Morte de jovem por policial civil em SP gera pânico: ‘Não vai acontecer só com o Lucas’

Lucas da Silva foi morto por um policial civil em Guarulhos, na Grande SP, em 18 de março. Amigos e moradores da região acreditam que ação é resposta ao assassinato de um PM e da filha dele

Lucas da Silva | Foto: Arquivo pessoal

A morte de Lucas da Silva, 22 anos, tem causado pânico e revolta na comunidade São Rafael, em Guarulhos (Grande SP). O jovem foi morto com pelo menos um tiro disparado pelo policial civil Rodrigo Luiz Ferriani. Amigos e moradores da região veem a ação como uma vingança após a morte do cabo da Polícia Militar Anderson de Oliveira Valentim, 46, e da filha dele, Alycia Perroni Valentim, 19, ocorrida em fevereiro. “Isso não vai acontecer só com o Lucas”, disse um vizinho da vítima. 

Na quinta-feira passada (21/3), amigos e moradores da comunidade fizeram um protesto na Fernão Dias, mesma rodovia onde o jovem foi morto. Eles chegaram a fechar quatro faixas durante a tarde. No chão foi escrito: Justiça, luto, sistema lixo.

A tanto a São Rafael quanto a Favela do Coruja, na Vila Guilherme, zona norte da capital paulista, já convivem com o medo há cerca de um mês. Em fevereiro, a Ponte ouviu moradores de ambas as localidades. Eles relataram invasões ilegais de casas, abordagens truculentas e ameaças. Tudo isso após o carro usado pelos homens que mataram o PM ter sido encontrado em São Rafael. A morte de Lucas é vista como um sinal de agravamento. 

O jovem foi morto em 18 de março. O boletim de ocorrência narra que o policial Ferriani estava “em patrulhamento”, acompanhado pelo delegado Felipe Berna Milen, quando avistaram “um indivíduo em atitude suspeita”. A dupla passou a acompanhar a movimentação do jovem, que conduzia uma moto. Ele não teria respeitado ordens de parada, segundo os agentes.

Lucas teria tirado uma das mãos do guidão e, na versão do policial, a colocado na cintura, como se fosse pegar algo, “obrigando o policial civil Rodrigo a efetuar o disparo de arma de fogo para se proteger da iminente agressão”. Ferido com pelo menos um tiro na região lombar, ele teria sido levado à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Jaçanã, onde a morte foi confirmada.

Os policiais afirmam que encontraram com Lucas um revólver calibre 22 com sete cartuchos íntegros. O celular e R$ 150 em dinheiro também estariam com o jovem sendo apreendidos. 

Amigos de Lucas não acreditam na versão dos policiais. “Ele não era ladrão, não era assassino e não tinha arma”, disse uma amiga.  

Naquela noite, segundo relatos dos amigos, ele teria saído de casa para encontrar uma ficante na casa dela. A Ponte teve acesso à troca de mensagens entre os dois. Às 23h23min, ele escreveu: “Já, já to ai”. Foi a última mensagem enviada pelo jovem.

No outro dia, por volta das 15h25min, a ficante questiona o sumiço de Lucas. O texto não é recebido pelo aparelho do jovem. Mais tarde, já com a morte confirmada, ela se emociona: “se eu soubesse que fosse (sic) a última vez, seria tudo diferente. Eu amo você”.

Troca de mensagens entre Lucas e a ficante| Foto: reprodução

Os amigos acreditam que a abordagem ao jovem possa ter ocorrido em razão da motocicleta que ele conduzia. Há seis meses, Lucas teria comprado a moto do irmão de um dos suspeitos de matar o cabo PM. O plano é que ele pudesse usar o veículo para trabalhar com entregas. 

A motocicleta continua registrada com o nome do antigo dono, o que, para os amigos, pode ter motivado a abordagem. “Os caras estão buscando vingança. Eles estão na sede porque mataram o policial e a filha”, diz um colega. 

Lucas é descrito como um jovem alegre e namorador. Ele gostava de sair com os amigos para festas no fim de semana. Em setembro do ano passado, ele foi libertado após ficar dois meses preso, supostamente por tráfico de drogas. “Se o Lucas tivesse cometido algum delito, o papel do sistema é prender, não matar”, diz uma amiga.

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Para além do luto, os amigos temem novas situações de violência na comunidade. Como a Ponte mostrou em fevereiro, São Rafael chegou a ficar sem luz. Os moradores acreditavam que a falta de energia foi motivada por ação da polícia. “Que a justiça seja apenas feita, é o que queremos… Justiça, segurança e proteção”, falou uma moradora. 

O que dizem as autoridades

A Ponte procurou a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) solicitando entrevista sobre o caso com um porta-voz e com o agente público envolvido. Também foram questionados os pontos abordados na reportagem.

Em nota, a SSP-SP informou que os familiares de Lucas foram ouvidos e segue realizando diligências. “O caso é investigado por meio de inquérito policial instaurado pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). A equipe da unidade já realizou a oitiva de familiares da vítima e prossegue realizando diligências visando ao esclarecimento dos fatos. Os laudos relacionados à ocorrência estão sendo elaborados e serão analisados pela autoridade policial tão logo forem concluídos“, disse a nota.

*Matéria atualizada às 9h40min do dia 1º de abril de 2024 para incluir a nota da SSP-SP.

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