PM sem identificação dispersou bloco de carnaval em São Paulo com bala de borracha e spray de pimenta; vítimas questionavam ação quando policial intimidou uma das pessoas baleadas
“Não aponta o dedo para mim”. “Você vai tomar um atropelo aqui”. “Cala a boca que não tenho cerimônia em quebrar cara de mulher”. Essas foram a ameaça de um policial militar de São Paulo a uma mulher baleada com tiro de bala de borracha em ação na Barra Funda, zona oeste de São Paulo, na noite da terça-feira (5/3).
A festa carnavalesca começou por volta de 17h. Por conta da chuva que caiu em São Paulo no início da noite, o bloco atrasou seu trajeto e terminou por volta de 20h. Duas horas mais tarde, as pessoas estavam em um bar na Rua João de Barros quando a tropa da PM paulista chegou já atirando, segundo as vítimas.
“Tinha 15 pessoas na calçada em frente a um boteco, todos tranquilos, um clima de paz e fomos pegos de surpresa com a policia na frente da gente. Vi a hora em que o PM apontou para mim e atirou, desviei e a bala de borracha pegou na bunda”, conta o músico Lincolm Antônio, de 48 anos. Vídeos mostram o momento da investida policial.
Ele estava com a namorada no local. Thais Campos, sua companheira, também levou um tiro de borracha na costela. Mais três pessoas além deles teriam ficado feridas, segundo relatam. “Não lembro da hora que tomei o tiro, até deletei da memória. Só lembro de ter corrido para o bar me proteger, já com dor na costela. Eles entraram no bar e jogaram spray lá dentro”, relembra a atriz, de 36 anos.
Após serem baleados pela PM, parte do grupo resolveu cobrar respostas na 3ª Cia do 4º BPM/M (Batalhão de Polícia Militar Metropolitano), que também fica no bairro da Barra Funda. Lá, encontraram um dos PMs que atuaram na ação, de acordo com eles “bastante alterado”.
“O policial estava super exaltado, muito nervoso, com olho vidrado. Falava para a gente manter distância dele, sendo que não estávamos perto nem nos aproximando. Fiquei nervosa e ele falou: ‘Cala a boca que não tenho cerimônia em quebrar cara de mulher’. Aí saímos porque não resolveria nada”, relembra Thais.
O casal e amigos deixaram a 3ª Cia para receber atendimento médico. A atriz conta que o local do tiro está em carne viva, com o entorno inchado e bastante dolorido. “Faço tudo bem devagar para não doer”, explica. Thais e Lincolm garantem que denunciarão a violência da PM contra os membros do Bloco Agora Vai na Corregedoria da Polícia Militar.
A Ponte solicitou explicações da SSP (Secretaria da Segurança Pública) de SP, através de sua assessoria de imprensa terceirizada, a InPress, sobre a ação na Barra Funda. Em nota, a pasta explica que a “Polícia Militar foi acionada por conta de interdição de via pelo Bloco Agora Vai, na rua Brigadeiro Galvão, após o horário permitido, na noite de terça-feira (5/3)”. “As equipes policiais fizeram contato com os organizadores do evento, solicitando a desobstrução da rua, mas sem acordo. Para restauração da ordem pública, foi necessária a intervenção direta para desobstrução da via pública ocupada sem autorização, com técnicas de controle de distúrbios civis no local”, sustenta a SSP.
Ainda na explicação enviada à reportagem, a instituição explica que “não compactua com eventuais desvios de conduta, colocando-se à disposição da vítima para formalização de denúncia por meio da Corregedoria da Polícia Militar (rua Alfredo Maia, 56- bairro da Luz, São Paulo- SP; próximo à estação Tiradentes da Linha 1-Azul)”, diz a secretaria.
As seguintes perguntas foram enviadas para SSP e PM:
Qual ocorrência levou os PMs para esta ação?
O que motivou o uso de armamento menos letal em vez de dialogar com as pessoas?
Vítimas apontam que os PMs lançaram spray de pimenta dentro de um bar. É correto o uso do spray em ambientes fechados?
Como a SSP e a PM avaliam a ameaça que o PM teria feito à mulher, dizendo “cala a boca que não tenho problema nenhum em quebrar cara de mulher” e “você vai tomar um atropelo aqui”?
É correto um PM atuar na rua sem o uso de identificação?