Órgão sinaliza intenção de criar, até março de 2019, um grupo para verificar políticas de segurança pública no estado de São Paulo; discussões sobre a promotoria específica começaram no início deste ano
“Estamos com medo. O presidente [Jair Bolsonaro] falou que a polícia pode matar, o governador [João Doria] disse que, com ele, a polícia atira para matar. Existe o recesso da Justiça, mas não há recesso na morte dos jovens na periferia”. A fala de Marisa Feffermann, da Rede de Proteção da Juventude, resumiu a preocupação de movimentos sociais em reunião com o MP (Ministério Público) de São Paulo sobre violência policial.
O encontro teve como objetivo discutir a criação de uma promotoria específica dentro do órgão para fiscalizar somente a atuação policial. Esta é uma das atribuições do MP, conforme o art. 129 da Constituição, no qual aponta o “controle externo” da corporação como função do MP. No entanto, o primeiro passo será formar um grupo de trabalho.
Esta ação é feita pelo Gecep (Grupo Especial de Controle Externo da Atividade Policial), mas será transferida para o grupo de segurança pública com integrantes escolhidos por Mario Luiz Sarrubbo, subprocurador-geral de Justiça do MP paulista.
Um dos entendimentos de Sarrubbo é de que arestas precisam ser aparadas para, no passo seguinte, se dar a criação da promotoria. Há o risco desta nova formação pegar atribuições de outros promotores, o que geraria conflitos internos. Para solucionar estes impasses políticos, um grupo se reunirá ao longo de janeiro de 2019.
“Vamos nos reunir com representantes da promotoria de habitação, direito humanos, da 2ª instância, para acertar esses pontos de conflito dentro da instituição e fazer com que se consolide a promotoria de segurança sem conflito de atribuições”, definiu Sarrubbo, classificando esta nova promotoria como “a sua menina dos olhos” – em mais de um momento ele usou este termo para explicar o cuidado nos seus passos no processo.
Segundo a promotora Suzana Henriques da Costa, existe o risco de promotores se sentirem invadidos pela multidisciplinaridade da nova formação. “Só temos a ganhar com este grupo, com um perfil bem definido e controle macro de política de segurança pública, não em um policial em específico”, definiu.
Uma das preocupações é atuar de forma efetiva com promotoria de segurança e não dar um passo em falso e “perder 10 anos de uma iniciativa fantástica com um tiro pela culatra”, como definiu o promotor Alfonso Presti. A nova promotoria, quando criada, terá a participação de um integrante da promotoria militar.
Já o promotor Eduardo Ferreira Valério, que atua na área de direitos humanos, alertou os movimentos presentes sobre a ação específica do MP sobre controle externo da polícia. “O MP não traça políticas públicas do governo no espaço da segurança pública, nós fiscalizamos a sua execução, identificamos e auxiliamos na aplicação destas políticas. Apontamos ao executivo”, explicou.
Reivindicações
Os movimentos sociais estavam representados por cerca de 15 pessoas, entre integrantes da Rede de Proteção, da Defensoria Pública de São Paulo e da Ouvidoria da Defensoria Pública. Os representantes do MP receberam um documento com as reivindicações para direcionar a atuação da futura promotoria de segurança pública.
O primeiro pedido é justamente o controle externo da polícia, destacando que, “apesar dos esforços, é preciso traçar uma estratégia para concretização desta norma”. Depois, solicitam a oitiva e proteção das vítimas e testemunhas de violências, já que, segundo os movimentos, o expediente de ameaça é comum, bem como a melhora do Provita (programa de proteção de testemunhas).
Há também por parte do grupo a cobrança na melhora das perícias, considerando haver “deficiências” de um modo geral nos laudos dos locais de crimes e necroscópicos das vítimas. E pedem o combate à “criminalização das comunidades e expressões culturais”, quando citam os bailes funks na periferia, por exemplo, alvos de ações policiais violentas até mesmo antes de acontecerem.
Outros pontos para nortearem a promotoria são retirados de uma condenação do Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos, da OEA (Organização dos Estados Americanos), no Caso Favela Nova Brasília. Outros cinco itens são listados: assistência médica às vítimas de violência; publicidade das investigações; metas para redução da letalidade policial; participação das vítimas e familiares em inquéritos e, por fim, a mudança de nomenclatura em B.O.s (Boletins de Ocorrência) em casos de mortes causadas por policiais.
O documento é direcionado ao subprocurador Sarrubbo e ao procurador-geral de Justiça de São Paulo, Gianpaolo Poggio Smanio.