Dois meses após soldado Gilberto Eric Rodrigues fugir de presídio, serviço de informações do governo ainda informava que ele estava preso
O PM Gilberto Eric Rodrigues é um dos investigados pela chacina que deixou 7 mortos no Jardim Rosana, zona sul de SP, em 2013. Ele fugiu da prisão militar de SP | ReproduçãoO soldado Gilberto Eric Rodrigues, um dos policias militares acusados de matar sete pessoas em uma chacina ocorrida no Jardim Rosana, periferia da zona sul de São Paulo, em 2013, fugiu do Presídio Militar Romão Gomes (PMRG) em 1 de abril deste ano e até hoje não foi recapturado. Mas a Polícia Militar do Estado de São Paulo age como se não soubesse disso. Em 1º de junho, a PM informou, por meio do Sistema Integrado de Informações ao Cidadão (SIC) do governo paulista, que o soldado continuava detido no presídio.
A informação falsa, assinada pelo primeiro-tenente Ferreira, da diretoria de pessoal da PM, foi enviada em resposta a uma solicitação, feita por meio da Lei de Acesso a Informação, em que a Ponte Jornalismo perguntava “onde estão lotados atualmente” dez policiais suspeitos de participação na chacina do Jardim Rosana.
Inicialmente a PM negou-se a responder, alegando que os dados eram “informações pessoais”. Mas a Ponte entrou com um recurso e obteve os dados – inclusive a informação de que Eric continuava no PMRG, dois meses após ter fugido.
A história do soldado que fugiu, mas que para a PM continua no presídio, faz parte do estudo Informação Encarcerada: A Blindagem de Dados na Segurança Pública de São Paulo, feito pela Ponte Jornalismo a pedido da ONG Artigo 19. Lançado na semana passada, o estudo analisou o comportamento dos órgãos de segurança pública diante dos pedidos feitos via Lei de Acesso à Informação e concluiu que o governo paulista vem descumprindo a legislação e escondendo informações da população.
Na fuga do Romão Gomes, Gilberto deixou o presídio junto com o ex-PM Flavio Armando Pitta Mourinho – preso em 2013 pela acusação de matar um homem com 14 tiros em Amparo, no interior de São Paulo, um ano antes. A fuga foi no início da noite de 1º de abril deste ano, quando o presídio fez a sua segunda contagem diária dos detentos (a primeira é feita pela manhã).
A Polícia Militar de São Paulo demorou 12 dias para comunicar oficialmente a Polícia Civil sobre a fuga dos dois militares. Nesse período, os dados pessoais e as fotografias dos foragidos não foram inseridas nos bancos de dados de procurados do Estado de São Paulo. Somente em 13 de abril, um cabo do Presídio Militar Romão Gomes foi ao 20º Distrito Policial (Água Fria), localizado na mesma avenida que a cadeia, para informar sobre os fujões.
Os militares omitiram um fato relevante sobre a fuga ao informarem a Polícia Civil: um telefone celular foi encontrado ao lado da cerca por onde os PMs Gilberto e Flavio passaram para acessar a mata que cerca o presídio militar. O aparelho foi abandonado ao lado dos crachás e das roupas e botas plásticas dos dois. O registro do encontro do celular ficou restrito aos militares que apuraram a fuga.
O encontro do celular indica que o aparelho foi utilizado pelos policiais Gilberto e Flavio dentro do presídio militar para orquestrarem a escapada, um tipo de ação bastante comum nas demais prisões paulistas, onde a facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) usa celulares para combinar crimes nas ruas. A perícia realizada pela investigação da PM no celular não encontrou pistas que pudessem ajudar a desvendar a fuga dos dois PMs.
No Romão Gomes, apesar de estar preso sob suspeita de participar da chacina que deixou sete mortos no Jardim Rosana, Gilberto trabalhava no setor de jardinagem do presídio. O cartão de registro de horário de Gilberto e de Flavio foram registrados por outros militares presos no fim da tarde do dia 1º de abril, quando todos os detentos retornam para as alas das celas da cadeia.
Foi a terceira fuga ocorrida no presídio, que é reservado a policiais. A escapada anterior havia ocorrido em 2010.
Outro lado
Nesta semana, a reportagem enviou um pedido de esclarecimentos sobre a mentira envolvendo o PM Gilberto Eric Rodrigues:
Em 1º de junho, a PM informou, por meio do Sistema Integrado de Informações ao Cidadão (SIC), que o soldado Gilberto Eric Rodrigues, um dos policias militares acusados de matar sete pessoas em uma chacina no Jardim Rosana, estava no Presídio Romão Gomes (podem conferir no site http://www.sic.sp.gov.br/). A informação era falsa: naquela altura, Gilberto havia fugido há quase dois meses. Pergunto: por que a PM passou uma informação falsa?
A resposta da Polícia Militar do Estado de São Paulo:
“A Polícia Militar informa que o pedido feito via Lei de Acesso perguntava onde o policial militar estava lotado, ou seja, sua vinculação funcional. Por esse motivo, foi comunicado que estava lotado no Presídio Militar Romão Gomes, respondendo exatamente ao que foi questionado.”
Neste mês, a investigação sobre as fugas no Presídio Militar Romão Gomes foi arquivada, sem a conclusão de que os militares responsáveis pelas guardas dos presos tiveram participação no caso.
Vista da mata por onde os PMs fugiram do Presídio Militar Romão Gomes | Reprodução A Polícia Militar de SP demorou 12 dias para registrar oficialmente na Polícia Civil a fuga dos dois PMs | Reprodução Registro da fuga dos militares não informou à Polícia Civil sobre o encontro de um telefone celular que deve ter sido usado para planejar escapada | Reprodução