Cerca de 500 pessoas interditaram a Avenida Paulista por mais de 4 horas para exaltar regime ditatorial e cobrar nova intervenção das forças armadas
“Nós não temos medo de ninguém e de nada porque nós temos Deus conosco. Nós somos da milícia dos anjos celestiais, soldados de Cristo. Este país sempre será cristão”. As falas são do padre Carlos Maria em cima de um caminhão de som, ditas a um público de 500 pessoas no Vão do Masp, na Avenida Paulista, em São Paulo, seguida das rezas de um Pai Nosso e de uma Ave Maria. A exaltação na tarde de sábado (31/3) era ao golpe militar.
Vestido de verde, amarelo e fardas, o grupo comemorava os 54 anos do início da ditadura. Mais: cobravam uma nova intervenção militar das forças armadas. “Não devemos tolerar eleições nesse país. As urnas são fraudáveis, existe uma corja de políticos e não devemos acreditar neles!”, esbravejava no microfone um dos homens, com a Paulista já fechada pelos manifestantes.
Acima de tudo, o ato, chamado de pacífico pela organização, tinha como objetivo exaltar a ação do Exército em 31 de março de 1964. Naquela noite e pela madrugada para o dia primeiro de abril, tropas destituíram o então presidente João Goulart. Assumindo o poder, os militares mantiveram o país em ditadura por 21 anos com restrições aos direitos humanos de torturas físicas e psicológicas.
“Travamos uma guerra espiritual, Jesus é o nosso general”, “Nossa bandeira nunca será vermelha!”, “O STF (Superior Tribunal Federal) é formado por advogados do PCC (Primeiro Comando da Capital)” e “Fora Temer” estiveram entre os gritos. Ao menos duas pessoas foram agredidas enquanto passavam pelo local: um morador de rua, perseguido posteriormente pelos seguranças. Os chamados paraquedistas são ex-militares do Exército e, segundo eles, trabalhavam gratuitamente em apoio ao movimento – vieram do Rio de Janeiro, junto de dois ônibus com os intervencionistas. Uma moça chamou o grupo de facista, recebeu cusparadas e agressões. Após acinar a PM, apontou que os policias “fizeram corpo mole” para evitar os socos e chutes.
Sobraram exaltações de figuras, caso de Antonio Hamilton Martins Mourão, o General Mourão. Mourão ganhou notoriedade dos apoiadores de um novo golpe militar por suas posições contrárias à política. Em 28 de fevereiro, virou militar da reserva e, em sua saída oficial, exaltou o torturaror Carlos Alberto Brilhante Ustra (ex-chefe do DOI-CODI, principal local de tortura no Regime) e prometeu apoio à candidatura de jair Bolsonaro à presidência.
O general era posto como um dos organizadores da comemoração na Paulista, mas não esteve no local. Acabou representado por um grande bonecão inflável. Em seu lugar, o também general Paulo Assis representou as Forças Armadas no caminhão. Um esquema com 20 paraquedistas escoltou o militar do hotel Tivoli, na Alameda Santos, até o Masp. Junto, o político Levy Fidelix também fez o trajeto e subiu no carro de som. Ele teve apoio de 446.878 brasileiros na eleição presidencial de 2014, cerca de 0,4% dos votos. Na campanha, ficou reconhecido por declarar que “aparelho excretor não reproduz”, se referindo à população LGBT.
Provocações, tensão e ovadas
Eram dois os pontos de concentração do grupo na Paulista: além do Masp, um ato menor acontecia cerca de 500 metros distante, na esquina da avenida com a Alameda Campinas. Ali, aproximadamente 25 antifacistas, movimento contrário à intervenção, se reuniu em um contra-ato, vigiado por policiais militares que protegiam o caminhão de som. Uma série de provocações acontecia de parte a parte com os PMs no meio.
Em determinado momento, um homem de aproximadamente 30 anos do grupo intervencionista lançou ovos nos antifacistas e, identificado pelo comandante da tropa, acabou apenas questionado. “Não vi se foi ele quem jogou”, respondeu o policial, questionado pela reportagem, logo após dizer ao manifestante “eu vi, para de provocar”.