Manifestantes exigiram justiça por liderança ialorixá assassinada na Bahia, e por todas as vítimas de mortes praticadas pelas polícias, incluindo a Operação Escudo, nesta quinta-feira (24)
Movimentos negros de todo o Brasil exigiram o fim da violência policial e de Estado ao marcharem por ao menos 40 cidades nesta quinta-feira (24/8). Marcados na simbólica data em que o advogado e abolicionista negro Luiz Gama morreu há 141 anos, os protestos entoavam o mote de “nossas crianças e o povo negro querem viver” por causa de diversos episódios de violência no país, como chacinas que aconteceram, simultaneamente, no Guarujá (SP), Rio de Janeiro e Bahia no último mês.
Na capital paulista, o ato se concentrou às 18h em frente ao Museu de Arte de São Paulo (Masp) e seguiu até a Praça do Ciclista, ocupando uma das faixas da Avenida Paulista, na região central. Os manifestantes gritaram, diversas vezes, coros “pelo fim da Polícia Militar” como forma de reivindicar a desmilitarização das polícias.
Integrantes de religiões de matriz africana lideravam a caminhada. Muito emocionadas, as iyás (como se referem às mães) pediram justiça por Mãe Bernadete, que foi assassinada a tiros há uma semana dentro do terreiro Quilombo Pitanga dos Palmares, na cidade de Simões Filho, na região metropolitana de Salvador, na Bahia. Em vida, a ialorixá também lutava pela responsabilização dos executores de seu filho, Flávio Gabriel Pacifico dos Santos, o Binho do Quilombo, que também foi morto a tiros em 2017.
“Mãe Bernadete era uma liderança quilombola, uma autoridade tradicional, uma mulher, uma mãe, uma filha, uma avó. Ela tinha que estar viva. Foram mais de 30 lideranças quilombolas assassinadas sem nenhuma solução”, denunciou a ilorixá Adriana T’omolu, do terreiro Ile Ase Omolu Ati Osun, de São Bernardo do Campo (ABC Paulista). “Nós não queremos ser camisetas, não queremos ser monumentos, queremos estar vivas e vivos”, continuou.
A codeputada estadual Carolina Iara, da Bancada Feminista do PSOL, também destacou a perseguição a mulheres negras em cargos eletivos e a defensores de direitos humanos. “Nós mulheres negras somos um alvo. O que aconteceu com Mãe Bernadete mostra que os programas de proteção à testemunha não funcionam”, discursou.
Por isso, em manifesto, os movimentos elencaram 11 reivindicações a diversas autoridades, como a proteção à vida de defensores de direitos humanos quilombolas, reconhecimento de terreiros como espaços sagrados e a titulação dos territórios dos povos tradicionais. Solicitam ao governo federal a federalização das investigações de todos os casos “em que o resultado da incursão policial caracterize assassinatos, execuções e/ou chacinas e massacres” e um plano nacional de reparação para familiares e vítimas do Estado.
Ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal (STF), por exemplo, os pedidos versam sobre limitar abordagens policiais a partir da criação de critérios objetivos de “fundada suspeita”; a imposição de “métodos de controle externo à atuação policial e a responsabilização e cobrança ao papel constitucional dos Ministérios Públicos no que diz respeito à limitação da atuação violenta das polícias”; a proibição de “operações policiais reativas (com caráter de vingança) a assassinato de policiais e operações invasivas e em comunidades sob pretexto do combate ao tráfico de drogas”. Os manifestantes também reivindicaram o uso de câmeras nas fardas de todos os agentes de segurança pública.
Cartazes lembrando as vítimas da violência policial e de Estado também se fizeram presentes, com cobranças a todos a todas as esferas de governo.
Familiares do Movimento Mães de Paraisópolis cobraram a responsabilização de todos os agentes que atuaram no Massacre de Paraisópolis, quando nove jovens foram mortos por asfixia ao serem encurralados em uma dispersão feita pela PM a um baile funk na comunidade da zona sul da cidade em 2019. A primeira audiência do caso aconteceu em julho e a próxima está marcada para 18 de dezembro, mesmo mês que o episódio completa quatro anos.
“A gente está há quase quatro anos nessa luta, onde nossos filhos foram assassinados por essa polícia assassina, que se legitima por cima de ações que são deliberadas pelo Estado, pelo governo do estado de São Paulo. A gente não pode permitir que isso siga porque não está certo matar os filhos da gente, nunca foi certo matar os filhos da gente. No nosso país não existe pena de morte”, declarou Maria Cristina Quirino, mãe do adolescente Denys Henrique Quirino da Silva, 16, uma das vítimas do massacre.
Em alguns momentos do protesto, integrantes do Movimento Brasil Livre (MBL) tentaram tumultuar a concentração e a marcha, assim como aconteceu no ato em frente à Secretaria de Segurança Pública no início do mês contra a operação policial no Guarujá, com faixas de “policiais são heróis”, mas foram retirados pela polícia.
Veja a seguir outras fotos da marcha em São Paulo: