Clima da cidade era de luto e até ônibus municipais homenagearam vítimas; delegado-geral de SP fala em um terceiro suspeito de ajudar no ataque e afirma que objetivo de matadores era ‘aparecer’
O sol não apareceu em Suzano, na Grande São Paulo, nesta quinta-feira (14/3), em que uma cidade inteira velou e enterrou as 7 vítimas do massacre na Escola Estadual Raul Brasil. Os dois atiradores, Guilherme Taucci Monteiro e Luiz Henrique de Castro, se mataram ao serem surpreendidos pela Polícia Militar. O enterro dos matadores e do tio de um deles, Antônio Jorge, que foi assassinado antes da chacina acontecer, não foi divulgado por questão de segurança.
O clima de consternação era geral na cidade. Os ônibus municipais circularam com um adesivo do símbolo de luto. Até o final da manhã, mais de 5 mil de pessoas tinham passado pela Arena Suzano, onde ocorreu o velório, para participar das últimas homenagens para Eliana Regina de Oliveira Xavier, Kaio Lucas da Costa Limeira, Claiton Antonio Ribeiro, Samuel Melquiades Silva de Oliveira, Caio Oliveira e Marilena Ferreira Vieiras Umezo. Com exceção da Marilena, todos os foram enterrados em jazigos coletivos no Cemitério Municipal São Sebastião. O corpo de Douglas Celestino foi velado em outro local por opção da família.
A reportagem da Ponte conversou com amigos e colegas das vítimas, que lembraram de histórias e contaram um pouco da personalidade dos que se foram. A coordenadora pedagógica Marilena Ferreira Vieira Umezu era uma pessoa muito querida por todos os alunos.
Já o estudante Samuel Melquiades Silva de Oliveira foi definido como um “menino maravilhoso, embora tímido em um primeiro momento”. “Era um filho obediente. Menino atencioso. De primeiro era tímido, mas depois que entrou no colegial foi se soltando. O pai e a mãe sempre deram assistência. Ele fazia pequenas pregações em nossa igreja”, conta Maria Dulce de Oliveira, amiga da família e seguidora da igreja adventista do 7º dia, frequentada por Samuel. “Ele correu para um lado e sua amiga para o outro. Ela se salvou”.
Uma cerimônia foi realizada por Dom Pedro Luiz Stringhini, bispo da Diocese de Mogi das Cruzes, antes do início do cortejo fúnebre. Na fala, o religioso falou contra a violência e a importância da solidariedade. “Diante de um ato de extrema violência, da situação de violência presente na nossa sociedade, em todos os lugares todos nós perguntamos qual é solução? O que devemos fazer? Uma coisa é certa e vamos continuar fazendo: construir a cultura da paz. Os cristãos são construtores de paz. Os cristãos e as pessoas de boa vontade se empenham pela paz. Por mais que os ventos sejam desfavoráveis, que tenhamos maus exemplos, inclusive as declarações que vem de cima, nosso caminho não será desviado. Não vamos acreditar que a violência vence. A paz é fruto da justiça Sim à paz, não à violência”, pontuou.
Outras manifestações contra violência aconteceram durante a tarde. Em uma delas, algumas pessoas seguravam uma faixa contra o armamento da população. O tema veio a tona, porque, logo após o ataque, o senador Major Olímpio, da ‘bancada da bala’, usou a tragédia para falar da importância de armar a população.
‘Intenção era aparecer na mídia’, afirma delegado-geral
O principal objetivo do ataque em Suzano era reconhecimento. Em coletiva de imprensa, o delegado geral da Polícia Civil de SP, delegado Ruy Ferraz Fontes, afirmou que Guilherme, o mentor dos assassinatos, e Luiz Henrique, tinham como objetivo aparecer na mídia. “Não há outra razão”, afirmou. Fontes afirmou que há suspeita da participação de um terceiro adolescente, ex-colega de sala de Guilherme. O pedido de apreensão do suspeito foi realizado.
“O ataque tem um caráter pessoal de reconhecimento por parte da comunidade, da sociedade em relação a atividade dele dentro da própria comunidade. Eles não se sentiam reconhecidos”, explicou Ruy, que destacou o modus operandi dos matadores. “Eles copiaram, isso temos materializado já, eles quiseram agir da mesma forma com que agiram os atiradores em Columbine, nos Estados Unidos, com crueldade e com caráter trágico para que eles fossem mais reconhecidos”, continuou. Questionado sobre a história de que Guilherme, o mais novo dos atiradores, teria sido vítima de bullying quando estudou na escola, Ruy minimiza o tema como resultante para o ato. “O bullying é citado em um dos depoimentos mas não é significativo. Ele [Guilherme] queria ser reconhecido. Ele estava em um momento em que não era mais reconhecido pelo tio [morto por ele antes do ataque], que teria demitido ele posteriormente por cometer pequenos furtos”, revela.
Sobre a possibilidade de a dupla ter buscado informações para realização do ataque na deep web ou em fóruns de ódio, como o Dogolachan, Ruy Fontes afirma que, até o momento, não há qualquer prova disso. “Eles travaram poucas conversas em grupos. A maior parte das conversas eram pessoais. Não há evidências, por enquanto, que tenham contatado a deep web para pegar informações de como fazer o ataque”, destacou, em referência a informação que circulou nos meios de comunicação de que os dois frequentariam fóruns anônimos na internet, os “chans”.
O delegado confirmou que as armas brancas foram compradas no comércio virtual Mercado Livre e pagas com cartão de crédito.