‘Não queremos salas de aula como jaulas’: professores fazem ato contra governo Tarcísio em SP

Manifestação desta sexta (24) deveria ser assembleia para convocar greve, mas não teve quórum. Escolas cívico-militares, projeto recém aprovado na Assembleia Legislativa, foram alvo: “não às escolas-quartel”

Professores em protesto contra governo Tarcisio nesta sexta (24/5) no Masp | Daniel Arrayo / Ponte Jornalismo

Sob extenso cerco policial, centenas de professores, servidores da educação e alunos de escolas da rede pública se reuniram nesta sexta-feira (24/5), no Museu de Arte de São Paulo (Masp), em manifestação do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo, a Apeoesp. Previsto como assembleia, o evento foi convertido em ato pela falta de quórum para votações.

O ato acontece na semana em que o projeto de escolas cívico-militares, que prevê participação efetiva da Polícia Militar no dia-a-dia de escolas estaduais, foi aprovado na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, a Alesp. A votação da proposta, criada pelo governo estadual e encaminhada à casa, foi marcada por truculência da Polícia Militar, que agrediu e deteve adolescentes que se manifestavam contra a medida.

O ato fechou um lado da Avenida Paulista, no sentido da Rua da Consolação, regiçao central da capital paulista. Com concentração marcada para as 16h, o ato não atingiu o contingente esperado pela organização. Para Flaudio Azevedo, diretor da Apeoesp, a mudança de tempo em São Paulo e o fato de o evento ser realizado em uma sexta-feira podem ter ajudado no esvaziamento.

Desde antes do início da movimentação, chamava atenção a presença massiva de forças policiais. Os militares se postaram em fila entre os manifestantes e a ciclofaixa no canteiro central, além de estarem, também, posicionados no quarteirão anterior e no quarteirão seguinte.

Luiza Martins, presidente da União Paulista dos Estudantes Secundaristas, a Upes, e jovem presa na última terça-feira (21/05) após manifestação na Alesp, criticou a presença do efetivo policial: “em manifestações, é sempre desproporcional a quantidade de policiais para a quantidade de professores”, apontou a estudante. Ouvida pela Ponte, ela também relatou ter recebido provocações dos militares presentes antes de subir no carro de som.

Ainda no início do ato, uma discussão entre policiais militares e manifestantes aconteceu na ciclofaixa, de frente ao carro de onde discursavam, e um PM vestindo um colete onde se lia “imprensa” chegou a pegar seu cassetete e se postar em posição de combate na retaguarda dos demais agentes envolvidos, mas a questão foi resolvida de maneira pacífica.

No carro de som, o clima também não era amistoso. Discursaram representantes da Apeoesp, organizadora do evento, membros de centrais sindicais, professores e servidores da rede pública e jovens reprimidas pela Polícia Militar na manifestação ocorrida na Alesp três dias antes.

Intercaladamente, as pessoas inscritas para fala ou elogiavam a proposição do evento e os esforços da Apeoesp pela causa educacional, ou criticavam a organização pela falta de proposições palpáveis. Parte dos oradores pedia a votação de uma greve geral de professores – esses, eram efusivamente aplaudidos pelos manifestantes presentes. A demanda existe ao menos desde a última assembleia, realizada em abril, quando a greve geral foi derrotada em votação e, em seu lugar, foi definido um boicote aos aplicativos de atividade virtual utilizados na rede estadual.

Alexandre Silveira, professor da rede pública estadual presente na manifestação, argumenta que a paralisação no uso dos aplicativos não pode ser confundida com greve. “Greve de aplicativo não é greve, o professor está trabalhando. Você bate o ponto. Como se faz greve trabalhando? Isso não existe”, afirmou à Ponte. Descontente com a falta de encaminhamentos do ato e com a proposta, pela Apeoesp, de uma nova assembleia no mês de junho, coincidindo com o fim do semestre letivo, Silveira afirmou que o sindicato, “passando o trator na oposição”, está adaptando seu calendário ao processo eleitoral.

Mesmo com as discordâncias, pautas centrais da discussão educacional no estado estiveram presentes no discurso de todos os presentes. Uma delas é a proposta de corte de verba da educação feita pelo governo estadual, que pretende retirar R$ 9 bilhões do orçamento da Secretaria da Educação em 2025 e realocar os recursos para a pasta da saúde. A medida aguarda votação na Alesp.

Outra questão central do evento foi a violência policial contra jovens estudantes e a presença da Polícia Militar dentro das escolas. Com a recente aprovação do Projeto de Lei Complementar 09/2024, das escolas cívico-militares, que aguarda sanção do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), é possível que escolas da rede estadual passem a ter sua gestão divididas entre gestores educacionais e policiais. O projeto, que deixa em aberto aspectos concretos da proposta, indica que as transformações devem começar por escolas localizadas na periferia.

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Luiza Martins se manifestou contra a proposta em seu discurso. À reportagem, a jovem afirmou que é preciso “tratar com centralidade o projeto de escolas cívico-militares, porque esse não é um projeto técnico, mas ideológico”. “A gente não quer um futuro que coloque nossas salas de aula como jaulas”, declarou.

Estiveram presentes no ato alunos da Escola Estadual João Solimeo, na Brasilândia, zona norte de São Paulo. A escola, que enfrenta o fechamento de salas, foi palco de uma manifestação feita pelos alunos no início de maio. O protesto terminou com a chegada da PM, que reagiu de maneira violenta, ferindo alunos e prendendo três adolescentes.

O ato se encerrou, sem intervenção policial, às 18h10. Não houve votações ou definições de pauta.

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