Fundação Casa: 50% das unidades na Grande SP estão superlotadas

    Estreitar laços com as prefeituras para reduzir quantidade de internos na Fundação Casa, estimulando cumprimento de medidas socioeducativas em liberdade, é uma das apostas do novo presidente da instituição

    Menores infratores assistem a aula em uma das salas da unidade Juquiá, no Complexo Brás I Foto: Carla Carniel/Destak

    Dados recebidos pelo Destak via Lei de Acesso à Informação mostram que metade das unidades da Fundação Casa na Grande São Paulo sofre com a superlotação. De 58 locais espalhados pela capital, ABC, Osasco e Franco da Rocha, 29 operavam no final do mês de junho acima de suas capacidades.

    A unidade com maior índice de ocupação é a Casa Paulista, no bairro da Vila Maria, na zona norte, que pode atender até 45 internos, mas abriga 68, segundo o relatório enviado ao Destak.

    Entre os outros prédios com índice de ocupação acima de 100% está a Casa Feminina Parada de Taipas, no extremo norte, com 125% da capacidade (50 internas para 40 vagas). Essa unidade foi tema de reportagem na Ponte Jornalismo, que divulgou denúncia feita pelas mães das adolescentes, de que maus tratos teriam ocorrido em novembro do ano passado.

    A fundação trabalha com a oferta entre 40 a 170 ocupações, dependendo do tamanho do imóvel.
    A quantidade é bem inferior ao que se tinha no final dos anos 1990, quando a instituição ainda se chamava Febem (Fundação para o Bem Estar do Menor) e chegou a possuir complexos com mais de mil jovens, como os centros Imigrantes e Tatuapé.

    Atualmente, cerca de 9 mil adolescentes cumprem medidas socioeducativas em 146 unidades pelo Estado. Elas são divididas em centros de acolhida inicial, internação provisória – até 45 dias -, e regime de internação, que pode durar até três anos.

    Às vésperas da publicação da reportagem, durante visita do Destak ao Complexo Brás, no centro, na última sexta-feira (14), a Fundação Casa apresentou novos números, alegando que, em menos de 20 dias, houve redução da superlotação em 18 unidades.

    “A superlotação é quando você tem uma unidade para 100 e você tem 200. Na fundação você tem seis, sete menores a mais. Isso é um excesso e não uma superlotação”, afirmou a assessoria de imprensa do órgão.

    O promotor da Infância e Juventude Tiago de Toledo afirmou que uma ação civil pública aberta em 2014 acompanha de perto a falta de vagas e que o procedimento está sob análise da Justiça.
    “Na verdade o que precisa é a abertura de novas vagas. O governo fala que não tem condições de fazer, que não dispõe de orçamento. As consequências são nefastas. Aumento da violência, prejuízo para reeducação, piora na relação entre internos e servidores”.

    Fundação Casa quer auxílio de cidades para reduzir internações

    Quartos possuem cadeados na porta, sendo único lugar fechado do local I Foto: Carla Carniel/Destak

    Na tentativa de reduzir a quantidade de crianças e adolescentes entre 12 e 17 anos encaminhados para internação, o presidente da Fundação Casa, Márcio Elias Rosa, pretende intensificar os encontros com as prefeituras para que mais jovens possam cumprir medidas socioeducativas em liberdade. Desde 2010, os municípios são os responsáveis pela execução das medidas, como liberdade assistida e cursos profissionalizantes.

    A Fundação Casa entende que parte dos 9,1 mil garotos e garotas que estão sob tutela poderiam cumprir medida socioeducativa em meio aberto se as prefeituras cumprissem as obrigações e oferecessem vagas.
    Ao Destak, funcionários da fundação afirmaram que a internação deveria ser a última alternativa para o menor, mas que ela tem sido a primeira em alguns casos, o que provoca superlotação em algumas unidades.
    “[Vamos trabalhar] para que os municípios consigam fazer isso, como liberdade assistida, prestação de serviços à comunidade, valorizar a aplicação e execução das medidas cumpridas sem a restrição à liberdade, afirmou Rosa.

    O coordenador da Comissão da Criança e do Adolescente do Condepe (Conselho Estadual de Direitos Humanos), Ariel de Castro Alves, concorda com a medida. “O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê que as prefeituras, com o apoio do Estado, devem criar unidades de atendimento inicial para adolescentes apreendidos”.

    O novo presidente da Fundação Casa, Márcio Elias Rosa, acredita que, com isso, a quebra de vínculo, muito comum em privados de liberdade, será evitada. “A prestação de serviço à comunidade é algo que tende a dar um grande resultado. Capacitar o adolescente, conservar o vínculo familiar e social”, concluiu Rosa.

    Unidade no Brás aposta em atividades para evitar tumultos

    O Destak visitou por 3 horas, na tarde da última sexta-feira, as dependências da Casa Juquiá, uma das seis unidades na rua Coronel Mursa, que formam o Complexo Brás, na região central.

    No dia da visita, o local contava com 134 adolescentes primários; a capacidade é para 170 meninos.
    Os internos estavam distribuídos em salas de aula, sempre com um professor acompanhado por um segurança sentado junto aos alunos, e em práticas esportivas.

    A diretora da Juquiá, Kelly Fonseca, disse que aposta nas ações para não haver problemas, que, segundo ela, não são registrados há anos. “Aqui tem atividade até às 21h, na hora de dormir. Não pode haver ociosidade”, afirmou.

    A reportagem notou que os meninos andam de cabeça baixa e mãos para trás, como se estivessem algemados. “A fundação diz que faz parte das normas disciplinares, mas entendo ser um regime de servidão, incompatível com caráter de inclusão social das medidas socioeducativas”, disse o coordenador do Condepe,  Ariel de Castro Alves.

    *Reportagem originalmente publicada no jornal Destak

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