de bater, eles já tinham se entregado, se rendido. Não sei o que [os agentes penitenciários] estão fazendo lá. Coisa boa não é”, diz.
Outra familiar que segue em frente ao presídio de Lucélia deu detalhes da ação. “Entregaram os reféns, os advogados foram embora e a tropa invadiu. Ouvimos bomba, tiro… O Águia [helicóptero da PM] está no alto, a gente continua na porta da cadeia e o pior: estão rendidos, apanhando e gritando “cadê os direitos humanos?'”, relata. “A gente só escuta tiro, bomba e vê fumaça subindo. Tem viatura subindo toda a hora e mais tiros”, diz outra.
“Quando o GIR entra, aí que a coisa ferve. Liguei na cadeia no começo da tarde, a funcionária disse que estava tudo tranquilo, sossegado, nem o GIR nem o Choque tinham entrado e os presos não seriam transferidos hoje. Agora, recebemos esses áudios de quem está lá na porta. Se o GIR ficar lá, vão ser torturados”, explica outra parente, que pediu para não ser identificada.
Há relatos de viaturas saindo de Lucélia com presos para serem transferidos. “O prédio está sem energia, eles estão sem comer e sem água desde o meio-dia de ontem. Se o GIR entrou, aí coloca pânico nos meninos mesmo. Tinha mais de 30 presos feridos”, segue.
Os motivos da rebelião seriam a superlotação do presídio, a falta de comida para todos os presos e tratamento médico precário. Além de não terem atendimentos, os presos não tinham acesso a medicamentos, seja fornecidos pela direção ou pelos parentes – sob o argumento dos diretores de que não seria possível confirmar se os itens seriam, de fato, remédios.
A Ponte entrou em contato com a assessoria de imprensa da SAP (Secretaria da Administração Penitenciária) por telefone, às 18h desta sexta-feira e a resposta era de que não houve ação do GIR antes ou depois da rebelião e mantinha o posicionamento oficial anterior, divulgado às 16h47.
“Ressalvamos que não houve a necessidade da atuação do Grupo de Intervenção Rápida na unidade. Os danos à penitenciária e o número de presos feridos ocasionados pelo ato ainda estão sendo levantados”, sustentou a pasta, informando que as visitas aos parentes neste final de semana estão suspensas “a fim de garantir a segurança de visitantes e funcionários”.