Família de menina morta em escola no Rio vai exigir indenização do Estado

    Maria Eduarda, 13 anos, foi morta no pátio da escola com tiros na nuca. Família suspeita que disparos partiram de policiais militares

    Duda sonhava em ser jogadora de basquete | Foto: Reprodução Facebook

    A família da estudante Maria Eduarda Alves da Conceição, morta aos 13 anos no pátio da escola municipal  Jornalista Daniel Piza, em Fazenda Botafogo, zona norte do Rio, na última quinta-feira (30/3), anunciou que vai buscar uma indenização junto ao governo fluminense. Antes disso, porém, a preocupação principal do advogado da família, João Tancredo, é conseguir um atendimento psicológico para os parentes da menina.

    “Temos que nos preocupar com as questões emocionais desta família. Precisamos arrumar um atendimento psicológico e o governo do estado tem que arcar com isso”, afirma Tancredo. “Além disso, a família também tem direito a uma indenização e ela não vai abrir mão de direito nenhum.”

    Em relação às investigações, o advogado disse que já se sabe que os tiros vieram da direção onde estavam um grupo de policiais militares. De acordo com Anderson, o diretor da escola da Duda disse que os disparos vieram do outro lado do rio. “E você sabe quem estava do outro lado do rio né? Não quero julgar aqui ninguém, mas a gente sabe…”, comenta.

    Homenagem de um primo de Duda postada no Facebook

    Na quinta-feira, Duda, como era conhecida, havia passado o dia inteiro no colégio, como fazia todos os dias. Estudava de manhã e treinava basquete pela tarde, seu esporte preferido. Durante a aula de educação física, por volta das 16h, foi atingida por três tiros na nuca e um na nádega. As crianças correram assustadas com o disparo, apenas o corpo de Duda permaneceu no chão, no meio do pátio da escola.

    O tio e padrinho da estudante, Anderson Rodrigues, 41 anos, estava em um atendimento médico quando recebeu a notícia pela sua sobrinha, irmã da Duda, por celular. “Corri para a escola e quando cheguei lá, estava o corpo da Duda estendido, cheio de sangue, no chão”, diz. “Fui logo perguntar para o diretor, desesperado, como ele permite que as crianças fiquem brincando quando um confronto está acontecendo pelos arredores”, afirma. “Mas o diretor disse que não houve confronto.”

    Em entrevista à Ponte, Anderson disse que os pais da menina estão sem condições de voltar para casa: “Eles estão ficando comigo e com minha esposa, na nossa casa. Moramos do lado deles. Voltar para o lar deles agora não tem como. Tudo da Duda está lá”.

    “Rosilene, mãe da Duda, não conseguiu chegar na hora do crime. Estava fazendo um bico quando tudo aconteceu”, conta. “Ela ficou muito desesperada e sem condições de ver o corpo da Maria naquele estado.”

    Outra homenagem nas redes sociais feita pelos amigos da estudante morta

    Ainda segundo Anderson, Maria Eduarda tinha um sonho de se tornar jogadora de basquete. Ganhou cerca de nove medalhas e uma bolsa de estudos em uma escola particular na Barra da Tijuca, no fim do ano passado. “Eu lembro do dia que ela chegou toda feliz lá em casa, contando para mim e para minha esposa que tinha ganhado essa bolsa. Ela não foi estudar lá porque não havia condições. A mãe dela é acompanhante, o pai pedreiro. Ia ser muito gasto com transporte”, diz. “Mas ela entendeu. Sempre foi uma menina sorridente e comunicativa. Estava sempre com a gente. No carnaval mesmo a gente tinha dado uma passeada pelo Rio, fomos a Cabo Frio. Ela se divertiu tanto”, comenta. “E isso tudo acontece. É inacreditável. Dentro da escola”, conclui. “A gente quer que a justiça seja feita”, finaliza. “Na comunidade a polícia chega com tom de raiva, já querendo atuar”, diz.

    Nesta segunda-feira (3/4), oito parentes de Maria Eduarda, incluindo seu pai e sua mãe, foram recebidos pelo presidente da comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, deputado Marcelo Freixo (Psol). Segundo o deputado, a prioridade, por enquanto, é garantir à família apoio psicológico e acesso às informações sobre as investigações. “Estamos garantindo atendimento psicológico à família, o que é urgente nesse momento. E garantimos também que a Divisão de Homicídios receba a família e que eles possam acompanhar cada passo das investigações”, disse Freixo.

    Familiares de Duda reunidos com o deputado Freixo e vereadora Marielle Franco

    No mesmo dia em que a estudante foi morta, os policiais militares Fábio de Barros Dias e David Gomes Centeno foram flagrados executando dois homens que se encontravam feridos e caídos no chão, atrás da Escola Municipal Daniel Piza.

    Lotados no 41º Batalhão da PMERJ, o mais letal do Rio de Janeiro, os dois PMs já haviam se envolvido em 16 casos de auto de resistência, como são registrados homicídios de pessoas em confronto com a polícia. Presos em flagrante, Dias e Centeno tiveram sua prisão convertida em preventiva na sexta-feira (31/03) pelo juiz Marcello Batista.

    Menos de uma semana após a morte de Duda e dos dois jovens, o aposentado Evangelista Cordeiro da Silva, de 71 anos, foi morto ontem (3/4) na porta de casa, na comunidade de Mandela, nona norte do Rio, enquanto lia o jornal. Segundo moradores, não havia confronto nesta hora. Eles também acusam policiais da UPP Arará/Mandela e, segundo a ONG Rio de Paz, afirmam que alguns policiais estão praticando violações de direitos humanos na comunidade. “Propomos que a coordenação geral da UPP Arará/Mandela procure as lideranças comunitárias da área para que haja uma conversa urgente. Os moradores precisam ser ouvidos e medidas necessárias devem ser tomadas para que a paz seja restabelecida no local. As pessoas estão se sentindo inseguras e insatisfeitas, querendo mudanças”, diz o presidente da ONG, Antônio Carlos.

    Outro lado

    Questionada pela reportagem sobre a morte do idoso, a PM enviou a seguinte nota, por meio de sua assessoria de imprensa:

    “De acordo com o comando da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) Arará/Mandela, policiais da unidade estavam em patrulhamento na localidade conhecida como Mandela 2, por volta das 10h desta segunda-feira (3/4), quando foram atacados por criminosos armados. Na ação, um idoso foi atingido e não resistiu aos ferimentos. O local está isolado e a perícia da Polícia Civil foi acionada.Neste momento, moradores realizam uma manifestação e objetos estão sendo incendiados na Avenida Leopoldo Bulhões. O policiamento na região está reforçado. A Divisão de Homicídios investiga o caso”.

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