Funk de MC Carol sobre Marielle lembra mortos e violações do Estado

    ‘Vocês querem nos matar, nos controlar, vocês não vão nos calar’, diz a canção, que reúne casos de violência policial; em postagem nesta quinta-feira, artista diz que sofreu muito ao fazer a pesquisa para o vídeo

    Após uma semana da execução da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes, a cantora MC Carol divulgou um novo clipe em que fala sobre a dor das mulheres negras e relembra casos de violência contra o povo negro e periférico no Brasil. Batizada com o nome da vereadora, a música chegou a ficar em sexto lugar dos vídeos mais buscados no YouTube nesta quinta-feira (22/3).

    Na abertura do vídeo, um depoimento sofrido da avó de Cristian Andrade, de 12 anos que foi morto durante tiroteio em Manguinhos, na zona norte do Rio de Janeiro, em 2015. Na ocasião, o menino jogava bola quando uma senhora caiu no chão. O garoto foi ajudar a mulher a se levantar e levou um tiro pelas costas. Aos prantos, a avó do menino diz que “amava o bebê” dela.

    Em sua página oficial no Facebook, MC Carol publicou nesta quinta-feira um agradecimento à repercussão do lançamento e disse que sofreu muito quando foi fazer a pesquisa das reportagens para incluir no vídeo. “Doeu, doeu muito… nossa aquela senhora falando no início, me fez chorar muito ontem e toda vez que eu vejo o vídeo eu me emociono. Eu queria destacar um outro momento que é a manifestação na minha comunidade, morro do Preventório [Niterói], onde deram 2 tiros de fuzil na barriga do meu amigo porque confundiram a muleta que ele estava usando com um fuzil as 17h da tarde”.

    Foto: Divulgação/Fernando Schlaepfer

    A música começa com a fala de Carol dizendo “vocês querem nos matar, nos controlar, vocês não vão nos calar” e durante todo o clipe, notícias sobre mortes de pessoas negras dentro da favela aparecem para relembrar casos que não podem ser esquecidos pela sociedade. Carol relembra mulheres que morreram vítima da violência dizendo que ela também é Marielle, Cláudia e Marisa. Mas quem são essas mulheres que a cantora cita?

    Cláudia Silva Ferreira foi morta em 2014 depois de levar um tiro da Polícia Militar e ser arrastada por 350 metros por uma viatura no Morro da Congonha, em Madureira, no subúrbio do Rio de Janeiro. Imagens do corpo da mulher sendo arrastado pela viatura circularam pelas redes sociais na época do assassinato e chocaram o país.

    Marisa de Carvalho Nóbrega foi morta em 2017 depois de receber uma coronhada de fuzil na cabeça na Cidade de Deus, zona oeste do Rio. Segundo a família, a agressão teria partido de um policial militar do Bope que teria agredido o filho dela para obrigar o menino de 17 anos a assumir que era traficante. Marisa teria discutido com o policial por conta de uma abordagem violenta e sofrido a agressão.

    Depois disso, a música de MC Carol continua lembrando que é preciso mais empatia e que “o povo preto está sangrando todos os dias.” Ao mesmo tempo em que a cantora cita as frases pedindo mais solidariedade, imagens de notícias lembram as chacinas em Vigário Geral e na Candelária. Em outro verso, a funkeira diz que a escravidão não acabou e uma imagem traz a pergunta que ecoou por todos os cantos do país em 2013: “Cadê o Amarildo?”. Esse tema, aliás, já tinha sido explorado pela cantora na música “Delação Premiada”.

    Amarildo de Souza foi dado como desaparecido depois de ser visto pela última vez entrando em uma viatura da Polícia Militar, na favela da Rocinha. Depois de muitas buscas e protestos, a investigação concluiu que o pedreiro foi torturado e morto por policiais da UPP. O corpo dele nunca foi achado. No final da música, a MC sentencia: “Preto aqui não tem direitos.”

    Carol também traz questões como o aborto na música e diz que as mulheres são obrigadas a terem os filhos de seus estupradores. Ao mesmo tempo, aparece uma imagem de uma jovem em uma manifestação erguendo um cartaz que diz ‘o estupro veio antes da mini saia’”.

    A música também fala sobre as agressões que professores sofreram no mesmo dia da morte de Marielle, enquanto protestavam contra um projeto de reforma da previdência municipal em São Paulo. A Polícia Militar e a Guarda Civil Metropolitana dispersaram o ato com violência e acabaram ferindo a professora Luciana Xavier.

    A cantora conclui dizendo “presente hoje e sempre, Marielle Franco.” Ao terminar a canção, imagens sobre a morte de Cláudia são relembradas. Para quem assiste ao vídeo, neste momento, o desconforto é evidente: a garganta está fechada e as lágrimas já escorrem. A decisão forte e ao mesmo tempo sensível da cantora de lançar a música nesse momento é um grito. Um grito que exige algo evidente: parem de matar negros e mulheres de periferia.

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