Casos ocorreram em Terra Nova e Cachoeira, no interior. Entre os mortos, está um jovem de 18 anos. Especialista diz que é preciso revisar os protocolos da polícia, sob a gestão do governador Jerônimo Rodrigues (PT)

A Polícia Militar da Bahia (PM-BA), comandada pelo governador Jerônimo Rodrigues (PT), promoveu duas ações na última segunda-feira (17/3) que resultaram na morte de nove pessoas. Um dos mortos tinha 18 anos. Os casos ocorreram nos municípios de Terra Nova e Cachoeira, distantes 80 e 110 quilômetros de Salvador, respectivamente. Para especialista ouvido pela Ponte, existe no estado hoje uma “política pública para distribuição de mortes”.
Dudu Ribeiro, co-fundador e diretor executivo da Iniciativa Negra, diz que é urgente o fortalecimento do controle externo da polícia. Ele defende que o Ministério Público tem que ser cobrado, mas é necessário que os protocolos policiais sejam revistos. Outro ponto é que a participação da sociedade civil no controle da atividade da segurança pública também deve ser respeitada e incentivada.
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“Nós estamos falando da polícia mais letal do Brasil e estamos falando do Estado mais negro do Brasil. Isso não é uma coincidência”, afirma Dudu. “Nós estamos dizendo que existe uma política de morte, uma política pública de distribuição de morte a partir da orientação do Estado. E isso é talvez o problema mais grave do que nós chamamos de democracia no Brasil.”
Um levantamento feito pelo g1 mapeou 50 mortes cometidas por policiais na Bahia até terça-feira (18/3). A maioria dos casos ocorreu em Salvador. O Instituto Fogo Cruzado divulgou que a capital e a região metropolitana chegaram em março à 100ª chacina em três anos.
Seis mortos em Terra Nova
Em Terra Nova, policiais da 97ª Companhia Independente da Polícia Militar (CIPM) foram responsáveis pelas mortes de Everton Ferreira da Cruz, Eric Celestino Gama, Jackson Araújo de Deus, Fabricio Silva Rocha e outras duas pessoas que não foram identificadas. As idades das vítimas também não foram divulgadas.
Em nota enviada à Ponte, a Polícia Militar informou que os agentes apuravam uma denúncia de tráfico de drogas e de expulsão de moradores da região. O crime ocorreu no bairro Caipe.
A PM afirmou ainda que, quando chegaram ao local, os agentes teriam encontrado 15 homens correndo para uma mata. O grupo teria atirado contra os policiais, que revidaram. Com o fim dos tiros, seis homens foram encontrados feridos e encaminhados ao Hospital Municipal de Terra Nova. Nenhum deles resistiu.
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A assessoria da Polícia Militar diz que o caso foi registrado na delegacia da região. Foram apreendidos, segundo a PM, uma pistola calibre 9mm com seletor de rajada, uma pistola calibre 380, três revólveres calibre 38, uma espingarda calibre 28, várias munições das armas mencionadas e drogas — não foi informada a quantidade.
A Ponte questionou se armas dos policiais foram apreendidas para perícia e se o grupo será alvo de um Inquérito Policial Militar (IPM). Não houve retorno. O caso foi registrado como morte decorrente de intervenção policial na Delegacia Territorial de Terra Nova.
Segundo o portal Bahia Notícias, as aulas nas escolas e o atendimento de saúde chegaram a ser suspensos no município na terça-feira (18/3). A Câmara de Vereadores remarcou a sessão que ocorreria nesta quarta-feira (19/3). Em nota divulgada pelo site, o presidente da câmara, vereador Marcos Antônio dos Santos Silva (SD), prestou solidariedade à família das vítimas.
“Em respeito aos recentes acontecimentos que vêm abalando nossa comunidade, a Câmara Municipal de Terra Nova manifesta solidariedade às famílias enlutadas. Reconhecemos a profundidade da dor enfrentada e estendemos nossas sinceras condolências”, escreveu.
PM mata jovem de 18 anos
Em Cachoeira, policiais da 20ª CIPM mataram Jocimar de Souza de Jesus, de 18 anos, José Machado Júnior, 23, e Ueverton de Jesus Souza, 26. A versão da polícia é que, durante um patrulhamento em uma localidade conhecida como Tabuleiro da Vitória, na zona rural do município, os agentes se depararam com quatro homens armados dentro de um carro.
O quarteto teria atirado contra os policiais, que revidaram. Após a troca de tiros, três deles foram encontrados feridos e encaminhados ao Hospital da Cachoeira, mas não resistiram. Assim como na ocorrência em Terra Nova, nenhum policial ficou ferido. O quarto suspeito teria fugido.
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Com os mortos, a polícia diz ter apreendido R$ 11,20 em moedas e R$ 41 em cédulas. Também foram apreendidas duas submetralhadoras, um revólver 38, 142 pinos de cocaína e uma porção da droga, uma porção de crack, uma caderneta de anotações, uma balança digital, 91 embalagens para o acondicionamento de entorpecentes, munições de calibres 9mm, .40 e 38 e um carro.
O que dizem as autoridades
A Ponte procurou a Secretaria da Segurança Pública do Estado da Bahia (SSP-BA) e as assessorias das polícias Civil e Militar. Foi questionado o motivo das operações, quantos policiais participaram de cada uma, se as armas dos policiais envolvidos foram apreendidas e se um Inquérito Policial Militar foi instaurado. Não houve retorno sobre os pontos questionados até a publicação da reportagem.
Em nota, a SSP-BA disse que ampliou as ações de combate às facções, resultando em aumento no número de armas apreendidas. A pasta também diz que houve redução nas mortes violentas no Estado nos primeiros meses deste ano.
Leia a íntegra da nota da SSP-BA
A Secretaria da Segurança Pública destaca que as ações de combate às facções foram ampliadas em 2025, resultando no aumento de 19% do número de armas apreendidas em todo o estado. Em pouco mais de 60 dias, as Forças Policiais retiraram das ruas cerca de 1.000 armas de fogo, entre elas 9 fuzis. Acrescenta ainda os investimentos em tecnologia e softwares para as equipes da Inteligência, buscando sempre atuar na proteção da população. Por fim, a SSP ressalta que de janeiro a março, as ações preventivas e de repressão, culminaram na redução de 6,5% das mortes violentas na Bahia.