Moradores vivem dias tensos após morte de suposto justiceiro da zona sul de SP

    Ex-policial militar apontado como integrante de um grupo de poder paralelo no Parque Arariba, periferia da capital paulista, foi assassinado a tiros em 28 de março

    Carro onde ex-PM esatava quando foi assassinado na zona sul de SP | Foto: Reprodução/Redes sociais

    Moradores do Parque Arariba, na periferia da zona sul da cidade de São Paulo, relatam sobre a intensificação da atuação de um grupo de justiceiros na região após a morte do ex-cabo da Polícia Militar Fabiano Bueno, que seria integrante desse poder paralelo. 

    Sob a condição de anonimato, um morador relata que o ex-PM assassinado era o responsável pela venda de internet e TV a cabo na região. No entanto, essa função era desenvolvida por um homem conhecido como Nenê, suposto integrante da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital), antes de sua prisão. 

    No início deste ano, o suposto membro do PCC deixou o presídio, e quis retomar seus negócios nos bairros próximos ao Parque Arariba, onde o grupo de justiceiros atua. Mas para voltar a comercializar internet e TV a cabo, Nenê precisaria passar por cima de seu grande rival na região, o ex-PM Bueno. 

    Ainda de acordo com o morador, a disputa entre Nenê e Bueno acabou na segunda semana de março, quando o suposto membro do PCC foi assassinado. Mas isso não representou o fim da guerra na região, pois no início da tarde da última segunda-feira (28/03), o ex-policial militar também foi morto a tiros, dentro do seu carro, em frente a uma escola municipal no bairro. 

    Desde então, o clima no Parque Arariba e nos bairros no entorno vivem um clima de tensão e, embora não tenha chegado nenhuma ordem direta, os comerciantes e as escolas dos bairros adotaram uma espécie de toque de recolher, fechando tudo mais cedo e realizando apenas serviços delivery. 

    Nas redes sociais, comerciantes informam sobre o fechamento em horários diferenciados, mas não detalham os motivos por medo. “Todos nós sabemos que, infelizmente, a situação na região não tá legal, e isso acaba colocando a vida de todos nós em risco, por isso estaremos evitando público no [nome do estabelecimento], pois prezamos pela segurança dos nossos clientes e a nossa também”, publicou a página de um comércio. 

    “Passamos para informar que devido aos últimos acontecimentos no Parque Arariba e região estaremos em recesso pela segurança de clientes e da nossa família. Não atenderemos entre os dias 31 de março e 6 de abril. Retornaremos no dia 7 de abril ou antes, conforme os ocorridos da semana”, informou outro estabelecimento nas redes sociais. 

    Em mensagem enviada em um grupo de alunos de uma escola pública do Jardim Novo Orion, uma professora disse que “devido ao toque de recolher que está acontecendo em nossa região, os alunos serão liberados às 20h”. Na mensagem, ela ainda diz que “solicitamos que oriente os filhos a irem direto para casa e não ficar aos arredores da escola quando sair, pois a informação que recebemos é de toque de recolher a partir das 21h”. 

    Também em publicação nas redes sociais, um morador disse que “os atentados não tem nada a ver com o crime [organizado]”. A publicação diz que os ataques na região “são de um grupo de extermínio conhecido como pé de pato do Arariba”.  

    Esse grupo de poder paralelo na região é conhecido há décadas pela população. De acordo com o morador, o grupo se baseia no Parque Arariba, e conta com homens de várias idades, inclusive adolescentes, que comandam o bairro, impedindo atuação de traficantes e “oprimindo até a população”. 

    Segundo esse morador, qualquer tipo de evento ou estabelecimento que for atuar no bairro precisa passar pela autorização do grupo, e é comum pessoas inocentes serem assassinadas por contrariarem a vontade dos justiceiros. A informação também é de que a Polícia Militar não atua no bairro, e todas questões que envolvam a segurança do bairro é de responsabilidade dos ‘pés de pato’. 

    E esse grupo não é novo na região. Reportagem do jornal O Estado de São Paulo de maio de 2008 noticiou a prisão do então soldado Bueno por liderar um grupo de justiceiros no Jardim Novo Orion, bairro vizinho ao Parque Arariba. Na ocasião, policial foi apontado por matar um jovem de 20 anos e balear outras sete pessoas, incluindo uma criança de 8 anos. 

    Somente oito anos depois, em 2016, sua expulsão da Polícia Militar foi oficializada e publicada no Diário Oficial do Estado de São Paulo. No entanto, sua atuação como justiceiro do Parque Arariba teria continuado, conforme relato de moradores. 

    Mas quem teria assumido o comando do grupo de poder paralelo na região foi um homem que é identificado pelos moradores como Luís Branco. Ele também é mencionado na reportagem do jornal O Estado de São Paulo de 2008, como integrante do grupo de justiceiros, e também foi preso juntamente com Bueno, e outros cinco parceiros, por diversos assassinatos na região. 

    Histórico de Bueno 

    Além do ataque que feriu sete pessoas e matou outra em 2008, que resultou na expulsão de Bueno da Polícia Militar, ele teve envolvimento apontado em outros homicídios, fraude processual, tráfico de drogas, porte ilegal de armas de fogo, violência contra mulher, estupro, entre outros crimes. 

    De acordo com reportagem do Portal R7, em 2019, a mulher com quem ele havia se casado um ano antes foi à polícia relatar ser vítima de violência doméstica. Em seu depoimento, ela teria afirmado que sofreu um aborto após ter a barriga chutada por Bueno. 

    Em janeiro daquele mesmo ano, imagens mostram marcas de agressões no corpo da mulher, que teria sido levada para uma área de matagal no município de Embu-Guaçu, na região metropolitana de São Paulo, para ser espancada. O caso chegou a ser registrado, mas, ainda conforme o Portal R7, ela teria pedido para a mãe e a irmã retirar a queixa porque senão seria assassinada pelo ex-PM. 

    Segundo o morador do Parque Arariba, no início deste ano, Bueno também foi responsável pela morte de um jovem no bairro. Segundo o morador, o grupo de justiceiros armou um golpe para o jovem levar uma motocicleta que teria sido negociada em um aplicativo de vendas na internet. Quando o rapaz chegou no bairro, teve a moto roubada e ainda foi assassinado.  

    Outro lado 

    A Ponte perguntou para a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo se há confirmação sobre o toque de recolher na região, se o governo paulista tem conhecimento da atuação desse grupo de justiceiros no Parque Arariba e bairros próximos, e como está a investigação da morte do ex-PM apontado como membro de um poder paralelo. Até publicação desta reportagem não houve retorno. 

    A reportagem não conseguiu contato com a defesa do ex-policial militar assassinado, e não identificou nenhum meio de contato com o suposto justiceiro Luís Branco. 

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