Funcionários afirmam que cabo Adriano Pereira pulou portão de acesso e ameaçou recepcionista com arma em punho na zona leste de SP
Um policial militar invadiu o Hospital Local de Sapopemba, conhecido como Sapopembinha, na zona leste da cidade de São Paulo, para saber o estado de saúde do pai internado com Covid-19.
O caso aconteceu no dia 16 de janeiro e, segundo funcionários, o cabo Adriano Ferreira Pereira, de 25 anos, da 1ª Cia do 21º Batalhão Metropolitano da PM, pulou o portão de acesso da unidade de saúde e os ameaçou com arma em punho para entrar no local sem autorização.
De acordo com o boletim de ocorrência, três porteiros e uma recepcionista que atuam no controle de acesso do hospital declararam que por volta das 17h55 Adriano apareceu pedindo informações sobre o quadro de saúde do pai e eles disseram que o contato poderia ser feito apenas por telefone, já que a unidade estava fechada ao público por causa da pandemia. Segundo eles, o cabo afirmou que ele não havia recebido ligação do hospital e “insatisfeito” com a orientação, pulou o portão de acesso e entrou na recepção.
Um dos porteiros afirmou que pediu a uma enfermeira que ligasse para a Polícia Militar, momento em que Adriano teria dito “aqui é 190 e vou entrar”. Um outro porteiro ligou para uma médica comparecer ao local e, quando uma recepcionista tentou impedir o cabo de entrar e tentou acionar a polícia, ela afirma que Adriano apontou uma arma para a sua cabeça enquanto ele tentava empurrar a porta de acesso à ala de clínica médica.
Uma enfermeira que ouviu a gritaria vinda do térreo do hospital e disse que encontrou Adriano nas escadas de acesso e que ele teria apresentado carteira funcional da corporação e seguido para a ala dos leitos. Ao ir atrás, afirma que o reencontrou “muito alterado, gritando que só sairia dali após ver o pai”. Ela disse que tentou acalmá-lo e esclarecê-lo sobre o boletim médico e que a atitude estava desrespeitando todos, inclusive pacientes, mas, de acordo com ela, Adriano teria dito novamente que era policial e que estava armado. A enfermeira saiu do local e tentou acionar a Polícia Militar.
Uma médica disse que também ouviu os gritos e que encontrou o cabo na sala de prescrição médica, tendo avisado a ele que não poderia acessar aquela zona por ser restrita a pacientes com Covid-19. Ela afirma que tentou transmitir o boletim médico do pai dele por meio do contato de familiares deixados na recepção do hospital, mas que não obteve êxito. Mesmo assim, Adriano teria apresentado novamente a carteira funcional e dito que tinha “autoridade para adotar aquela postura” e que estava armado. Sentido-se coagida, a médica declarou que tentou alertá-lo novamente sobre o isolamento, mas não foi atendida e que o cabo foi em direção ao leito do pai.
No leito onde estava o pai do policial, a enfermeira disse que pediu para que Adriano e retirasse. Segundo ele, o pai estava com mãos e pés amarradas na cama e que aquilo seria “maus tratos”. No corredor do segundo andar, foi abordado por dois guardas civis metropolitanos que foram acionados por um dos funcionários do hospital os quais chamaram policiais militares para conter a situação.
A médica ainda disse que o reencontrou no local e avisou que o pai dele estava “clinicamente estável, mas muito agitado”, o que levou à contenção física, já que “anteriormente foi feita a contenção química, mas não houve sucesso, tendo em vista que o paciente, além de estar com suspeita de Covid, possui Alzheimer, é idoso e apresentava quadro de delírio e risco de queda”.
Adriano alega que desde que o pai foi transferido do Hospital Vila Alpina para o Sapopemba, não teve notícias a respeito do paciente e que foi questionar o quadro de saúde. Na portaria, a recepcionista, segundo ele, teria confirmado seu telefone, mas não deu mais informações, momento em que disse que pularia o portão para “saber pessoalmente sobre a internação”. Sobre a ameaça com arma, disse que ao tentar acessar os leitos, foi “impedido por funcionários” e que “um deles de sexo masculino fez movimento de tentar puxar sua arma o qual estava de forma ‘velada’ na cintura, assim, a sacou mandando que saísse da frente”. Adriano afirma que quando chegou área onde foi abordado pelos guardas civis, a arma já estava guardada na cintura.
O cabo acabou preso em flagrante e indiciado por atentado contra a segurança de serviço de utilidade pública e abuso de autoridade no 69 DP (Teotônio Vilela), por ter usado condição de policial militar “com dolo de obter vantagem em proveito próprio”, nas palavras do delegado Ricardo Grativol, no boletim de ocorrência.
Em audiência de custódia, no dia seguinte, o Tribunal de Justiça determinou a liberdade provisória do policial com aplicação de medidas cautelares (comparecimento mensal em juízo, não deixar a residência entre 22h e 6h, e não se ausentar do domicílio por mais de oito dias sem autorização prévia). O juiz Luiz Guilherme Angeli Feichtenberger considerou que Adriano tem residência fixa e bons antecedentes, além de que “o crime não foi cometido mediante violência ou grave ameaça e, apesar da lesividade moral, apresenta menor repercussão jurídica”. O entendimento foi o mesmo do Ministério Público.
O delegado concluiu o relatório do caso na última quinta-feira (21/7), cabendo agora ao Ministério Público analisar e avaliar se apresenta denúncia à Justiça ou arquiva o inquérito.
Outro lado
A Ponte tentou contato com o policial Adriano, que não quis dar entrevista e encaminhou a seguinte mensagem*:
Sou grato pela oportunidade e sei que a imprensa faz um trabalho sério e fundamental para a democracia de nosso país. Infelizmente, assim, como meu pai e diversos familiares meus, fui acometido pela Covid-19 e estou em fase de tratamento. Analisarei com carinho a possibilidade de uma entrevista e assim que possível entrarei em contato.
Também procuramos as assessorias da Polícia Militar e da Secretaria de Segurança Pública sobre o caso, que não retornaram até a publicação.
Já a Secretaria Estadual de Saúde, responsável pelo hospital, declarou que o pai do cabo foi internado no dia 15 de janeiro com Covid-19 e teve alta no dia 21. Além disso, informou que a unidade atua exclusivamente com casos de Covid-19, não permitindo visitas, mas que informa os relatórios médicos aos familiares “com base em protocolos éticos e autorização do próprio paciente ou responsável”. A assessoria também informou que tomou “as medidas necessárias para a segurança do paciente, que apresentava quadro respiratório grave e agitação extrema, sendo necessário atuar imediatamente para evitar riscos à sua condição física”.
*Reportagem atualizada às 16h23, de 24/1/2021, após envio de mensagem do policial à Ponte
[…] Com informações da PonteJornalismo […]
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