FLM ocupou 16 imóveis na capital paulista para denunciar a ausência de políticas para moradia. Uma mulher de 62 anos contou ter sido ferida pela PM
Integrantes do FLM (Frente de Luta por Moradia) ocuparam, entre domingo (12/04) e segunda-feira (13), 16 imóveis de São Paulo que estariam há anos abandonados. Menos de doze horas após a série de ocupações, a reportagem da Ponte Jornalismo visitou alguns dos imóveis, localizados num raio de 2 quilômetros no centro da cidade.
Pessoas ligadas ao movimento contabilizam mais de 1,5 mil famílias inclusas nessas 16 ações. Entre elas, está Sônia Maria de Almeida, de 62 anos, que contou ter sido atingida na cabeça por um estilhaço de bomba, atirada por PMs (policias militares) na rua José Bonifácio, no centro, enquanto tentavam ocupar um edifício na rua. Ela foi socorrida pelo Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) e foi levada à Santa Casa, onde ficou até o fim da tarde desta segunda.
Paulo, da ocupação da José Bonifácio:
Em entrevista à Ponte, Sônia, que vive em uma outra ocupação da FLM, na região do Brás, contou como tudo aconteceu. “Não entramos em confronto com a PM. Houve uma agressão. Estávamos andando e atiraram contra a gente”, afirma. Ela relatou que, assim que foi atingida, os integrantes do movimento prestaram os primeiros socorros e, em seguida, foi “bem atendida” na Santa Casa.
A principal reclamação de quem ocupa os prédios abandonados é o alto preço dos aluguéis e a inércia do poder público em conduzir políticas públicas de moradia. Quem ocupa quer chamar atenção para “problemas maiores”. Não se trata de apenas a questão da moradia, mas de questões sociais mais abrangentes, até mesmo a degradação da região central.
De acordo com Patrícia Stabile, de 41 anos, que estava à frente da ocupação da rua Conselheiro Crispiniano, há prédios abandonados há 10 anos na região. Ela informou que os alvos não foram escolhidos aleatoriamente. “Passamos dois meses levantando a situação do imóvel”, disse.
Moradora de uma ocupação na avenida São João, casada com um cabeleireiro autônomo e mãe de uma menina de 8 anos, Patrícia disse que a maioria das pessoas que ocupam é mulher. Dentro dos prédios, sempre há muitas crianças também, que têm de ir para a escola diariamente.
Cozinha da ocupação da Conselheiro Furtado:
Nos imóveis, há regras para a boa convivência de todos. Entre elas, estão a separação, por andares ou quartos, de famílias. Por exemplo, local para casais heterossexuais, homossexuais, mães com filhos, homens solteiros e mulheres solteiras. No banheiro, sujou, limpou. A cozinha existe por colaboração mútua. Todos ajudam como podem: dinheiro, alimentos ou mão de obra.
“Tudo isso é por R$ 150. Eu sou vendedor. Com muito orgulho. E entrar para o movimento foi a melhor coisa que eu já fiz na minha vida. Aprendo a ser um ser humano melhor a cada dia. É impossível pagar R$ 1 mil num aluguel do centro”, afirma Alexandre Loyola, de 43 anos, que ajudava a cuidar da ocupação da rua Conselheiro Furtado.
Por serem ocupações recentes, em todas, a reportagem da Ponte notou um grande número de viaturas que passavam em frente dos imóveis. PMs olhavam atentamente para as fachadas dos imóveis. O período de 24 horas após a ocupação de um imóvel é considerado crucial pelos militantes. É nesse período que a PM costuma adotar ações para controlar a entrada e saída de pessoas, além de efetuar uma possível remoção. Passado esse período, é mais comum que a polícia passe a agir apenas se houver a expedição de um mandado de reintegração de posse, feita pelo Judiciário.
“Tá vendo aquele homem forte do outra lado?”, aponta Patrícia Stabile para o outro lado da rua na Conselheiro Crispiniano. “Ele é da inteligência da PM. Está só observando”. O homem, forte, de boné na cabeça, com dois sacos de rosquinha na mão direita, e com um celular na mão esquerda, há 10 minutos posto na orelha, estava encostado na lateral de uma loja. “A gente sabe quem é, porque essas ocupações são de longa data”.
Patrícia, da ocupação da Conselheiro Crispiniano: