Pará, um estado atravessado por chacinas, milícias e a violência como solução

    Chacina do Guamá, ocorrida em 19 de maio, deixou 11 mortos e quatro suspeitos de terem participado da matança são PMs; CPI da Assembleia Legislativa, em 2014, apontava que ‘milícias no estado são um fenômeno policial militar’

    Familiares de vítimas protestam em frente ao bar onde aconteceu chacina que deixou 11 mortos | Foto: Fabrício Rocha

    Onze pessoas assassinadas em uma ação que durou cerca de dois minutos. A maior chacina em único local registrada na Região Metropolitana de Belém ocorreu em um domingo (19/5), na passagem Jambu, no bairro do Guamá. O episódio reascendeu o debate sobre a política de segurança pública adotada no Estado do Pará, atualmente sob comando do governador Hélder Barbalho, do MDB (Movimento Democrático Brasileiro), que no Pará é coligado com o PSL de Jair Bolsonaro.

    Como ocorreu no restante do país, a pauta da violência foi uma das principais vencedoras do pleito de 2018. Não por acaso, a chamada “bancada da bala” aumentou quase três vezes de tamanho no Congresso. Um de seus mais ferrenhos integrantes é o ex-delegado e deputado federal paraense Éder Mauro (PSD), que em 2017, após a chacina de Pau D’Arco, que deixou 10 trabalhadores mortos, defendeu a ação policial e chegou a agredir o deputado Carlos Bordalo, que atualmente preside a Comissão de Direitos Humanos da ALEPA (Assembleia Legislativa do Pará), de acordo com reportagem do De Olho nos Ruralistas.

    Pau D’Arco até o dia 19 de maio deste ano era a maior chacina desde Eldorado dos Carajás, com 19 mortes. Agora, o posto de segundo maior massacre, esse no asfalto, é a Chacina do Guamá, com 11 mortes. Em reportagem do ano passado feita pela Ponte, mostramos como o Pará se tornou um local de constantes massacres, com atuação de milícias e, no caso de Belém, com a forte disputa territorial pelo crime organizado.

    O “Atlas da Violência 2018 – Políticas Públicas e Retratos dos Municípios Brasileiros”, do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), apontou Belém como a capital mais violenta do país, com 77 homicídios por 100 mil habitantes. O Pará possuía cinco cidades entre as 20 mais violentas: Altamira (91,9), Marabá (87,7), Ananindeua (84,6), Marituba (84,5) e Castanhal (78,4). Altamira e Marabá, ambas na região sudeste do estado, são locais atravessados por conflitos de terra, conforme mostrou reportagem da Ponte. Entre 1985 e 2017, 21 pessoas foram mortas por ano no Pará em disputas de terra.

    Protesto realizado no Guamá depois de chacina com 11 mortes | Foto: Fabricio Rocha

    Horas depois de Hélder Barbalho tomar posse como governador, em 1º de janeiro deste ano, cinco pessoas foram mortas no bairro da Cabanagem em um intervalo de 20 minutos. Todos os crimes aconteceram com as mesmas características: homens encapuzados chegaram de carro e executaram as vítimas. A ação pode ter sido uma resposta à morte do cabo da Polícia Militar do Pará Davi Ortega, executado no dia 31 de dezembro de 2018, no bairro Parque Verde, vizinho do local onde ocorreu a primeira chacina do ano. O PM fazia parte de um programa de proteção por ter escapado de uma primeira tentativa de assassinato. Em maio do ano passado, mais de 60 pessoas foram assassinadas depois da morte da PM Maria de Fátima Cardoso.

    Em 2 de janeiro deste ano, durante reunião com a cúpula de segurança pública, Barbalho disse que iria combater grupos milicianos. “Não é possível que continuemos a conviver com esta cultura do temor de carro prata, preto, milícia, tráfico e o Estado não agir em favor da sociedade e agir com pulso forte, pulso firme”. O discurso, também repetido pelo secretário da SEGUP (Segurança Pública e Defesa Social) do Pará, Uálame Machado, é de que os bons agentes serão condecorados e os envolvidos com crimes, punidos severamente.

    A CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) instaurada na ALEPA no final de 2014, que investigou a existência de milícias e grupos de extermínio no estado, concluiu que as chacinas, as execuções e as milícias têm uma relação intrínseca. O relatório expôs que “as milícias no Pará são um fenômeno essencialmente policial militar” e  que essa condição de agentes públicos atrai suporte de parte de seus pares, mesmo que omissivamente, por causa do “respeito que esses policiais tem na tropa, do agenciamento de bicos, do receio de serem mortos por se oporem ao crime e da cultura da resposta contra a morte de policiais”.

    O relatório acima citado mostra ainda que esses grupos criminosos têm poder político e se financiam com uma série de atividades ilegais que vão de mortes por encomenda, roubos de carga, à venda de segurança para comerciantes, traficantes. A investigação também constatou que à época ao menos três milícias mais estruturadas atuavam na Região Metropolitana, uma em Marabá, outra em Igarapé-Mirim, comandada por um civil e ex-prefeito da cidade conhecido como “Pé de Boto”. Apesar dos indícios, o fato da CPI ter ocorrido no final do mandato parlamentar impediu que grupos de extermínio presentes nas cidades Igarapé-Açu, Tomé-Açu, Paragominas fossem melhor investigados. Estes setores que atuam no campo têm forte relação com fazendeiros e uma de suas principais atividades é a perseguição contra trabalhadores rurais.

    O deputado estadual Carlos Bordalo (PT), relator da CPI das Milícias da ALEPA, aponta que o governo atual tem intenção de combater os grupos criminosos. “As chacinas anteriores se deram nos marcos da omissão do Estado regular. Cometia-se crime e não se investigava ou prendia culpados. Nos últimos oito anos tivemos oito chacinas e nenhuma foi investigada a fundo. Agora o governador disse que não vai tolerar desvios de conduta na corporação e já desmantelou ao menos quatro milícias só esse ano”, declarou à Ponte.

    De acordo com a SEGUP, em 2019, 13 PMs e seis policiais civis foram presos. Em 2017, esse número foi de 92 policiais militares e 23 policiais civis. E que em 2018 houve a prisão de 32 PMs e 17 policiais civis. A reportagem questionou se as prisões tinham relação direta com atividade de milícias, mas a pasta não especificou qual o tipo de desvio de conduta dos agentes.

    Secretário Uálame Machado concede coletiva sobre a prisão de Cabo PM Heleno Arnaud Carmo de Lima, conhecido como Cabo Leno, acusado de participação em uma série de homicídios que ocorreram na Região Metropolitana de Belém em janeiro de 2017 | Foto: Elielson Modesto/ASCOM SEGUP

    Levantamento feito pela nossa reportagem a partir de notas públicas da Secretaria de Segurança e notícias na imprensa, identificou ao menos quatro operações contra milícias envolvendo policiais neste ano: a prisão do cabo Heleno Arnaud Carmo de Lima em 30 de janeiro, de acordo com o Diário Online. Ele é acusado de chefiar a “Milícia da Pedreira” e de participar ativamente da chacina que matou 28 pessoas na Região Metropolitana de Belém em 2017; a operação Anonymus que fez buscas e apreensões no quartel do 5º Batalhão da PM, em Castanhal, e prendeu, ao todo, nove PMs; a operação “Ronda Noturna”, que, que segundo o Diário Online, terminou com três policiais militares e um motorista sem ligação com as polícias presos. Eles são acusados de fazer parte de uma milícia que atuava nas cidades de Marituba, Ananindeua e Benevides sobre a fachada de uma empresa de vigilância particular e a prisão deles aconteceu seis dias antes da chacina; e a operação Kratos deflagrada para prender os acusados de cometerem a chacina do Guamá em maio de 2019. Quatro PMs e quatro civis estão presos preventivamente.

    Uma quinta operação promovida pelo DECA (Departamento de Conflitos Agrários) da Polícia Civil, realizada em 17 de janeiro na cidade de Marabá, sudeste do Pará, não prendeu policiais militares, mas sim três pecuaristas da região acusados pela CPT (Comissão Pastoral da Terra) de integrarem “a maior milícia armada com atuação no campo na região a serviço dos fazendeiros”, diz trecho da nota assinada em conjunto com o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e outras entidades. Fazendeiros articulados pelo Prorural (Sindicatos dos Produtores Rurais de Marabá) protestaram contra as prisões em 24 de janeiro ocupando uma área em frente à sede do poder judiciário local. Segundo portal da CPT, os ruralistas cobravam que Helder Barbalho impedisse ocupações de terra. Para o presidente Jair Bolsonaro, o grupo também fez uma cobrança: a liberação da posse e porte de armas.

    Policiamento e repressão nas ruas

    Como uma resposta à real sensação de insegurança, no dia 22 de março, a administração trouxe ao estado, em parceria com o governo federal, 200 membros da Força Nacional para atuarem em sete bairros identificados como os mais críticos. O resultado perceptível desse movimento foi um aumento do policiamento cotidiano em pontos chaves da região metropolitana. Segundo a Segup, o efetivo de viaturas nas ruas foi aumentado em 50% com relação ao período anterior e ganhou o reforço de 500 agentes. No entanto, para o geógrafo e pesquisador de segurança pública Aiala Colares, a medida acaba sendo mais propagandística e não tendo efetividade no combate estrutural à criminalidade.

    Chegada da Força nacional em Belém | Fotos Fernando Araújo/Agencia Pará

    “No governo anterior a violência se intensificou de tal forma que criou uma real sensação de insegurança na população. Vários candidatos levantaram essa bandeira: deputados, governadores, presidentes. É óbvio que o governador tem que dar essa resposta e garantir a segurança do cidadão. Neste momento, a presença da Força Nacional só reproduz o que já se vinha fazendo, acaba sendo mais midiática do que prática. Até porque eles não conhecem os territórios, não conhecem os bairros. Eles ficam muito mais vagando do que indo aos pontos certos. O trabalho que eles fazem, a Polícia Militar poderia estar fazendo”, pondera.

    Outro ponto de crítica do pesquisador é o foco da estratégia na segurança pública, que foca apenas no conceito de repressão, desconsiderando aspectos sociais e dinâmicas territoriais. “É insuficiente [a repressão para reduzir índices de criminalidade]. Tem que ter a prevenção que se dá com políticas pública de incentivo artístico-culturais, educação, saneamento básico, infraestrutura, iluminação pública. São essas ações de Estado que conseguem dar qualidade de vida e isso acaba inibindo o desenvolvimento do crime. A política do governo tá muito mais para a repressão do que para a prevenção”, analisa.

    Valorizando sua política repressiva, o Governo do Pará tem propagandeado uma diminuição dos índices de criminalidade nos primeiros meses de 2019. Segundo a Segup, houve redução de 40% dos homicídios na primeira quinzena de abril deste ano na comparação com o mesmo período do ano passado. A redução, no entanto, não é exclusividade do Pará e tem se mostrado tendência em vários estados do Brasil, como mostrou reportagem do G1. O Ceará, por exemplo, teve redução de 57% nos homicídios no primeiro trimestre do ano. Contudo, a letalidade policial não seguiu a mesma tendência, conforme apontou reportagem da Ponte.

    O discurso oficial é questionado pelos fatos, segundo o jornalista e membro do movimento “Guamá Pede Paz” Raphael Castro. “Apesar dos números apresentados pela cúpula de segurança mostrarem uma diminuição irrisória no índice de crimes, o que sentimos é um aumento destes nas periferias. Essa política de repressão é centrada no tráfico de drogas e, com isso, todo mundo na periferia acaba virando um potencial criminoso; é focada em abordar jovens nas ruas que eles suspeitam que tem ligação com o tráfico. Essa guerra, mirada na periferia, não é contra os grandes traficantes que continuam lucrando muito, é contra a população. E isso tem gerado mais violência”, avalia.

    Protesto realizado no dia 26 de maio, uma semana depois da chacina, em frente ao bar onde ocorreram as mortes | Foto: Fabricio Rocha

    Raphael é parte da comissão de moradores que se formou após a chacina do dia 19 de maio e que organizou uma passeata pelas ruas do bairro do Guamá uma semana após as execuções. O movimento quer ser ouvido pelo Governo e influenciar a política de segurança pública para o local.

    “Essa articulação é uma resposta mais organizada à onda de violência que vem assolando o Estado, mas não é a primeira. Desde o início do ano temos visto manifestações espontâneas da população diante de homicídios e prisões arbitrárias no bairro da Pedreira, Terra Firme. Queremos construir uma audiência pública com o governo para denunciar a nossa situação e expor o que achamos que deve ser feito de políticas sociais, porque só mais polícia na rua não acaba com o crime”, opina.

    O deputado estadual Carlos Bordalo (PT), atual presidente da comissão de Direitos Humanos da ALEPA, acredita que há uma mudança positiva de postura do executivo estadual na política de combate ao crime. “Se o governador perder essa batalha o Pará vai viver um clima de barbárie generalizado. Se ganhar, temos uma chance. Mas para ganhar, ele precisa do apoio social e institucional, precisa de recursos e foco de prioridade. Não pode parar o sufocamento dos criminosos com repressão republicana e democrática, que é prevista na constituição, respeitando a declaração universal de direitos humanos e o código civil e tem que entrar na segunda etapa, que vai iniciar daqui a pouco que são vitais, os ‘Territórios pela Paz’, tendo a ousadia de oferecer oportunidades para a população, de enfrentar o enorme passivo social que temos com o povo”.

    Territórios pela Paz

    O programa “Territórios pela Paz” (TerPaz) é uma iniciativa que deve ser lançada em breve em sete bairros da Região Metropolitana de Belém, também chamada de RMB, identificados como os mais críticos: Guamá, Jurunas, Terra Firme, Benguí e Cabanagem (Belém), Icuí (Ananindeua) e Nova União (Marituba).

    Segundo o governo, a ideia “alia ações de políticas de segurança com projetos de cidadania, buscando atingir as causas que levam à violência nestes territórios. Ao todo, serão 82 ações de políticas públicas com inclusão social a serem desenvolvidas por 27 áreas do governo, impactando algo em torno de 370 mil pessoas”. O projeto deve iniciar em junho e se estender pelos próximos quatro anos. A reportagem da Ponte pediu entrevista com o secretário extraordinário de estado de articulação da cidadania, Ricardo Balestreri, para saber mais detalhes do projeto, mas a assessoria de comunicação do secretário informou que detalhes serão repassados em uma coletiva de imprensa ainda sem data definida.

    Em declaração para o portal da ALEPA, durante sessão especial na casa que debateu o programa, Júlio Alejandro Jeovez, representante da Secretaria de Articulação da Cidadania do Governo Estadual, e um dos principais organizadores do TerPaz, disse que o programa seria espelhado em outros exemplos nacionais e internacionais. “Esse modelo tem como base a Unidade de Polícia Pacificadora do Rio de Janeiro, as chamadas UPP’S, e o projeto aplicado na cidade de Medellín, na Colômbia, que venceu a criminalidade na década de 90. Tenho experiência há 30 anos com projetos dessa natureza e com empenho de todos, é possível mudar essa realidade aqui no Pará”, decretou.

    A antropóloga do departamento de segurança pública da UFF (Universidade Federal Fluminense), Jacqueline Muniz, pesquisadora das UPPs no Rio de Janeiro, explicou como o projeto de polícia pacificadora tinha um objetivo que e, em pouco tempo, ruiu.

    “A proposta [do TerPaz] é promissora, porém só com o plano e seu detalhamento em ações, orçamento, cronograma de execução, monitoramento e avaliação se poderá fazer uma apreciação mais fina. As UPPs tinham um bom propósito inicial mas pela sua implementação equivocada resultou no fracasso atual. Isso ocorreu porque, centralmente, foi feito um uso político-partidário do projeto para fins eleitorais. Houve uma sabotagem interna no governo, com atuação de agentes de segurança pública, deputados, pois o programa atacava os lucros do crime – tráfico e milícias -; e uma redefinição territorial dos grupos criminosos, com avanço das milícias que hoje controlam de 25% a 40% de todo o território do Rio de Janeiro”, pontua.

    “Aconteceram também problemas de concepção, pois o programa deveria ser para uma etapa e não permanente, e acabou ficando restrito à Polícia Militar, faltando a inteligência da Polícia Civil, a ajuda dos Bombeiros, da Guarda Municipal, das subprefeituras, ou seja, uma verdadeira integração dos órgãos de segurança pública. Essa concentração na PM mobilizou cerca de 30% dos recursos da instituição para o projeto, prejudicando o policiamento ostensivo e criando uma situação real de insegurança”, analisa Muniz.

    Inciativas como essas já aplicadas em outros estados como o Pacto pela Paz, em Pernambuco, e o Ronda do Quarteirão, no Ceará, fracassaram por motivos muito semelhantes.

    Para a pesquisadora, é preciso ouvir a população e entender as especificidades de cada local para compreender qual política serve ou não. “Ações sociais são pontuais, não revertem o problema do crime. Para atacar a criminalidade são necessários programas sociais de combate à violência focalizados nos territórios, com estudos que verifiquem os problemas e os grupos vulneráveis de cada local e que, ouvindo também as comunidades, possam pensar políticas públicas específicas”.

    A PM quer um basta: 21 profissionais mortos em 2019

    Outra frente importante indicada pela CPI das Milícias, concluída em 2015, foi a valorização dos profissionais da Polícia Militar, especialmente os praças, ou seja, os que atuam na linha de frente do combate ao crime. Até o fechamento desta reportagem, 21 policiais militares haviam sido assassinados no Pará em 2019. Pela vida desses profissionais e por melhores condições de trabalho no dia a dia que esposas de PMs realizaram um protesto impedindo a saída de viaturas no 2° Batalhão da Polícia Militar, em Belém. O protesto iniciou na segunda-feira (27/5) e se estende até pelo menos está quarta-feira (5/6). Na quinta-feira passada (30/5), mais um Batalhão foi ocupado, dessa vez em Ananindeua. Em Castanhal as esposas protestaram para exigir negociação com o governador Helder Barbalho.

    As familiares dos policiais militares reivindicam uma série de pontos, entre eles auxílio social emergencial para que os PMs e suas famílias possam sair das periferias, medidas de proteção para os agentes ameaçados de morte, construção de moradia, reajuste salarial, entre outras.

    Zarah Martinho, advogada e membro da comissão da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de apoio às famílias dos agentes de segurança pública vítimas da violência urbana, relata a difícil situação dos policiais da base da corporação.

    “A maioria deles mora na periferia e vem sofrendo muitas ameaças. No sábado (25/5) uma policial militar foi expulsa do bairro do Benguí pelos traficantes. Os colegas fizeram coleta para pagar a mudança dela. Tem um outro policial que mudou 24 vezes em dois anos. A ameaça de morte é constante. A principal reivindicação é mesmo moradia. Governo apresentou uma proposta, um crédito imobiliário, mas tem dois problemas: é uma proposta a longo prazo, pois o Banpará (Banco do Estado do Pará) disse que só em dezembro talvez consiga liberar esse tipo de financiamento e outro é que os policiais já estão todos endividados”, garante.

    Cabo Passinho, coordenador da ADMIPA (Associação em Defesa dos Policiais Militares do Pará), explica que os protestos são um pedido de socorro. “Estamos com salários congelados há cinco anos. Moramos em área de risco porque somos humildes. A mobilização dessas mulheres é porque estão vendo seus maridos assassinados, estão sendo expulsos de casa e nada está sendo feito”, explica.

    O deputado Bordalo, após colher mais de 70 depoimentos de policiais militares durante a CPI das Milícias, também cobra uma maior valorização dos servidores. “Hoje eles moram ao lado dos traficantes, precisam ter moradias dignas para suas famílias se sentirem protegidas. Esses policiais precisam ter sua autoestima elevada, com aumentos salariais, melhores condições de trabalho”.

    A advogada que acompanha as famílias dos policiais vítimas de violência aponta que os baixos salários e da falta de segurança podem levar o policial para atividades ilegais. “O salário em média de um praça é de R$ 2 a R$ 3 mil, às vezes tem que sustentar até duas famílias. Muitos acabam fazendo bicos de segurança privada. Outro problema que acaba levando o policial à milícia é a insegurança. O Estado não oferece a segurança e a milícia de certa forma acaba oferecendo isso pra eles”, reflete.

    O relatório da CPI das Milícias identificou que os “bicos transformaram-se em estratégia de sobrevivência para policiais mal remunerados, aproximando os mesmos da criminalidade e são tão nocivos aos valores policiais quanto a exposição dos agentes de segurança pública em razão de sua moradia em áreas de risco. Este descontrole da segurança privada ilegal também foi observada no Rio de janeiro como uma das causas de milícias”.

    Em nota à reportagem da Ponte, a Segup afirmou que por trabalhar com o orçamento de 2018, não estão previstos reajustes salariais para os policiais. “A valorização da remuneração dos agentes deverá ocorrer no segundo semestre, após o período de crescimento da arrecadação fiscal”, diz trecho da resposta governamental.

    Sobre outras políticas para os servidores, o Governo do Pará promete uma linha de crédito com juros mais atrativos pelo Banpará para que policiais possam comprar casas já prontas, e também a construção de conjuntos habitacionais na Região Metropolitana de Belém, Marabá e Santarém.

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