Pai luta para salvar filho com deficiência mental enviado à prisão comum

    ‘Quero tirá-lo de lá o mais rápido para não perdê-lo, senão acaba minha vida’, desabafa Gilberto Geraldo, pai de Adriano, que tem 42 anos e idade mental de uma criança de seis

    Gilberto dormiu ao lado do filho enquanto ele estava preso em uma delegacia | Foto: Arquivo pessoal

    Gilberto Geraldo tem 62 anos, 42 deles dedicados a cuidar de seu filho Adriano, que possui deficiência mental. Desde o dia 6 de outubro, Gilberto não tem conseguido viver normalmente. Esta é a data em que o filho foi preso e depois enviado a um presídio comum. O pai luta para tirar o filho da cadeia. Seu temor é não conseguir fazer isso a tempo e vê-lo morrer sem sua ajuda.

    “Eu estou desesperado. Depois de cuidar por 42 anos, fazendo o que podia por ele, vem a Justiça e joga ele para morrer? Por eles da lei, meu filho vai morrer lá. Os próprios presos estão indignados. Tem 42 anos, mas a mente é de uma criança!”, conta à Ponte, desesperado, Gilberto.

    O pai chegou a dormir no chão do 1º DP de São Bernardo do Campo, onde Adriano permaneceu por uma semana até ser enviado ao CDP (Centro de Detenção Provisória) de Pinheiros, em São Paulo. Outros presos registraram em foto e vídeo o momento que o pai dá apoio ao filho, que tem idade mental de 6 anos.

    “Quero tirá-lo de lá o mais rápido para não perdê-lo, senão acaba minha vida”, desabafa, aos prantos, Gilberto. “Se for o caso, a gente pega, tira ele de lá e põe em uma clínica particular. A família toda se junta e paga para ele ser cuidado, não ficar jogado igual um lixo”, continua.

    Adriano era acusado de abuso sexual em 2001. Segundo seu pai, a vítima, posteriormente, confessou se tratar de uma mentira, o que não influenciou na decisão da juíza Sandra Regina Nostre Marques. Ela determinou que ele respondesse em um centro especializado para deficientes mentais.

    Gilberto visitou o filho no domingo (14/10) e recebeu apoio dos outros presos. Um faxina (preso responsável pelos cuidados de uma ala específica) o questionou sobre as condições do filho e prometeu que os demais presos ajudariam a melhorar o convívio de Adriano, que precisa de ajuda pra tomar banho, comer e demais afazeres.

    “Eu só não morri até agora porque deve ser obra de Deus. Não consigo mais dirigir, só ando caindo na rua. Meu pensamento fica nele, se ele ficar mais dias por lá, vou perder ele”, desabafa o pai, que é motorista e o único da casa com renda. Ele quem sustenta o filho desde a morte da esposa, em 2015.

    Um tio próximo de Adriano não resistiu. Solteiro e vizinho do irmão e do sobrinho, ele era presente na vida do garoto. Ao vê-lo na cadeia e sem condições adequadas de vida, o estresse o consumiu. “O médico perguntou se ele passou muita raiva, ele era muito apegado ao meu filho. Nasceu perto dele, foi criado perto e ele era sozinho. Era a companhia dele, eu perdi até meu cunhado por esse motivo”, explica Gilberto.

    Segundo o pai, a Pastoral Carcerária, grupo religioso que atua nos presídios do Brasil, tem o ajudado nas visitas ao filho. “O Adriano fica olhando, no canto dele. Como fazem uma coisa dessa? Ele ficou horrorizado. É interditado judicialmente e esse caso foi há 18 anos, não agora”, diz.

    De acordo com o ITTC (Instituto Terra, Trabalho e Cidadania), o que fizeram com Adriano viola a Lei de Execução Penal e a Constituição Federal. “A falta de estabelecimento adequado, isto é, vaga no Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico de referência deveria ser motivo suficiente para o poder judiciário lhe reconhecer o direito de estar em prisão domiciliar, para assim poder estar próximo a seu pai. Para além disso, a situação de extrema vulnerabilidade de Adriano e todo o contexto nos obriga a pensar que nenhuma restrição de liberdade, em prisão ou hospital de custódia, deveria ser aplicada para ele especialmente em vista do tempo que decorreu desde a aplicação da medida de segurança. Essa situação nos obriga a refletir a respeito das violações e da problemática que é a justiça criminal julgar e decidir também questões de saúde mental”, escreveu o órgão, quando consultado pela Ponte.

    Outro lado

    Questionada pela reportagem, a SAP (Secretaria da Administração Penitenciária), explicou que “a permanência em Ala Especial do CDP III de Pinheiros não é irregular”. “O local é concebido como um centro de triagem de todos os pacientes portadores de doenças mentais em conflito com a lei de Estado de São Paulo, onde recebem os atendimentos iniciais médicos e de saúde mental necessários para o encaminhamento ao Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico, conforme o perfil da doença metal”, explicou a pasta.

    Segundo a SAP, Adriano está sendo “regularmente assistido pela equipe de saúde atuante no estabelecimento prisional, a fim de lhe prover toda a assistência médica, até posterior remoção para o Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico e, ainda, está com a integridade física e moral inteiramente preservada”, apontou.

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