Evento foi realizado pelo Centro de Direitos Humanos e Educação Popular do Campo Limpo durante os dias 28 e 30 de novembro; importância do diálogo na resolução de conflitos pautou as discussões
O CDHEP (Centro de Direitos Humanos e Educação Popular do Campo Limpo) realizou o Fórum de Justiça Restaurativa Comunitária no Brasil durante os dias 28 e 30 de novembro. De acordo com Mariana Marques, uma das coordenadoras do centro, um dos objetivos do evento era mapear práticas que acontecem fora do judiciário e que estão enraizadas nos processos comunitários. Segundo ela, essas diversas experiências são importantes para que o tema seja debatido.
“Tudo bem o judiciário fazer as práticas que ele faz, mas existe uma história que ainda está por ser narrada, a da justiça comunitária no Brasil, que é feita, por exemplo, por centros como o nosso”, afirma Mariana dizendo que essas práticas restaurativas estão diretamente coladas ao discurso e práticas dos direitos humanos.
Mas afinal, o que é justiça restaurativa? É basicamente optar pelo diálogo, compreensão e mudança em detrimento do punitivismo, que encarcera, subjuga e segrega. A ideia desse tipo de prática é buscar a solução de um conflito, de qualquer natureza, a partir da escuta empática e sensível das pessoas atingidas pelo problema. Ou seja, hipoteticamente em um caso de agressão, a ideia é colocar vítima e agressor frente a frente para, conjuntamente, tentarem encontrar um caminho para a reparação do dano. É justamente por causa dessa prática que os círculos de debate foram feitos durante todo o evento, onde cada participante contava suas experiências e, dessa conversa, saíam soluções pensadas conjuntamente.
Para discutir esses temas, o centro trouxe algumas iniciativas que estão ligadas à justiça comunitária. Além disso, trabalhou com questões culturais, trazendo manifestações importantes para discutir o que o Brasil tem de próprio e identitário, outro objetivo do encontro. O primeiro dia do evento contou, por exemplo, com uma noite cultural que teve samba de roda e outras manifestações tradicionais e características de determinados territórios.
O segundo dia de evento teve a presença de Maria Sylvia de Oliveira, do Instituto Geledés, e de Nirson Medeiros da Silva Neto, do programa de pós-graduação em Ciências da Sociedade da Universidade Federal do Oeste do Pará. Durante suas falas, eles debateram sobre o identitário das mulheres negras, a política de encarceramento e o genocídio do povo negro. No último levantamento do Infopen (Departamento Penitenciário Nacional), a população prisional formada por mais de 720 mil pessoas era composta por 64% de negros. Ao mesmo tempo, o Atlas da Violência 2018 apontou que um negro tem 2,5 vezes mais chance de ser morto no país do que um branco. A taxa de mortalidade violenta de negros é de 40,2 por 100 mil habitantes
Nesta sexta-feira (30/11), o tema debatido foi a violação dos direitos humanos na conjuntura atual do Brasil. Alguns temas apresentados foram a desigualdade e um panorama econômico do que está por vir com o governo do presidente eleito Jair Bolsonaro.
Depois de os temas serem apresentados e debatidos, foi pedido que os participantes do evento se sentassem em grupos e tentassem responder a seguinte questão: “Como esse cenário de desigualdades e violação de direitos humanos desafio a justiça restaurativa comunitária?”. As respostas foram as mais diversas possíveis, mas focaram, em sua maioria, em um maior diálogo e autocuidado.
Essa ideia, inclusive, foi usada dentro do próprio evento, que foi todo tratado com muito debate e escuta. Segundo a coordenadora Mariana Marques, esses processos circulares são fundamentais para a metodologia do evento. Ela afirma acreditar que essas conversas próximas trazem a subjetividade que é capaz de conectar as pessoas. “O círculo é um processo que tira a figura da liderança. O centro do círculo é o centro”, brinca.