‘O giro da periferia’ conta histórias de cinco empreendedores do bairro, localizado no sul da cidade, e detalha as dificuldades e vitórias de quem investiu na própria quebrada
Quando Ana Beatriz Felicio, de 22 anos, Miréia Lima, 24, e Wallace Leray, 22, sentaram para definir o tema do TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) de jornalismo, na Faculdade Rio Branco, sabiam que duas coisas já estavam certas: falariam sobre as periferias de São Paulo e escolheriam algo que pudesse ir além dos muros da faculdade. A ideia de falar sobre empreendedores do Grajaú, bairro na zona sul da capital paulista, surgiu depois de muita conversa.
Os jovens jornalistas, moradores de Carapicuíba (Grande São Paulo), Jaraguá (zona oeste) e do próprio Grajaú (zona sul), respectivamente, são correspondentes da Agência Mural de Jornalismo das Periferias. Em entrevista à Ponte, o trio conta que a decisão pelo bairro foi unânime. “Escolhemos o Grajaú pela relevância que o bairro tem e por ser o distrito mais populoso, por ser um dos maiores, por onde gira muito dinheiro e fora que tem o fato de eu morar lá”, explica Wallace.
Ana Beatriz e Miréia contam que a dinâmica do Grajaú é bem diferente do bairro delas. Ana brinca que em Carapicuíba não existem nem se quer padarias, enquanto Miréia relembra a surpresa que foi ver um bairro tão comercial quando foi ao local escolhido como foco do trabalho pela primeira vez.
“Quando eu fui na casa do Wallace, falei assim: ‘você não mora na periferia coisa nenhuma’. Só sabia que era periferia porque demorei duas horas para chegar. Lá onde ele mora tem tudo. Mas também tem muito contraste se a gente pega a Ilha do Bororé [bairro do distrito do Grajaú], por exemplo”, brinca Ana Beatriz.
Para Wallace, o bairro tem uma potência muito grande e que nunca teve dificuldade para fazer compras na região. “É, tem isso: em algumas partes do Grajaú faltam coisas. O pessoal chama de fundos. Mas a parte do centro é bem mais desenvolvida do que outras periferias. As periferias são diferentes e, dentro das periferias, têm coisas diferentes. Tem favela dentro das periferias, por isso é muito complexo para quem é de fora entender”, complementa Leray.
Assim nascia o Giro da periferia, projeto audiovisual que contou a história de cinco empreendedores do Grajaú: Barbearia Canto da Arte, Graja Beer, Queijaria na Quebrada, Pantcho’s House e Oasys Hair. A princípio, o grupo queria entrevistar ao menos 11 estabelecimentos, mas diante das dificuldades fecharam em 7 episódios. Além do webdocumentário, o projeto conta com um site de apoio e, além das entrevistas com os empreendedores, foram feitos um episódio sobre a história do Grajaú e outro sobre empreendedorismo.
Produção do webdocumentário
Achar as fontes não foi uma tarefa fácil, mas o grupo aprovou o resultado do projeto, principalmente por causa da diversidade entre os empreendimentos. Ana Beatriz acredita que é importante lembrar que algumas fontes desistiram de última hora e não quiseram mais gravar com o grupo com medo da exposição.
“Eu estagiei no Sebrae por dois anos, na parte de comunicação da assessoria de imprensa, então eu meio que já fazia esse corre com empreendedores. Então eu já tinha ideia das fontes. A primeira fonte, que foi a hamburgueria Pantcho’s, já tinha falado antes com eles porque eu já tinha feito uma matéria deles no Sebrae, e a Barbearia Canto da Arte também veio por este caminho, explica Wallace.
“O Graja Beer, por exemplo, a gente conheceu quando foi gravar no Pantcho’s. Vimos uma graja beer, e aí a Regiane, uma das donas da hamburgueria, nos passou o contato deles”, completa Ana Beatriz.
Uma das dificuldades enfrentadas pelo grupo foi acessar as fontes chamadas de oficiais, como especialistas, arquitetos e historiadores. Para isso, eles recorrem às redes sociais ou às assessorias de imprensa. “Eu já trabalhei em TV, então tinha uma rede de assessorias. Só que, quando eu falava que era para o TCC, elas negavam as entrevistas. Quando a gente ligava direto para a fonte, dava certo”, explica Ana Beatriz.
Todas as partes do projeto foram feitas em parceria pelos três, desde as gravações até as edições e o fechamento do conteúdo escrito. A rotina de gravação foi mais complicada para Ana Beatriz e Miréia, pois, além de conciliar o TCC com a vida profissional, precisavam se deslocar por um trajeto de mais de duas horas para realizar as gravações. Elas contam que foi um período muito tenso e com muitas discussões.
Para amenizar o clima, decidiram revezar: um final de semana para cada. Por morar na região, Wallace participou de todas as gravações. “Já teve vezes que não conseguimos gravar porque eu demorei mais de três horas pra chegar”, relembra Ana Beatriz.
Os planos para o futuro
Durante a apresentação do projeto, o grupo recebeu a primeira boa notícia. Ela veio de Anderson Meneses, codiretor executivo da Agência Mural, que fez parte da banca de avaliação do TCC: o veículo tem interesse para investir no projeto em 2019. O grupo brinca que estava ensaiando para oferecer o projeto para a Mural.
“O Anderson contou que conversou com a Izabela Moi, que é outra codiretora, e eles pretendem levar o nosso projeto para dentro da Mural. O mais legal disso tudo é que a gente gosta de fazer, queremos levar o nosso trabalho e a cultura periférica para outros locais”, conta Wallace.
No site criado pelo grupo, já é possível contar a sua história como empreendedores na periferia.