Sete policiais foram denunciados por homicídio qualificado; Ministério Público também pediu afastamento do trabalho nas ruas e o recolhimento de suas armas
Sete policiais militares de Goiás foram denunciados na sexta-feira (21/6) por homicídio qualificado pelas mortes de quatro jovens. O crime ocorreu em maio de 2022 na cidade de Rio Verde. Para o Ministério Público de Goiás (MP-GO), os PMs fizeram uma emboscada para matar as vítimas. Além da denúncia, foi requerido o afastamento dos policiais de funções nas ruas e o recolhimento de suas armas.
“O crime foi praticado mediante emboscada, uma vez que as vítimas foram colhidas em local ermo, impróprio para qualquer abordagem policial, sem que pudessem prever ou esperar o ataque repentino, o que lhes impossibilitou todo tipo de reação”, escreveram os promotores do Grupo de Atuação Especial no Controle Externo da Atividade Policial e na Segurança Pública.
Foram denunciados os policiais militares Regis Moraes Almeida, Robson Peixoto de Oliveira, Chesley Rodrigues das Chagas, Manoel Araújo da Silva, Marcos Felipe Rodrigues dos Santos, Camila Mendes dos Reis e Ricardo da Silva Souza.
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Todos eles integram o Comando de Operações de Divisas (COD). Na noite do crime, os policiais estavam divididos em duas equipes: Robson, Ricardo, Marcos Felipe e Camila integravam a Equipe Recobrimento Sudoeste e Regis, Manoel e Chesley a Equipe COD Bravo. A viatura onde estavam os PMs da equipe Bravo possuía um equipamento de georreferenciamento, o que auxiliou na elucidação do caso.
Segundo relato de familiares à Ponte, Acineto Alves da Silva, 17 anos, Alex Aparecido Gomes dos Santos, 31, Eduardo Rodrigues, 25 e Tiago de Medeiros Brandão, 30, se deslocavam para uma festa quando foram abordados pelos policiais.
A denúncia do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) diz que no momento em que os quatro saíram de Rio Verde, por volta das 21h46, a viatura COD Bravo deixou a base.
A viatura do COD Bravo percorre a BR-452, entra na rodovia GO-210 e depois percorre 20 km em sentido Santa Helena de Goiás. Enquanto seguiam pela GO-210, por volta das 21h14, o carro dos jovens foi desligado. Segundo o MP-GO, o quarteto foi abordado pela equipe do COD Sudoeste neste momento.
Por volta das 22h30, os policiais do COD Bravo chegaram ao local onde supostamente ocorreu confronto com as vítimas. O local é uma estrada vicinal da GO-210. Às 22h34, o carro das vítimas chega à mesma estrada vicinal.
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Para o MP-GO, depois de todos os deslocamentos feitos pela viatura e o carro das vítimas, os jovens foram mortos e tiveram os celulares destruídos.
Eduardo levou dois tiros (na região cervical e no peito) e teve escoriações pelo corpo. Já o adolescente Acineto foi ferido com três tiros (no peito, abdômen e na região lombar). Tiago levou um tiro no peito e Alex foi ferido com três tiros que atingiram o ombro, peito e abdômen.
Com os corpos das vítimas na viatura, conforme o MP-GO, os policiais Regis, Robson, Chesley, Marcos Felipe e Ricardo se deslocaram até a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Rio Verde. Durante o deslocamento, os PMs ligaram para o Corpo de Bombeiros Militar e foram atendidos por um sargento. Segundo o MP-GO, foi solicitado a ele o endereço da UPA e informado que houve um confronto policial com feridos.
Em depoimento, os PMs disseram que o carro das vítimas foi perseguido após ter furado um bloqueio em alta velocidade. Os jovens teriam atirado contra os PMs, que revidaram. Os quatro teriam sido atingidos por tiros de fuzil e carabina e levados com vida até a unidade de saúde. O MP-GO aponta que a versão dos PMs é inverossímil.
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Segundo a denúncia, não houve furo em bloqueio, como contaram os policiais. O veículo das vítimas não andou em velocidade compatível com o que se verifica em perseguições policiais. As vítimas chegaram mortas ao hospital e quem chegou primeiro ao local de confronto foram os policiais.
Para o MP-GO, as vítimas chegaram sem vida à UPA e os PMs teriam constrangido o médico plantonista a elaborar um relatório dizendo que as vítimas chegaram com vida ao local. O objetivo seria evitar uma perícia no local.
O MP-GO também solicitou a perda de cargo dos PMs e o pagamento de R$ 50 mil em danos morais por vítima.
A denúncia, no entanto, não incluiu fraude processual e coação. Os PMs haviam sido indicados pelo primeiro crime e parte do grupo de policiais pelo segundo no âmbito do inquérito policial. O entendimento do delegado Adelson Candeo Junior foi de que os policiais pressionaram o médico da UPA a emitir um relatório dizendo que os jovens estavam vivos ao darem entrada na unidade.
Segundo a assessoria do MP-GO, o crime de fraude processual não foi incluído na denúncia por se tratar de crime que deve ser apurado em processo na Auditoria Militar, que será denunciada nesta instância.
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A denúncia é assinada pelos promotores Paulo de Tharso Brondi de Paula Rodrigues, Cauê Alves Ponce Liones, Marcelo Henrique Rigueti Raffa, Thiago Galindo Placheski, Caio Affonso Bizon e Bernardo Monteiro Frayha.
O que dizem as autoridades
A Ponte procurou a Secretaria da Segurança Pública de Goiás solicitando entrevista com os policiais citados e com um porta-voz da instituição. Também foi requisitada uma posição sobre apurações internas na Polícia Militar sobre o caso. Não houve retorno até a publicação.
A reportagem também questionou o MP-GO sobre a denúncia não ter englobado fraude processual, como foi o entendimento do inquérito policial. A resposta foi incluída ao texto.
*Matéria atualizada às 18h20 do dia 24 de junho de 2024 para incluir o retorno do Ministério Público de Goiás.