Vídeo gravado por uma das vítimas flagrou as palavras do policial militar, que invadiu residência de casal dizendo, ainda, que forjaria flagrante de tráfico de drogas
Um policial militar de Bauru, no interior de São Paulo, foi flagrado ameaçando de morte um homem de 28 anos dentro da casa da vítima, que é trabalhador autônomo. O caso aconteceu na última terça-feira (27/12) após uma discussão por causa de um carrinho de supermercado. A ameaça foi gravada pela esposa do rapaz, uma professora de 26 anos. As identidades das vítimas serão preservadas pela reportagem da Ponte Jornalismo.
De acordo com a Polícia Civil, o casal foi à delegacia registrar Boletim de Ocorrência contra o PM, que é vizinho, com medo de sofrer represália. Isso porque o policial militar afirmou que “se eventualmente as imagens da ação viessem a público, iria matá-los e para ele não iria dar nada”.
Segundo a denúncia do casal, ao colocarem o carrinho do mercado Barracão num terreno em frente à casa do policial, por volta das 2 horas de segunda-feira (26), os dois foram parados pelo PM dizendo que não podiam deixar o carrinho no local. Quando perguntado sobre o motivo, o policial teria respondido que “porque ele estava mandando”. Ele não estava fardado no momento.
Após a discussão, o casal afirmou que não iria retirar o carrinho do terreno. O policial, então, entrou em uma caminhonete e disse que aquilo “não iria ficar assim e que iria cobrar”.
Por volta das 14 horas do dia 27, uma viatura parou na frente da casa dos dois. O PM identificado como Andrade abriu a porta empurrando o trabalhador autônomo. A vítima recebeu ordem para que fosse para dentro da casa. Além de Andrade, outros dois policiais, identificados como Junior e Sabino, acompanharam o rapaz.
Sabino ficou no portão impedindo a entrada e saída de qualquer pessoa durante a ação policial dentro da residência do casal. De acordo com a Polícia Civil, os PMs permaneceram na casa por aproximadamente 40 minutos.
Sem reconhecer o policial, o autônomo perguntou o que estava acontecendo. Foi quando o PM respondeu: “sou seu vizinho. Fala agora que eu sou um policinha fardado”. A vítima negou que o tivesse chamado dessa maneira. O PM alegou que isso tinha sido dito pela esposa do rapaz, mas ela também negou.
Em seguida, a professora começou a filmar a ação, dizendo que os PMs invadiram sua casa sem mandado judicial. O policial Andrade passou a ameaçar o trabalhador autônomo, afirmando que iria forjar tráfico de drogas ou porte ilegal de armas contra ele. Ao perceber que a mulher filmava as ameaças, tentou tomar o celular de suas mãos. Quando o policial foi em direção à professora, o marido foi atrás. Nesse momento, foi golpeado por Andrade com um tapa na orelha.
Do lado de fora da casa, o policial Andrade afirmou ao autônomo que a família deveria se mudar ou que a vítima tinha de arrumar uma arma até às 2 horas de quarta-feira (28/12). Caso contrário, iria matá-los. A professora continuou filmando a ação. Enquanto tentavam convencer a mulher a lhes entregar o celular, os PMs lhe mostraram um pacote afirmando que havia drogas dentro e que prenderiam seu marido em flagrante caso ela não desligasse o aparelho.
A filha da professora, que presenciou o padrasto e a mãe sendo agredidos, está em estado de choque e não consegue se alimentar de maneira adequada desde o ocorrido.
Outro lado
A reportagem da Ponte Jornalismo solicitou uma posição da Secretaria da Segurança Pública (SSP), através de sua assessoria de imprensa, terceirizada pela empresa privada CDN Comunicação. Confira, abaixo, as perguntas enviadas ao secretário Mágino Alves Barbosa Filho, que está à frente da pasta nesta quarta gestão do governador Geraldo Alckmin (PSDB). A solicitação foi feita, por e-mail, na quarta-feira (28/12), às 22h28. Nela, a reportagem enviou o Boletim de Ocorrência do caso. No documento, havia toda a denúncia feita pelo casal na delegacia, incluindo o conteúdo da gravação feita pela professora.
1) Os PMs foram identificados?
2) Existe uma investigação sobre o caso? Onde e como está?
3) As vítimas terão proteção? Porque afirmaram que receberam ameaça de morte dos PMs, caso o vídeo seja divulgado.
4) Como o secretário analisa a postura do PM que afirma “ou você muda de casa ou eu vou te matar” a um vizinho?
5) O secretário tem interesse em conversar com a Ponte Jornalismo sobre o assunto?
6) Qual a opinião do comandante geral da Polícia Militar sobre o caso?
7) O comandante geral da Polícia Militar tem interesse de se pronunciar sobre o assunto?
Às 6h38 desta quinta-feira (29/12), a SSP solicitou à reportagem o vídeo. A Ponte enviou o vídeo à pasta às 13h49. Às 16h19, a Secretaria da Segurança Pública se posicionou com a seguinte nota:
“A SSP lamenta que o veículo tenha nos enviado o vídeo apenas no momento em que publicava a reportagem sem nosso posicionamento. Por várias vezes a assessoria de imprensa tentou contato com o jornalista, sem sucesso, para solicitar o envio das imagens, que propiciariam a adequada apuração dos fatos.
A Polícia Civil de Bauru informa que instaurou inquérito para investigar a ocorrência, registrada como ameaça e abuso de autoridade, na Central de Polícia Judiciária de Bauru. As vítimas foram ouvidas e as imagens estão sendo analisadas. A PM foi notificada e o comando local apura o caso com auxílio da Corregedoria.”