Críticas pela venda do modelo, que custava R$ 96, fez loja reconhecer o erro em nota divulgada no Facebook e retirar produto das prateleiras
Uma camiseta branca com logo azul da antiga Febem-SP (Fundação Estadual do Bem-estar do Menor), para a internação de adolescentes em conflito com a lei, exposta nas prateleiras da loja AMPamulherdopadre, em São Paulo, gerou indignação nas redes sociais. Internautas questionaram a empresa pela escolha do modelo, vendido a R$ 96, e conseguiram a retirada do modelo das vendas.
“É impressionante como não há limites para fetichização das elites com a desgraça dos povos oprimidos. Assim como o Restaurante Senzala, que zomba da escravidão, a AMPamulherdopadre brinca com a dor de milhões de jovens que um dia foram encarcerados e torturados dentro desta instituição”, escreveu o jornalista Igor Carvalho, junto de uma foto da camiseta publicada em suas redes sociais, no domingo (28/1). Até a publicação desta reportagem, a postagem tinha mais de quase 2 mil compartilhamentos, pouco mais de 700 comentários e mais de 3,5 mil reações no Facebook.
O post, então, virou palco de discussões com pessoas criticando a decisão “infeliz” da marca em se “aproveitar da desgraça dos pobres” e quem considerava “problematização com tudo” ou “mimimi” a venda da camiseta com o logo da Febem.
No mesmo dia, a marca AMP publicou uma nota com pedido de desculpas em seu perfil no Fabebook: “A AMP vem se desculpar pela inclusão de uma camiseta com logo da extinta Febem na sua linha LOST&FOUND. A LOST&FOUND é uma marca de camisetas de uniformes de companhias aéreas, instituições, concertos musicais e muitas outras que remetem a um passado distante. Consideramos que foi um erro a colocação de uma marca como a da Febem nessa linha, retiramos as camisetas imediatamente das lojas, e pedimos desculpas a todos”, explicou a empresa, sem informar em qual momento o modelo foi aprovado e, praticamente instantaneamente após a reação nas redes, retirada da comercialização.
O que era a Febem
O nome Febem existiu até 2006, quando foi substituído por Fundação CASA (Centro de Atendimento Sócio-Educativo ao Adolescente), em projeto de lei aprovado na Assembleia Legislativa de São Paulo. A fundação tinha como finalidade internar menores de idade que infringiram a lei e, através da educação, ressocializá-los, objetivo não alcançado durante sua existência. Há 12 anos, mudança de nome coincidia com a desativação dos complexos grandes e a construção de unidades menores, com capacidade para aproximadamente 56 internos.
À época, a então presidente da Fundação, Berenice Giannella, disse que, para além de alterar a estrutura, a troca do nome refletiria uma nova mentalidade na condução da política de reinserção de jovens em conflito com a lei. O então governador de São Paulo, Claudio Lembo (do extinto PFL, hoje Democratas), chegou a dizer que CASA era um nome ideal, porque se adequava aos objetivos pretendidos pela Fundação, de “oferecer lar, dar acolhimento” aos jovens.
Contudo, o que se viu de lá para cá foi uma continuidade da lógica punitivista que faz das unidades um verdadeiro protótipo das penitenciárias. No final de 2016, a Ponte denunciou espancamento na Unidade feminina Parada de Taipas, extremo norte da capital paulista. Em abril do ano passado, foi a vez do Complexo Raposo Tavares. A Defensoria Pública cedeu imagens que mostravam adolescentes bastante machucados após uma briga dentro do refeitório da unidade.
Dois meses depois, reportagem denunciou agressão contra 28 internos em uma unidade de Guarulhos, na Grande São Paulo. Um dos jovens chegou a ter o dedo decepado. Em julho, pela Lei de Acesso à Informação (LAI), vinha a público a informação de que 50% das unidades da Fundação estavam superlotadas. Em agosto, um funcionário de uma unidade da Fundação deu um depoimento à Ponte contando que a prática de tortura é, não apenas aceita, como parte da rotina entre agentes socioeducativos.