MP-SP denuncia PM por morte de morador de rua

    Soldado Alexandre Mendes é acusado de ter atirado à queima roupa contra a cabeça de Bruno Campos e, depois, mudado a cena do crime, que ocorreu no ano passado. Caso foi revelado pela Ponte Jornalismo
    Policial Alexandre Mendes responde ao processo em liberdade
    Policial Alexandre Mendes responde ao processo em liberdade

    O MP-SP (Ministério Público de São Paulo) denunciou à Justiça o policial militar Alexandre Mendes, de 42 anos, acusado de matar, com um tiro na cabeça, o morador de rua Bruno Alves de Campos, de 20 anos, na noite de 25 de fevereiro do ano passado, em São José do Rio Preto, interior do Estado. O agente foi denunciado por homicídio duplamente qualificado, dano qualificado, constrangimento ilegal, fraude processual, disparo de arma de fogo e abuso de autoridade.

    Pouco antes do crime, o PM participou de uma reunião entre moradores e comerciantes da região que afirmaram estar incomodados com a presença de moradores de rua na praça Figueira, espaço nobre da cidade. De acordo com a denúncia, a participação de Alexandre Mendes na reunião estava vinculada à sua condição de PM, “que o fez acreditar que poderia, mediante ameaça e violência física, garantir a segurança do local, proibindo a presença de pessoas em situação de rua na praça pública”.

    Duas semanas antes de sua morte, Bruno Alves de Campos perguntou ao pastor Ivo “por que existe o sofrimento?”  Tinha os olhos tristes. O religioso, conhecido por seu trabalho social junto a moradores de rua em São José do Rio Preto, noroeste de São Paulo, recorreu à desobediência de Adão e Eva para justificar a existência de tanta dor no mundo.  O rapaz não respondeu. Releia esta reportagem, escrita por Claudia Berfort.

    O soldado Alexandre Mendes, que estava de férias, convidou seu vizinho Luís Carlos dos Santos para verificar a situação na Praça Figueira, após a reunião entre moradores e comerciantes. Ele encontrou quatro rapazes em situação de rua, entre eles, Bruno Alves de Campos, e, de arma em punho, ordenou que todos saíssem da praça. Após recolher todos os pertences pessoais da praça, ateou fogo em tudo.

    Bruno Alves de Campos foi assassinado com um tiro na cabeça
    Bruno Alves de Campos foi assassinado com um tiro na cabeça

    Depois disso, Bruno teria arremessado pedras contra o PM, que afirmou ter sido atingido no joelho e nas costas. O PM, então, correu atrás do grupo, disparou um tiro para o alto e, na sequência, alcançou Bruno e disparou um tiro na cabeça do morador de rua. Depois, o agente e um funcionário de uma pizzaria, Adriano Rocha, forjaram a cena do crime para alegar legítima defesa. Eles plantaram uma faca ao lado do corpo. A fraude foi registrada por um jornal local que fotografou o corpo, primeiro, sem nada ao lado e, depois, uma faca surge quase encostada à vítima.

    Rocha foi denunciado por fraude processual. Procurada, a SSP (Secretaria da Segurança Pública) afirmou, por telefone, que a reportagem da Ponte Jornalismo deveria procurar diretamente a Polícia Militar. A corporação não respondeu a solicitação da Ponte até a veiculação desta reportagem. Em compensação, o TJM (Tribunal de Justiça Militar) afirmou que “o PM Alexandre não está preso no Presídio da Polícia Militar “Romão Gomes” e não está sendo processado nesta Justiça Militar. Ele foi denunciado na Comarca de São José do Rio Preto e está respondendo ao processo em liberdade. Na data dos fatos, ele pertencia à 2ª Cia PM do 17º Batalhão de São José do Rio Preto.”

    Acusado de outra execução

    Não é a primeira vez que o soldado Alexandre Mendes tem participação em um homicídio. De acordo com a Ouvidoria da Polícia de São Paulo, órgão responsável por fiscalizar as polícias que atuam no Estado, em 27 de janeiro de 2002, o policial militar, acompanhado de outros dois PMs, agiu em uma ação que terminou no assassinato do catador de lixos Antônio César de Oliveira, de 52 anos.

    De acordo com o Boletim de Ocorrências, registrado pelos policiais envolvidos na ação, Antônio de Oliveira revirada o lixo de um casal de idosos em São José do Rio Preto quando foi advertido pelos proprietários para que ele não espalhasse o lixo pela rua. O catador teria sacado uma arma e disparado contra o casal, que foi socorrido. Depois Oliveira fugiu para sua casa.

    Os policiais receberam as características físicas do catador e foram até a casa dele. Os três policiais afirmaram em depoimento que, quando chegaram ao local, ele e sua mulher estavam sentados na sala de casa assistindo televisão. Foi quando os policiais pediram para que eles saíssem com as mãos para cima.

    Na versão oficial, apresentada pelos PMs, consta que Antônio saiu de casa atirando contra os policiais, que apenas revidaram. O catador de lixo morreu no local, após ser atingido cinco vezes. Sua mulher levou um tiro, na nádega, mas foi socorrida e sobreviveu. Um revólver com 6 balas deflagradas foi apreendido. Dentro da casa, os agentes afirmaram ter encontrado 29 balas de calibre 38 e um canivete.

    Os três afirmaram que dispararam contra o catador de lixos. E, por isso, não sabiam identificar quem atingiu ou não o suspeito. Em 30 de setembro de 2002, o inquérito militar foi arquivado, após a Justiça ter entendido que os três policiais agiram em legítima defesa.

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