PM é condenado por três assassinatos dos Crimes de Maio

     

    Em decisão histórica, o PM Alexandre Pereira da Silva foi condenado pelo assassinato de três rapazes durante os chamados Crimes de Maio

    [Best_Wordpress_Gallery gallery_type=”image_browser” theme_id=”1″ gallery_id=”13″ sort_by=”order” order_by=”asc” show_search_box=”0″ search_box_width=”180″ image_browser_width=”800″ image_browser_title_enable=”0″ image_browser_description_enable=”0″ thumb_click_action=”undefined” thumb_link_target=”undefined” popup_fullscreen=”0″ popup_autoplay=”1″ popup_width=”800″ popup_height=”500″ popup_effect=”fade” popup_interval=”5″ popup_enable_filmstrip=”1″ popup_filmstrip_height=”50″ popup_enable_ctrl_btn=”0″ popup_enable_fullscreen=”1″ popup_enable_info=”1″ popup_info_always_show=”0″ popup_enable_rate=”0″ popup_enable_comment=”1″ popup_hit_counter=”0″ popup_enable_facebook=”1″ popup_enable_twitter=”1″ popup_enable_google=”1″ popup_enable_pinterest=”0″ popup_enable_tumblr=”0″ watermark_type=”none” watermark_link=”http://web-dorado.com”]

     

    O cabo da Polícia Militar Alexandre André Pereira da Silva foi condenado pelo Tribunal do Júri nesta quinta-feira (10/7) pelo assassinato de Murilo de Moraes Ferreira, Felipe Vasti Santos de Oliveira e Marcelo Heyd Meres em um lava-rápido no Jardim Brasil, zona norte de São Paulo, em maio de 2006. Trata-se de decisão histórica.

    Pela primeira vez, um integrante da PM foi levado a julgamento, acusado de participar de extermínio de civis durante os chamados Crimes de Maio, ocorridos entre os dias 12 e 20 de maio de 2006. Nesse período, pelo menos 493 pessoas foram mortas pela PM como represália aos ataques do Primeiro Comando da Capital (PCC), que assassinou 43 agentes públicos.

    10478681_352457474904338_2039972525223327698_n
    Foto Guga Kastner

    Segundo estudo da ONG Justiça Global, que cruzou informações de órgãos policiais, Ouvidoria da Polícia, Ministério Público, Defensoria Pública, Judiciário e testemunhas, há “indícios do envolvimento de policiais fardados ou encapuzados em 122 execuções, ocorridas em supostos confrontos ou por ações de grupos de extermínio”.

    Pelos três homicídios no lava-rápido, praticados sem que as vítimas tivessem a mínima chance de defesa, o cabo André (este é o seu nome na corporação) foi sentenciado a 36 anos de prisão em regime fechado, além da perda do cargo público. Como cabe recurso, o réu saiu livre do fórum.

    A mãe do jovem Murilo, que completaria 28 anos nesta sexta-feira (11/07), Angela Maria Moraes Ferreira, comemorou a decisão, exausta: “Foram oito anos batalhando, mas eu consegui fazer justiça.”

    O caso só chegou a esse desfecho graças ao depoimento emocionado que um rapaz prestou no Tribunal. Apelidado de “Assurbanipal” com o propósito de proteger sua identidade e evitar retaliações, o jovem relatou as cenas de terror que tomaram conta do lava-rápido localizado na avenida Ramiz Galvão. Ele já havia contado a mesma história cinco vezes, em diferentes oportunidades, ao DHPP (Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa), da Polícia Civil, que investigou a chacina.

    Segundo ele, na noite do dia 16 de julho, entre seis e oito motocicletas (todas com dois ocupantes) passaram diante do lava-rápido, anunciando o ataque que viria. Em 30 segundos, voltaram. Foi um desespero. Os três mortos tentaram esconder-se dentro do estabelecimento, mas foram colhidos pelos tiros, disparados pelos matadores.

    O feirante Nuri Meriz caminhava de um lado para o outro no Instituto Médico-Legal, mas pouco falava. As palavras eram engolidas com as lágrimas. Nuri limitava-se a exibir a foto de seu filho no celular

    O pai de um dos mortos, morador da vizinhança, encontrou o filho que acabava de morrer, a cabeça aberta por um disparo, jogado em uma poça de sangue na entrada do lava-rápido. “Minha vida acabou ali.” Ele ainda acompanhou a remoção do corpo do filho para o Instituto Médico Legal. Um repórter o viu lá, naquela noite terrível, e registrou: “O feirante Nuri Meriz caminhava de um lado para o outro no Instituto Médico-Legal, mas pouco falava. As palavras eram engolidas com as lágrimas. Nuri limitava-se a exibir a foto de seu filho no celular, o também feirante Marcelo Heyd Meri”. Marcelo foi assassinado aos 21 anos.

    Três rapazes sobreviveram à chacina porque conseguiram se esconder. Um, no banheiro do lava-rápido; outro, dentro de um carro. “Assurbanipal” subiu no telhado.

    Foi dessa posição que “Assurbanipal” viu quando um dos matadores deixou seu rosto à mostra. Era o então soldado André (hoje promovido a cabo). Foi possível identificá-lo porque ele levantou o capacete para enxergar melhor, a fim de localizar os que estavam escondidos no local.

    Hoje com pouco mais de 40 anos de idade, o cabo André é um homem baixo e atarracado –1,65 metro de altura. Tem o rosto duro, olhar severo. Fala com voz gutural, quase inaudível –diz que é sequela de um tiro que recebeu em 2012, durante o horário de serviço. Sobre os assassinatos, é lacônico: “Não fiz isso. Não é do meu feitio fazer isso. Nunca fiz. Nunca precisei disso. Estou na PM há 25 anos para proteger, não para tirar vidas.”

    Mas não conseguiu convencer os jurados –quatro homens e três mulheres.

    O testemunho de “Assurbanipal” foi peça-chave na argumentação da promotora Cláudia Ferreira Mac Dowell. Trabalhador, sem antecedentes criminais, “Assurbanipal”, logo antes da chacina, acabara de concluir o ensino médio e sonhava prestar concurso para se tornar PM.

    “Por que, senão por sede de Justiça, essa pessoa colocaria a própria vida em risco? Ele teve de mudar de endereço, deixar uma vida para trás. É um herói”, disse a promotora. “As outras duas pessoas que poderiam ajudar a esclarecer esses crimes, porque estavam lá, preferiram dizer que nada viram, que nada sabem. Porque essa saída, é claro, é a mais fácil.”

    “Matavam para vingar as mortes de colegas”, promotora Claudia Mac Dowell

    A promotora apresentou aos jurados conversa mantida (via Orkut) entre dois policiais militares, dois dias depois da chacina. Nela, um PM reclama com outro: “S…, Chamei você para trincar lá no JB. Agora tá liberado! Vamos matar PCC. A polícia de verdade voltou.”

    Tanto o nome do PM que enviou a mensagem quanto o do destinatário dela são conhecidos e estão sob investigação. JB é abreviatura de Jardim Brasil, o local onde se localiza o lava-rápido.

    Segundo a promotora, a mensagem é uma confissão de que policiais militares tinham mesmo saído, durante aquele período sangrento, para o “revide”. “Matavam para vingar as mortes de colegas”.

    O advogado de defesa do PM, o estrelado Eugenio Carlo Balliano Malavasi (também defende Edinho, o filho do Pelé), partiu para o ataque, acusando “Assurbanipal” de mentir. Em prol dessa tese, sacou documentos com a escala de serviço das viaturas policiais, para provar que o soldado André nunca esteve no local do crime, nem nas proximidades.

    Para reforçar sua narrativa, chamou a cabo Patrícia Aparecida Ferreira dos Santos Souza, que confirmou o álibi, dizendo ter estado com o soldado André todo o tempo, naquela noite. Mas bem longe do local do crime.

    Foi essa versão dos fatos que predominou no CD (Conselho de Disciplina) instaurado dentro da PM para apurar as denúncias contra o soldado André. O CD decidiu por unanimidade que nada houve de irregular na conduta do PM.

    A promotoria desmontou a defesa. Mostrou outros documentos oficiais, entre os quais o Boletim de Ocorrência lavrado no 39º DP, que cita a viatura da então soldado Patrícia como tendo participado do “socorro” às vítimas (logo, esteve na cena do crime). Mesma versão, assinada por um soldado da própria PM, aparece no Boletim de Ocorrência Militar. “Quem está mentindo aqui?”, perguntou a promotora. E, gesto trágico, pôs-se a rasgar os xerox dos documentos que contrariavam a tese da defesa. “Eles querem que ignoremos isso… E isso… E isso…”

    Duas mães de vítimas da violência policial desabaram em lágrimas e soluços. Tiveram de se retirar da sala, para não atrapalhar o julgamento.

    O advogado de defesa gritava com os membros do conselho de sentença. “Jurados! Alto lá, senhores do júri! Alto lá, senhores do júri!” E mencionava a análise que os três integrantes militares do Conselho de Disciplina fizeram do testemunho de “Assurbanipal”: “Pelas regras da experiência, sabe-se que testemunhas que presenciam chacinas ficam com a vista obnubilada. E impossível guardar detalhes. Testemunhas de atos assim violentos tem as impressões diminuídas e por vezes divorciadas da realidade.”

    “Quando um PM aparece com o coturno sujo ou a farda em desalinho, sofre punições severas. Mas se o crime é sério, aí é outra história.”, defensora pública Maíra Coraci Diniz

    Mas também não colou. A assistente de acusação, defensora pública Maíra Coraci Diniz, interveio para mostrar como o testemunho de “Assurbanipal” era singular e corajoso. Citou três casos de testemunhas de chacinas cometidas no mesmo período que acabaram assassinadas. “Assurbanipal sabe que está arriscando a própria pele ao enfrentar esse tipo de assassino.”

    Por fim, a promotora citou os quatro julgamentos de policiais envolvidos no Massacre do Carandiru (1992), que resultaram na morte de 111 presos. “Quatro júris decidiram pela condenação de 73 policiais. E sabe qual foi o resultado das investigações feitas dentro da corporação militar? Decidiu-se pelo arquivamento, alegando que os direitos fundamentais dos policiais militares estavam sendo desrespeitados!”

    Por coincidência, o júri que condenou o cabo André foi presidido por Rodrigo Tellini de Aguirre Camargo, mesmo juiz que presidiu três dos quatro julgamentos do massacre do Carandiru.

    “Não se deixem levar pela emoção dos parentes”, Eugenio Carlo Balliano Malavasi, advogado de defesa

    “Quando um PM aparece com o coturno sujo ou a farda em desalinho, sofre punições severas. Mas se o crime é sério, aí é outra história. Um caso de violência sexual cometido por soldados contra duas mulheres, dentro de uma viatura, por exemplo, foi punido com 15 dias de detenção. E só”, citou a promotora.

    Como último apelo, o advogado de defesa repetiu a incoerência entre alguns documentos e o testemunho de “Assurbanipal” e pediu: “Não se deixem levar pela emoção dos parentes. Não me façam desacreditar da instituição do Tribunal do Júri”.

    Com a condenação, o grupo de mães e parentes de vítimas da violência policial de 2006, conhecido por “Mães de Maio” chorou e se abraçou, assim que o juiz declarou encerrados os trabalhos. “Isso foi só o começo. Vamos atrás de outras testemunhas. Vamos reabrir os casos arquivados. A Justiça pode ser feita. E será”, disse Débora Maria da Silva, coordenadora do grupo e mãe de Edson Rogério Silva dos Santos, morto aos 29 anos naquele maio que não tem fim.

    Já que Tamo junto até aqui…

    Que tal entrar de vez para o time da Ponte? Você sabe que o nosso trabalho incomoda muita gente. Não por acaso, somos vítimas constantes de ataques, que já até colocaram o nosso site fora do ar. Justamente por isso nunca fez tanto sentido pedir ajuda para quem tá junto, pra quem defende a Ponte e a luta por justiça: você.

    Com o Tamo Junto, você ajuda a manter a Ponte de pé com uma contribuição mensal ou anual. Também passa a participar ativamente do dia a dia do jornal, com acesso aos bastidores da nossa redação e matérias como a que você acabou de ler. Acesse: ponte.colabore.com/tamojunto.

    Todo jornalismo tem um lado. Ajude quem está do seu.

    Ajude
    2 Comentários
    Mais antigo
    Mais recente Mais votado
    Inline Feedbacks
    Ver todos os comentários
    trackback

    […] O cabo da Polícia Militar Alexandre André Pereira da Silva foi condenado pelo Tribunal do Júri nesta 5a feira (10) pelo assassinato de Murilo de Moraes Ferreira, Felipe Vasti Santos de Oliveira e Marcelo Heyd Meres em um lava-rápido no Jardim Brasil, zona norte de Sao Paulo, em maio de 2006. Trata-se de decisao histórica – Pela primeira vez, um integrante da PM foi levado a julgamento, acusado de participar de extermínio de civis durante os chamados Crimes de Maio, ocorridos entre os dias 12 e 20 de maio de 2006. Nesse período, pelo menos 493 pessoas foram mortas pela PM como represália aos ataques do Primeiro Comando da Capital (PCC), que assassinou 43 agentes públicos – siga lendo no ponte.org […]

    Miguel
    Miguel
    10 anos atrás

    Mães de Maio? E as mães dos policiais mortos? A diferença que muitos policiais mortos salvavam vidas e não tiravam vidas como muitos que foram mortos por eles, outro detalhe foram mortos só esse ano mais de 60 policiais e o revide vai acontecer cedo ou tarde, se vcs tem as “mães de maio” nós temos as mães de todos os meses, uma hora o revide desse ano e do ano passado ainda vai ocorrer.

    mais lidas