Abordagem da PM foi ilegal, segundo advogados que analisaram vídeo. Apreensão aconteceu na terça-feira e jovem só foi liberado na sexta, mas ainda passará por audiência
Um adolescente de 17 anos foi apreendido na Vila Santa Catarina, região do Jabaquara, zona sul de São Paulo, na terça-feira (18/8), por suspeita de ter cometido um roubo. Policiais militares, que aparecem em vídeo gravado por moradores e enviado à reportagem, o levaram à força e com truculência até a viatura.
A família (que não quis ser identificada) afirma, no entanto, que o menino estava, no momento do crime que está sendo acusado, em sua casa, cuidando de um sobrinho de 1 ano e 10 meses.
O adolescente foi levado para o 35º DP (Jabaquara) para averiguação. Chegando lá, a mãe disse que foi informada que a vítima do roubo teria reconhecido seu filho. O adolescente foi encaminhado para o CAI (Centro de Atendimento Inicial), da Fundação Casa, no Brás. Ele foi liberado nesta sexta-feira (21/8) e está em casa com a família. A audiência está marcada para a próxima segunda-feira (24/8).
A família disse que não conseguiu uma cópia do Boletim de Ocorrência. A reportagem entrou em contato com o 35º DP, mas o delegado titular do caso explicou que não poderia fornecer informações sobre o roubo por se tratar de uma ocorrência envolvendo um menor de idade.
Para a família, ele está sendo acusado de um crime que não cometeu. “Ele estava cuidando do meu sobrinho junto com meu filho de 10 anos. Eles estavam juntos. Quando minha irmã chegou do banco, ele permaneceu em casa. Quando foi umas 14h, ele foi até a casa da namorada para buscá-la e trazê-la para cá”, explica a mãe.
A tia do adolescente apreendido chegou a trocar mensagens via WhatsApp com ele. “Ele tá quieto?”, perguntou referente ao bebê. “Sim, mas tá chorando um pouco”, respondeu o garoto. As mensagens foram trocadas na terça-feira (18), entre 9h17 e 10h33. Às 10h43, ele a avisa que estava na frente de casa.
Ao chegar do banco, por volta das 13h30, a tia do garoto conta que ele ainda estava lá, e só saiu cerca de 30 minutos depois para ir à casa da namorada.
“Eu estava saindo de casa e ele me esperava do lado de fora”, narra a namorada do adolescente. “Estávamos indo para a casa dele. Foi na hora que os policiais abordaram ele, apontaram a arma e eu me distanciei. Aí, ele falou pra chamar a mãe dele. Eu fui, mas a mãe dele não tinha chegado ainda do serviço. Aí eu chamei a tia dele. Aí ela deu o RG dele para os PMs. Os policiais agrediram ele. Os vizinhos ficaram apavorados. Aí levaram ele para averiguação”, explica a garota. Nesse momento, como mostra o vídeo, o adolescente é colocado dentro da viatura, à força e com truculência, por três PMs da Rocam.
Apreensão Ilegal
Ao analisar as imagens e o contexto do caso, o grupo de advogados da Rede de Proteção e Resistência ao Genocídio disse que adolescentes não podem ser levados em camburões, conforme determina o artigo 178 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
De acordo com o artigo, “o adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional não poderá ser conduzido ou transportado em compartimento fechado de veículo policial, em condições atentatórias à sua dignidade, ou que impliquem risco à sua integridade física ou mental, sob pena de responsabilidade.”
Integrante da Rede, o advogado criminalista Augusto Luiz de Aragão Pessin detalhou que a liberdade de uma pessoa só pode ser restringida em caso de “flagrante de um delito”. “Em outras palavras, somente se ela está cometendo, acaba de cometer ou acaba sendo presa logo depois com objetos que tornem evidentes e que provem a prática de um crime. Mas não é o que acontece neste caso.”
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo confirmou que o adolescente foi apreendido no dia 18 de agosto, na parte da tarde, por ato infracional de roubo, na rua Vitoriana, no Jabaquara. No entanto, não informou o horário que esse roubo foi efetuado. A SSP disse que o garoto foi abordado na via por policiais militares e “ofereceu resistência, agredindo um dos agentes”.
“Ele foi apresentado ao 35º DP, onde foi reconhecido pessoalmente pelas duas vítimas, um autônomo de 31 anos e uma contabilista de 52 anos. O menor prestou depoimento acompanhado de sua mãe e a ocorrência foi encaminhada à Vara da Infância e Juventude”, concluiu.
