Em manifestação neste domingo (4/6), centenas subiram até o ponto mais alto da cidade de São Paulo para protestar contra lei aprovada na Câmara que prejudica povos originários
Neste início de manhã de domingo (4/6), centenas de pessoas se concentroram na Terra Indígena do Jaraguá, localizada na Zona Norte de São Paulo. Ao longo do dia, o grupo, que foi aumentando, realizou uma manifestação contra o PL (Projeto de Lei) do Marco Temporal, subindo o Pico do Jaraguá, o ponto mais alto da capital paulista.
O PL propõe que apenas terras indígenas ocupadas antes da promulgação da atual constituição brasileira, 5 de outubro de 1988, possam ser demarcadas como terras indígenas. A tese é defendida pela bancada ruralista no Congresso Nacional, e seu efeito prático pode levar a despejos e tornar muito mais difícil a povos originários conseguir seus direitos sobre a terra.
Ele foi aprovado na Câmara dos Deputados na última terça-feira (30/5), e agora se encontra no Senado. Nesta semana, o Supremo Tribunal Federal deve também avaliar sua constitucionalidade, que é contestada.
Viaturas da PM foram posicionadas na Rodovia dos Bandeirantes, no Jaraguá, para agir caso manifestantes seguissem do território indígena para ocupar a via. Uma decisão judicial no último sábado (3/6) proibiu que a manifestação bloqueasse a via.
Ainda na concentração, lideranças indígenas receberam políticos do Poder Legislativo, advogados e representantes da Polícia Militar para pedir o fim da violência contra os povos originários e a demarcação do território. Além disso, os indígenas gostariam de dar continuidade à manifestação iniciada na última terça-feira, que seria marcada por uma reza na Rodovia dos Bandeirantes, mas foi interrompida pela violência policial.
Entre as autoridades também estava o ouvidor das polícias de SP, Cláudio da Silva, que conversou com a liderança indígena Karai Djekupe e se comprometeu a mediar o diálogo entre manifestantes e Polícia Militar. Cláudio afirmou que o objetivo foi que os povos originários não sofram novamente violência da PM, como aconteceu em outro protesto, no dia da votação.
Durante a reunião entre as lideranças indígenas e as autoridades, que durou cerca de duas horas, ficou decidido que o grupo não ocuparia a rodovia que fica à margem do território. No entanto, seria feita uma caminhada da comunidade até o pico do Jaraguá, que fica em frente.
Na reunião, o coronel da Polícia Militar de São Paulo Forner, comandante do policiamento da região oeste, chegou a colocar em dúvida a ação violenta da polícia na última terça, dizendo que “se houve granada jogada na aldeia, não vai mais ocorrer”. Ativistas que acompanhavam a reunião manifestaram sobre a fala do PM, que em seguida recuou e assumiu o compromisso de “não mais permitir nenhum ato de racismo, violência e preconceito contra o povo da comunidade indígena”.
Após a fala do coronel, diversos parlamentares que participaram da reunião tiveram a oportunidade de falar também. Em uma das intervenções, a vereadora Luana Alves (PSOL), usou a fala do policial para dizer que, além de começar agir de forma diferente no território indígena, como prometido pelo comandante da PM na região, é necessário que os responsáveis pela ação violenta na região sejam identificados e responsabilizados.
Além dos registros de violência após a manifestação indígena na terça-feira, moradores da comunidade relataram que policiais militares foram ao território no sábado para comunicar, de forma irregular, que a Justiça havia proibido o grupo de ocupar a rodovia e, portanto, a PM iria impedi-los. Além de não ter sido cumprido o procedimento correto de uma notificação judicial, indígenas relataram temor pelo fato dos policiais terem ido ao local portando armas de grosso calibre.
A reunião, que foi entendida pelas lideranças indígenas como uma abertura de diálogo para fortalecer a resistência do povo originário no território, serviu como uma medida paliativa para os manifestantes. No entanto, Karai Djekupe ressaltou que o desejo dos guaranis em retomar a reza na Rodovia dos Bandeirantes ainda será realizado.
“Estão sendo lesados porque não estávamos de camiseta verde e amarela?”, provocou, diante da PM, Djekupe. “Porque não estávamos em cima de motos? Porque não gastamos dinheiro público? Porque não somos brancos? É por isso? A violência, o racismo, é antes de mais nada institucional. Ele é provocado.”
Com mais pessoas se juntando ao longo da manhã, por volta das 12h, os manifestantes iniciaram a caminhada rumo ao Pico do Jaraguá. A subida pela estrada sinuosa que leva ao topo do Parque Estadual do Jaraguá, que tem extensão de 5 km, foi percorrida pelos manifestantes, puxados por indígenas que faziam cantos e orações tradicionais, levou cerca de duas horas.
Chegando ao topo, por volta das 14h, o protesto aconteceu foi realizado à base do cume da montanha. O povo originário, novamente, fez uma reza tradicional e, após algumas falas, o ato se encerrou por volta das 16h. A manifestação aconteceu toda de forma pacífica.